flor de lótus
Nº 5 - Agosto de 1996

LAMPEJOS DO DHARMA
Do mesmo modo que um homem cansado, sedento, torturado e aflito pelo calor ao chegar a um belo local para descanso encontra um açude de água pura, clara, saborosa e fresca, nele mergulha para banhar-se e beber livrando-se de toda aflição, fadiga e sofrimento, assim também acontece quando alguém ouve o Dharma do honorável Gotama, seja nos discursos, nos sermões ou nas palestras, toda miséria, fadiga e sofrimento desaparecem dele.

Anguttara Nikaya V - III, 231
The Book of Gradual Sayings (P.T.S.) Vol. III, 173

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CARMA
Continuação do número anterior.

É importante compreender o carma reprodutivo, porque ele determina em que plano da existência renasceremos. É o carma em operação no último momento da vida. Naquele momento da morte, chamado consciência da morte, há quatro tipos de carma que podem surgir.

O primeiro é o chamado carma significativo, que pode ser tanto benéfico quanto maléfico. Carma significativo maléfico é ferir um Buda, matar um ser plenamente iluminado, matar a própria mãe ou pai ou causar uma cisão entre os monges de uma ordem. Qualquer um desses tem precedência sobre quaisquer outras ações na determinação do renascimento. Precisam chegar a ser usufruídos. Carma significativo benéfico é quando se cultivou a concentração e se alcançou o nível da absorção, mantendo-o até a hora da morte. O resultado desse carma é o renascimento nos reinos de Brahma. Tem predomínio sobre outras ações. Outro tipo de carma significativo positivo é o experimentar dos diferentes estágios da iluminação. Não determina precisamente onde renasceremos, mas dirige o renascimento para os reinos mais elevados. Fecha a possibilidade de renascer em reinos inferiores.

O carma que entra em funcionamento, se não houver atos significativos forçando seus resultados, é chamado de carma próximo, que significa o carma daquelas ações feitas imediatamente antes da morte. Em outras palavras, se em seus últimos momentos vocês se lembrarem de algo bom que tiverem feitos ou se alguém lembrá-los de algo bom que tenham feito, ou então vocês realizarem algum ato benéfico, é este o carma que determinará o renascimento. Havia um assassino, na época do Buda, que bem no momento em que ia ser enforcado lembrou-se de uma época de sua vida em que tinha dado esmolas à Sariputra, o discípulo mais importante do Buda. Seu último pensamento foi o daquela oferenda. Mesmo ele tendo cometido tantos atos maléficos naquela vida, o resultado do último pensamento benéfico acabou sendo o seu renascimento nos reinos celestes. Esse carma funciona ao contrário também. Não é que o carma bom ou mau que tenhamos acumulado não nos acompanhe. No entanto, o carma próximo, os atos ou lembranças que tenhamos no momento imediatamente anterior a morte, tem precedência. É ele que determina a próxima existência. Porém a consciência em geral torna-se muito enfraquecida na hora da morte e é possível que não haja a capacidade de redirigir a mente ou de, propositadamente, relembrar certos eventos.

Se não houver carma próximo, então o carma habitual é o que predomina. As ações feitas repetidamente em nosso período de vida vêm à mente no momento da morte. Se alguém cometeu muitos assassinatos, esse tipo de pensamento irá surgir no momento da morte como um resultado desse carma habitual. Ou se alguém fez muitas boas ações, foi generoso ou fez muita meditação, pode acontecer de relembrar um desses atos ou talvez veja uma imagem de si mesmo sentado em sua almofada de meditação. Então será este o carma que irá determinar o próximo renascimento.

Se não houver carma significativo, nem carma próximo, nem carma habitual forte, o quarto tipo que determina o renascimento é chamado de carma ao acaso. Todos nós estamos arrastando infinito carma benéfico e maléfico e se não houver carma habitual poderoso, então qualquer ação que tenhamos feito em qualquer época do passado pode emergir no momento da morte.

Um exemplo do funcionamento desses tipos de carma é o de um rebanho bovino preso num estábulo. Quando a porta é aberta pela manhã, o primeiro a sair será o touro mais forte. Ele simplesmente sairá, empurrando todos os outros para os lados. Suponha que não haja touro forte. O próximo a sair será a vaca que está mais próxima da porta. Ela simplesmente irá escapar pela porta. Agora suponha que não há nenhuma vaca perto da porta. Então, a vaca que tem o hábito de liderar as outras sairá primeiro. E se não houver uma vaca com o hábito de sair primeiro, então qualquer uma do rebanho poderá ser a primeira. É assim que o carma funciona em nossos últimos momentos: o significativo, o próximo, o habitual e o ao acaso.

Há um fator que nos mantém indo em direção à mais e mais luz, em direção a tipos cada vez mais elevados de felicidade, que é a atenção.

A atenção resulta de carma significativo benéfico, de iluminação. A atenção também resulta em bom carma próximo. Se estivermos agudamente conscientes, bem no momento da morte, a mente estará em equilíbrio e livre de aviltamento. A atenção é um carma habitual muito poderoso. Se for praticada todos os dias e fortemente condicionada em nós, ela irá emergir no momento da morte. O tipo de consciência, o tipo de mente que está sendo cultivada agora é uma forma extremamente poderosa. Será um fator determinante no tipo de carma que operará no momento da morte.

A Experiência do Insight - Joseph Goldstein - Edit. Roca.

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DEVOÇÃO

Uma das faculdades espirituais e um auxiliar poderoso ao longo do caminho é a fé ou confiança. Quando temos fé no que estamos fazendo todas as importunas dúvidas que podem espreitar nossos esforços se tornam inoperantes.

Há muitos tipos diferentes de fé que podem surgir. A menos útil é aquela confiança ou devoção em alguém ou algo, simplesmente porque isso nos faz sentir bem. Ficamos com uma sensação agradável, um enlevo e assim colocamos nossa fé naquela pessoa ou coisa. É fácil esse tipo de devoção tornar-se cega. Um tipo mais elevado de fé surge quando experimentamos e apreciamos certas qualidades numa pessoa, tais como a sabedoria, o amor e a compaixão. Esse tipo de confiança é útil porque a apreciação é o reconhecimento de qualidades benéficas da mente que nos inspiram a desenvolver essas mesmas qualidades em nos mesmos.

Também existe a fé e a devoção que aparecem devido a nossa própria experiência da verdade. Conforme começamos a experimentar mais profundamente como a mente e o corpo funcionam, sentimos uma tremenda alegria e confiança no Dharma. Não estão baseadas em sentimentos cegos nem na apreciação de qualidades em outros, mas vem do insight na natureza da realidade. E isso leva a mais elevada confiança mental que advém da experiência da iluminação. Ao penetrar na verdade última a fé se torna inabalável.

Quando o Buda estava morrendo, Ananda perguntou quem seria o mestre deles após sua morte. O Buda respondeu ao seu discípulo: "Sejam uma fonte de luz para vocês mesmos. Sejam refúgios para vocês mesmos. Não se lancem em refúgios externos. Agarrem-se a verdade como fonte de luz. Agarrem-se a verdade como refúgio. Não procurem refúgio em ninguém fora de vocês mesmos. E aqueles, Ananda quer seja hoje, quer seja após a minha morte, que forem fontes de luz em si próprios que não se lançarem a nenhum refúgio externo, que se agarrarem a verdade, a verdade como refúgio, não procurarão refúgio em ninguém a não ser em si, serão esses que alcançarão a mais elevada altura; mas eles deverão estar ansiosos por aprender."

A Experiência do Insight - Joseph Goldstein - Edit. Roca
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