Local : Átrio de uma escola do Pepino enfeitado com flores e carros pretos
Personagens : Balbina Silvão e um grupo de alunos anónimos bem comportados
Figurantes : Lacaios, seguranças, motoristas dos carros pretos e mirones
Outros elementos : Marechal Cantante e ilustre comitiva

Acção : Marechal Cantante e sua comitiva, enquadrados pelos lacaios e seguranças da Balbina Silvão, despedem-se e preparam-se para zarpar nos seus carros pretos. Um grupo de alunos anónimos e bem comportados aproxima-se da comitiva do Marechal para lhe entregar um caderno reivindicativo. São imediatamente isolados pelos seguranças e impedidos de se aproximarem do Marechal. Balbina Silvão acorre de imediato e saca-lhes o caderno reivindicativo.
 
Diálogo : 
(...)
Balbina Silvão : O que querem vocês?!...O quê?...Entregar este documento ao Sr. Marechal Cantante?!...Não podem fazer isso!...Vocês não sabem que este "papel" tem de seguir as vias hierárquicas?... Ah não?!... Pois é!...Andam na escola e não aprendem nada!...Mas eu explico. Primeiro vocês entregam o papelucho reivindicativo ao Cabo de serviço para levar o visto de entrada. Daí segue para o 1º Sargento que o analisa, rubrica e passa ao Alferes que o encaminha ao Tenente e este passa-o, depois de rubricar, ao Capitão. Aí o Capitão vê se o vosso "papel" pode continuar a avançar na cadeia hierárquica ou não. Se o Capitão achar que está conforme, isto é, que está bem redigido, isto é, que não contém reivindicações revolucionárias, subversivas ou descabidas, então despacha-o pelo estafeta para o Major. Este acusa a recepção e encaminha o "papel" para o Coronel de serviço no Estado Maioral. Uma vez aí chegado, faz-se a apreciação dos diversos pareceres e vistos, e se o assunto for considerado relevante será então resumido e apresentado ao General que, por sua vez, o apresenta ao Marechal na reunião seguinte do Estado Maioral. Estão a ver como é qué?!...Simples e claro!...Como vêm, é um processo linear e transparente, milimetricamente planeado para permitir o acesso dos cidadãos aos dirigentes máximos. 

Um aluno anónimo (e bem comportado ): Mas ó Stora...Isto não tem nada de especial. Apenas queremos pedir ao Sr. Marechal Cantante para nos deixar usar o ábaco nos exames com cálculos...

Balbina Silvão (interrompendo abruptamente o aluno ): Isso dizes tu!... Se não sabem ficam a saber que a utilização do ábaco foi banida por decisão superior. Estudos feitos por especialistas na matéria demostram que a utilização do ábaco, para além de dar cabo dos dedos, provoca problemas visuais e, mais grave, afecta negativamente a vossa capacidade de cálculo mental. Há exemplos de inúmeros alunos que estupidificaram com a utilização do ábaco. Estudem mas é a tabuada, meninos!... Onde é que se viu quererem fazer contas com o ábaco!... E era por causa disto que queriam furar a cadeia hierárquica e maçar Sua Excelência o Marechal?... Sinceramente! ... Que coisa! ... Que grande falta de educação!...

Outro aluno anónimo (não tão bem comportado) : ...Mas nós temos o direito de ....

Balbina Silvão (interrompendo o aluno com o seu vozeirão) : Qual direito, qual carapuça!... Vocês só sabem exigir direitos mas não querem saber dos deveres!... Além do mais, onde é que se viu um grupo de "putos" que ainda andam de cueiros  a falar em direitos?!.. Vocês sabem lá o que é isso!... Cresçam meninos!... Está-se mesmo a ver que vocês foram mas é manipulados... Tenho a certeza que por trás de vocês está alguém!... E até imagino quem!... Vocês têm mas é o direito de cumprir os deveres a que estão obrigados, de não chatear as pessoas ilustres com ninharias, de estudar a tabuada e de se portarem como meninos bem educados...."

Outro aluno anónimo (mal comportado e interrompendo a Balbina Silvão ) : É pá!...Vamos embora!...Não vale a pena falar com esta gaja. A tipa julga que está na Indonésia....

Os alunos anónimos retiram-se de cena fazendo a continência do tradicional manguito à Balbina Silvão que espuma de raiva.