Presente e Futuro de Moçambique

O Magnífico Reitor da Universidade Eduardo Mondlane, Dr. Brazão Mazula  em jeito simples e familiar começou por uma  observação preliminar: A palavra "presente" incluí os últimos cinco anos. E por questão de contexto podemos até recuar ao início do processo de Paz, em 1992.
A exposição assentou sobre a governação  recente, tendo em conta a experiência de governação democrática actual. Partiu, com  base em três pressupostos:
1) Proposta
democrática: Com ela se iniciou um sistema/regime com um tipo novo de relações entre os actores sociais. A democracia  cria condições para desenvolver a capacidade e a oportunidade de convivência social, política e

económica. É seu predicado fundamental dar a cada cidadão espaço para a representatividade na diversidade de ideias, opiniões, culturas. É seu objectivo realizar um desenvolvimento real em cada tempo e lugar, adequado às circunstâncias.
Em  Moçambique entrou-se neste caminho com o processo de paz em 1992. Após as eleições decorreram 5 anos de  ensaio, de capacitação pessoal e partidária para este envolvimento no processo de convivência. É claro que a convivência não exclui tensão. Esta é um fenómeno normal em todo o tipo de convivência, incluindo  a familiar. E como em qualquer forma  de convivência, as tensões são ultrapassadas pelo amor e o diálogo. Não se pode viver em tensão. Quando esta surge, as formas de a superar podem ser pacíficas  (discussões partidárias, o diálogo) ou violentas  (o terrorismo, a guerra).
A democracia tem as suas regras, cria exigências : o serviço e  não a corrupção, a honestidade e não a fraude em benefício próprio.
2)
A democracia visa criar cidadãos. E só há cidadania quando alguém se pode comunicar com os outros. Isto implica oportunidade de falar, de dar opiniões próprias, criticar, observar e participar de modo consciente e responsável nas decisões. Isto é um direito de todos. Para o usar é precisa Educação Cívica, que é a educação do homem para a cidadania. 
A cidadania efectiva implica ainda o
agir. Para isso, a comunidade deve ser envolvida na tomada de decisões de um  projecto. As bases devem falar e actuar; caso contrário, o projecto não tem futuro. Foi o caso concreto das aldeias comunais que morreram como nasceram.
O maior obstáculo à democracia, em Moçambique, é a elevada taxa de analfabetismo (67%). Falar e agir é um direito fundamental para cujo uso é preciso educar mentalmente. Aqui a Igreja tem um grande investimento a fazer. É sua tarefa consciencializar. Foi e deve continuar a ser um factor de formação.
Apesar de tudo, hoje, as relações entre os  partidos políticos não são boas, porque está pelo meio o grande inimigo da cidadania : o
exclusivismo. A cidadania, por si, é integrativa e leva à participação. Mas a cada passo somos confrontados com situações de exclusão. A exclusão é o inferno.
Também aqui, a Igreja tem um papel a desempenhar, superando a mentalização que educou para a  exclusão, o privado, o secreto... sem dar lugar ao outro, sem transparência... O papel da Igreja na educação cívica  deveria ser de fazer pensar com outro, reflectir com o outro, actuar juntos, governar juntos, dirigir juntos.
3)
O desenvolvimento humano. No centro do desenvolvimento deve estar o HOMEM. Por isso, desenvolvimento económico não significa necessariamente desenvolvimento social. Para o desenvolvimento humano requer-se, pelo menos: vida saudável, acesso ao conhecimento, razoável poder de compra. Por isso, o cidadão tem direito de propor um projecto alternativo de desenvolvimento face aos projectos macro económicos  que só pensam no lucro.
Conserva todo o seu valor o ensinamento de João XXIII na
Mater et Magistra : "o centro do  desenvolvimento é o Homem". Face a situações como o caso da dívida externa - para cujo pagamento seria necessário o contributo de 300 USD por moçambicano, quando o rendimento per capita não passa de 90 USD -, é evidente a  urgência de repensar o que se entende por "crescimento económico".
No actual contexto socio-político não se prevê a guerra, mas há nós de estrangulamento que naturalmente podem provocar conflitos:

  • A marginalização progressiva - o Estado continua a monopolizar o poder.
  • O problema da terra : a nova burguesia, explorando a cultura do papel expropria o camponês da única base de identidade que lhe resta, a terra. De facto, é a terra que vincula o cidadão comum. Aí se realiza como homem e como cidadão. Se lhe tiramos a terra... fica sem base.
O Dr. Mazula terminou a sua intervenção lembrando as palavras de Paulo VI na Ecclesiam Suam : chegado o tempo de a Igreja aprofundar a consciência de si mesma". O Papa lançou a Igreja nos caminhos da renovação, valorizando o recurso ao  diálogo e à denúncia profética. A Igreja deve incomodar. Quando não incomoda mas se acomoda e deixa de denunciar, falha na sua missão. O diálogo é com o Moçambique real, tal como é, para o levar a dias melhores. É papel da Igreja ligar a razão e a fé.

(apanhado da Conferência)

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