![]() Nº 1 - Abril de 1996 Neste mundo que é vazio, que existamos
nele como a Flor do Lótus
ATIVIDADE DA MENTE, NATUREZA DA MENTE
Na tradição budista, fazemos distinção entre compreensão intelectual, experiência instável e realização estável. A compreensão intelectual, como um remendo mal costurado que vai cair com o tempo, é temporária. Se formos adiante em nossa prática, poderemos ter um vislumbre da verdadeira natureza da mente, mas, como a névoa, ele se dissipará. O que buscamos alcançar com nosso trabalho é uma realização imutável como o espaço que por sua própria natureza nunca se altera. Quando cresce a nossa compreensão da impermanência e da qualidade ilusória da existência, começamos a observar os fenômenos sem projetar nossas falsas suposições; com o tempo, passamos a reconhecer a consciência intrínseca, aberta e nua, como a nossa verdadeira realidade. Para ter acesso à experiência daquilo que é natural, comece reconhecendo a impermanência em cada ação do seu corpo, em cada palavra da sua fala, em cada movimento da sua mente. Ao movimentar sua mão, reconheça na mudança de posição uma demonstração de impermanência. Primeiro, ela estava do lado esquerdo, depois do direito. Com sua respiração, reconheça a impermanência, à medida que ela vai e vem, vai e vem. Com a prática, o processo intelectual deliberado de olhar para cada coisa e pensar, "Isto é impermanente", evolui para um conhecer natural, espontâneo da constante manifestação das mudanças. Isso ameniza nossa atitude em relação à realidade, começamos a apreciar a verdade das metáforas do Buda que descrevem os fenômenos como ilusões ou imagens de um sonho, como alucinações, ecos ou arco-iris – aparentes mas não tangíveis nem corpóreos, como reflexos da lua sobre a água, brilhantes porém não sólidos. Nossa compreensão convencional está baseada em suposições que foram passadas a nós, suposições que dependem de formas convencionais de percepção. Fomos ensinados a dar nome às coisas, atribuindo-lhes uma realidade que não possuem. A mente convencional é muito linear, pulando de um pensamento para outro. Podemos nos imaginar como pensadores multifacetados, cujas idéias formam algo como mosaico, mas somos tão somente seres que mudam muito depressa. Todos os conceitos e pensamentos que surgem na mente, na verdade toda a nossa experiência da realidade, não são muito diferentes de desenhos feitos com o dedo sobre a superfície da água. No próprio ato em que uma imagem está sendo criada, ela deixa de existir. A crença na solidez das nossas experiências produz apego e aversão, os quais por sua vez, alimentam perpetuamente o fogo do samsara, até que a realidade fica parecendo um incêndio devorador. Compreender a verdade das nossas experiências é como deixar de pôr lenha na fogueira. As chamas não desaparecem imediatamente mas, sem combustível, o fogo lentamente vai morrendo. Sem apego e aversão, não somos confundidos pelo jogo de atração e repulsão dos fenômenos. Aí, nessa abertura natural, o espaço claro da mente ao final de um pensamento, antes que o próximo apareça, está a consciência intrínseca primordial. Portões da Prática Budista - Editora Paramita
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BUDA, DARMA E SANGHA
Um budista, como outros homens e mulheres, é um ser anfíbio, vivendo em dois mundos: o mundo material da vida do dia a dia, e o mundo das aspirações e anseios espirituais. Ele precisa pensar em como dominar, na medida de sua capacidade, os contratempos e as labutas, as dores e os sofrimentos a que todos estão sujeitos neste mundo, e transcorrer uma vida feliz e harmoniosa, de acordo com os ensinamentos do Buda. Para isso, ele precisa evitar fazer ações más (akusala kamma) que o levariam a estados miseráveis de existência em vida futura, bem como fazer ações meritórias (kusala kamma) que o levarão a viver sua vida presente e futura em estados agradáveis e felizes. Além disso, ele precisa lembrar sempre que a vida, que é samsara (roda do vir a ser), seja em kama-loca (a esfera dos sentidos), ou em rupa-loka (a esfera das formas materiais) ou, ainda em arupa-loka (a esfera das formas imateriais), está sujeita à impermanência (anicca), ao sofrimento (dukkha) e à impessoalidade (anatta); e que seu sensato empenho deve culminar em nirvana, a paz e a serenidade que transcendem toda servidão aos sentidos, ao tempo e à compreensão limitada à mente. A vida humana neste mundo é muito breve, mesmo que o homem conseguisse viver até a experiente velhice de 100 Anos, ele seria perseguido por todas as formas de dores e sofrimento, desejos insatisfeitos e sobras de remorsos. Por muita riqueza e saúde que ele tenha neste mundo, elas não lhe serão de valor nenhum se não tiverem sido usadas de forma a ajudá-lo a progredir no caminho que conduz ao nibbana (nirvana), a mais alta bênção, bem como para o proveito e bem-estar de seus companheiros humanos. É muito útil lembrar as palavras do Buda: viver erroneamente e indignamente ou morrer nobremente e acertadamente, de ambos, morrer acertamente merece a preferência . Publicado no Boletim Informativo da Sociedade Budista do Brasil - julho/agosto de 1990.
![]() HISTORINHA ZEN - O POETA HAKURAKUTEN E O MESTRE DORIN O mestre Dorin costumava meditar no alto de uma árvore. Certo dia o poeta Hakurakuten veio visitá-lo e, vendo-o encarapitado num galho alto, assustou-se e exclamou:
- Cuidado, Mestre!O mestre gritou lá de cima: - Quem está em perigo és tu! Que perigo ameaçava o poeta, que estava tranqüilo, com os pés firmemente apoiados no chão? Hakurakuten perguntou, então ao Mestre: - Quem está em perigo és tu! - Qual é a essência do Budismo? - Não fazer o mal e praticar o bem. - Mas até uma criança de três anos sabe isso! - Sim, mas é uma coisa difícil de ser praticada mesmo por um velho de oitenta anos.
A mente é instável e caprichosa, difícil de ser vigiada, correndo para onde lhe apraz;
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