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A busca da "fórmula
social"
Alexandre Gomes
Escrevi ontem sobre o curioso pragmatismo do espírito norte-americano, mas nem de perto esgotei o tema ao qual volto hoje. Há neste "espírito norte-americano" um gosto demasiado por esquemas e fórmulas e uma certa aversão à história que invade da literatura à ciência. Há alguns anos um amigo argelino me pediu sugestões de lugares para visitar no Brasil e entre outras opções mencionei as cidades históricas de Minas. À menção delas ele me perguntou qual a idade destas cidades históricas e as situei há mais ou menos 2 ou 3 séculos. Tive então de me conformar quando ele me disse que a sua casa na Argélia tinha seis séculos. Para as nações jovens da América, percebi então, a noção de antiguidade é muito menos limitada. Que eu me lembre não há romance significativo na literatura americana que esteja situado fora da efêmera história americana. Mesmo quando tocam no assunto, como em "Um ianque na Corte do Rei Arthur" o fazem em termos de troça. Ou ainda como em alguns livros de Sci-fi de Asimov (em especial a Tetralogia Fundação) como algo muito esquemático. Nada semelhante às peças de Shakespeare sobre Roma, à "Salambô" de Flaubert ou a Thais de Anatole France. A aversão à história também se transmitiu às ciências da sociedade produzidas nos Estados Unidos e exportadas para outros lugares. Ainda que esta tentativa de eliminar a história tenha alcançado seu ápice no estruturalismo francês, é nos Estados Unidos que ela nasce e se torna obsessiva. A ciência social norte-americana produziu resultados notáveis em termos de instrumentos para analisar a sociedade, em especial ao converter modelos avançados de Estatística e Matemática em instrumentos de diagnóstico e insistir neles mesmo quando os especialistas do velho mundo lhes torciam o nariz. A brilhante denúncia de sua esterilidade teórica feita por Wright Mills na sua A Imaginação Sociológica refere-se antes ao uso que se faz deles que a eles próprios. Porém, a despeito de toda a importância destes instrumentos - cujo potencial aprendi a admirar com a professora Elza da Ufscar - há neles um vício que não é deles, mas da referida mentalidade americana: a noção de que eles bastam e que a sociedade pode ser explicada a partir de alguma fórmula matemática. A tal psico-história criada por Asimov em Fundação reflete justamente esta esperança de criar um conjunto de fórmulas através das quais se pode prever os caminhos da sociedade. A complexa Teoria dos Jogos de Von Neumann é sobretudo uma outra tentativa de fazer isto, Não menos ficcional, diga-se de passagem. Ambas só podiam florescer nos Estados Unidos, pois ainda que se diga que Asimov era russo e Neumann alemão, em nenhum outro lugar do mundo encontrariam quem lhes desse apoio e credibilidade a não ser nas terras do Tio Sam. Em nenhuma outra comunidade intelectual do mundo estas idéias de reduzir a humanidade a um conjunto de variáveis obteria tanta repercussão e prestígio. Mas esta discussão não é simplesmente sobre a crença em um determinismo estatístico que descrê do livre arbítrio do homem imaginando que basta descobrir uma fórmula para ter uma razoável previsão do que a sociedade fará. Ela é, na verdade, sobre como tal mentalidade influencia as pessoas que passam a julgá-la como verídica e, por isso, acabam por torná-la realmente real. Inúmeras vezes já mencionei que a ciência facilmente se transforma em cientificismo - superstição banal e prepotente - e no caso desta mentalidade dita pragmática e da tentativa de reduzir as relações sociais a um conjunto de equações facilmente nasce o arcabouço ideológico de algo muito assustador: o tecnocratismo. Por mais que a Teoria dos Jogos possa ser um instrumento eficiente de análise, ela se torna algo grotesco quando se torna o único meio de análise e não passa de um disparate quando se atribui a ela um certo poder mágico de descrever o futuro, qual pitonisa moderna. Contudo desde a década de 40, por exemplo, é ela que tem guiado a política externa - e qume sabe a interna - dos Estados Unidos. Há grande possibilidade de terem sido algoritmos baseados no trabalho de Von Neumann que decidiram pela entrada dos Estados Unidos no Vietnã e guiaram a Otan na intervenção em Kossovo e sabe-se lá quais planos eles tem para a nossa Amazônia. |
São Carlos, Sexta-feira, 25 de Fevereiro de 2000
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