QUESTÕES QUE DEVERIAM INTERESSAR A TODAS AS PESSOAS

Qual a coisa mais importante da vida?

Se fazemos esta pergunta a uma pessoa de um país assolado pela fome, a resposta será: a comida. Se fazemos a mesma pergunta a quem está morrendo de frio, então a resposta será: o calor. E quando perguntamos a alguém que se sente sozinho e isolado, então certamente a resposta será: a companhia de outras pessoas.

Mas, uma vez satisfeitas todas essas necessidades, será que ainda resta alguma coisa de que todo mundo precise? Os filósofos acham que sim. Eles acham que o ser humano não vive apenas de pão. É claro que todo mundo precisa comer. E precisa também de amor e de cuidado. Mas ainda há uma coisa de que todos nós precisamos. Nós temos a necessidade de descobrir quem somos e por que vivemos.

Portanto, interessar-se em saber por que vivemos não é um interesse casual, como colecionar selos, por exemplo. Quem se interessa por tais questões toca um problema que vem sendo discutido pelo homem praticamente desde quanto passamos a habitar este planeta. A questão de saber como surgiu o universo, a terra e a vida por aqui é uma questão maior e mais importante do que saber quem ganhou mais medalhas de ouro nos jogos olímpicos.

Essas perguntas que deveriam interessar a todos são as perguntas filosóficas. Como o mundo foi criado: Será que existe uma vontade ou um sentido por detrás do que ocorre? há vida depois da morte? Como podemos responder a essas perguntas? E, principalmente, como devemos viver? Essas perguntas têm sido feitas pelas pessoas de todas as épocas. Não conhecemos nenhuma cultura que não se tenha perguntado quem é o ser humano e de onde veio o mundo.

Basicamente, não há muitas perguntas filosóficas para se fazer. Já fizemos algumas das mais importantes. É mais fácil fazer perguntas filosóficas do que respondê-las. A história nos mostra diferentes respostas para cada uma dessas perguntas, mas cada um de nós deve procurar a sua resposta. A leitura do que as outras pessoas pensaram pode nos ser útil quando precisamos construir nossa própria imagem do mundo e da vida.

Muitas das antigas perguntas foram resolvidas pela ciência ao longo dos anos. Antigamente, um grande enigma era saber como era o lado escuro da lua. Não era possível chegar a um resposta apenas pela discussão; a resposta ficava por conta da imaginação de cada um. Hoje, porém, sabemos exatamente como é o lado escuro da lua. Mas nem todos os enigmas podem ser respondidos dessa forma experimental.

Um dos filósofos gregos antigos acreditava que a filosofia era fruto da capacidade do homem de se admirar com as coisas. Ele achava que para o homem a vida é algo tão singular que as perguntas filosóficas surgem como que espontaneamente. É como o que ocorre quando assistimos a um truque de mágica: não conseguimos entender como é possível acontecer aquilo que estamos vendo diante de nossos olhos. Como é que o mágico conseguiu transformar dois lenços de seda num coelhinho vivo?

Para muitas pessoas, o mundo é tão incompreensível quanto o coelhinho que o mágico tira da cartola, que antes estava vazia. No caso do coelhinho, sabemos perfeitamente que o mágico nos iludiu. Mas quando falamos sobre o mundo, as coisas são um pouco diferentes, o mundo não é uma ilusão, pois estamos vivendo, somos parte dele.

A ÚNICA COISA DE QUE PRECISAMOS PARA NOS TORNARMOS BONS FILÓSOFOS É A CAPACIDADE DE NOS ADMIRARMOS COM AS COISAS. Parece muito simples, mas por que essas questões não despertam a admiração de todos? Por que, embora as questões filosóficas digam respeito a todas as pessoas, nem todas se tornam filósofos? Os motivos são os mais diferentes. A maioria das pessoas é tão absorvida pelo cotidiano, pelas necessidades imediatas, que a admiração pela vida acaba sendo completamente reprimida. A maioria vivencia o mundo como uma coisa absolutamente normal.

Um(a) filósofo(a) nunca é capaz de se habituar completamente com este mundo. Para ele ou para ela, o mundo continua a ter algo de incompreensível, algo de enigmático, de secreto. Só os(as) filósofos(as) têm ousadia para se lançar nessa jornada rumo aos limites da linguagem e da existência.

(Extraído de GAARDER, Jostein, "O mundo de sofia", Cia das Letras, S. Paulo, 1997, p.24-31)


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