Apresentação

A grave crise econômica mundial, tendo como epicentro o imperialismo ianque, é o marco fulcral da conjuntura atual, assim como o foco dos debates e análises do conjunto da esquerda anticapitalista em todo o planeta. Deflagrada a partir do crash financeiro de importantes corporações que operavam no mercado de capitais, a crise rapidamente irradiou-se em direção aos trustes industriais como montadoras automotivas e até mesmo contaminou o setor do agro-negócio e a cotação internacional de comodities minerais. Para nós que editamos Marxismo Revolucionário a questão fundamental é clarificar, do ponto de vista de uma perspectiva de classe, as especificidades da atual crise, sua dimensão na correlação de forças mundial e as possibilidades abertas para a classe operária e a construção do seu partido revolucionário.

Se é verdade que o colapso dos títulos “subprime” nos EUA, provocando a explosão da bolha de crédito especulativo pôs fim a um ciclo de hiper-concentração de capital financeiro iniciado no final a década de 70, também é certo que estamos muito distantes do chamado “apocalipse final” do capitalismo, como afirmam muitos revisionistas que chegam inclusive a caracterizar a existência da abertura de uma crise revolucionária no coração do monstro imperialista. Não estamos diante de uma crise tradicional de superprodução que provoca a falência das corporações em função da retração do mercado consumidor, mas sim de grandes prejuízos financeiros destas mesmas corporações que assistiram suas ações alavancadas artificialmente no mercado bursátil transformarem-se em pó em poucas semanas. Um exemplo é o caso da “falência” da GM, líder mundial no mercado automotivo norte-americano. A direção da GM alega que a diminuição de 23% da vendas em 2008 a colocou em estado falimentar, e que além da demissão de seus trabalhadores exige do governo a bagatela de 100 bilhões de dólares a fundo perdido. Acontece que em 1975 a mesma GM teve uma redução de vendas no mercado interno de cerca de 24% e nem se cogitava a utilização do termo falência. O que os executivos da GM não podem admitir é que perderam centenas de bilhões apostando no cassino financeiro e agora reivindicam do tesouro norte-americano a reposição das perdas, utilizando a chantagem das demissões e da falência como ponto de barganha. No Brasil ocorre a mesma operação. As montadoras bateram um recorde histórico de vendas em 2008 e projetam um crescimento de 3% para 2009, mesmo assim foram socorridas com crédito estatal pelos governos Lula e Serra e iniciaram um processo de demissão em massa em suas unidades. Outra gigante do setor alimentício, a Sadia, que em 2008 ampliou sua fatia no mercado consumidor, vem demitindo funcionários sob a justificativa da crise econômica, omitindo, é claro, que foi uma das empresas que mais perdeu ativos financeiros no crash de Wall Street. Em síntese o que podemos afirmar, ainda que preliminarmente em função dos primeiros impactos econômicos, é que esta crise inicia-se com o esgotamento da complexa rede de financeirização de ativos dos grandes monopólios capitalistas globais, este fenômeno atinge desde os trustes industriais até os maiores bancos comerciais e suas holdings. Neste processo o Estado capitalista assume novamente um papel central na economia, ou seja, o de repositor de uma nova massa de crédito voltada prioritariamente aos grandes grupos econômicos. Como marxistas, mais do que "reclamar" que o Estado burguês socorra os capitalistas, devemos sustentar que é exatamente esta a função do Estado burguês, pela sua própria natureza de classe, como já afirmavam o velho Marx há mais de 150 anos atrás.

A intensa midiatização da crise econômica, anunciada como cataclismo global, longe de ser uma preocupação dos grandes meios de comunicação com a população, é na verdade um “start” que serve como pretexto moral para o imperialismo desencadear uma nova ofensiva reacionária no mesmo modelo do início da década de 90 quando da destruição contra-revolucionária do estado operário soviético. A patronal pretende reconquistar um certo espaço perdido com o avanço do movimento de massas no começo deste século, gerando um relativo acúmulo de forças para o proletariado mundial. Com a figura de um negro comandando o imperialismo, pretende recompor-se através de novas guerras de recolonização, desta vez com alvos mais delicados como Irã e Paquistão e, fundamentalmente, retomar novos ritmos de produção e demissões em grande escala.

Paradoxalmente, quando se completam 70 anos da fundação da IV Internacional, a grande maioria das correntes revisionistas que reivindicam o legado de Trotsky, enxergam no crash financeiro a grande oportunidade para o socialismo do século XXI, ou seja, ao invés da tarefa que se impõe da reconstrução programática e organizativa da IV Internacional para colocar-se como alternativa diante da barbárie capitalista, sonham que a catástrofe financeira levará por si só a humanidade a uma nova organização social superior ao capitalismo. “Esqueceram” estes senhores que a grande depressão ocorrida nos anos 30 conduziu ao nazi-fascismo, exatamente pela ausência de uma autêntica direção revolucionária com influência de massas.

Nesta transição ao último ano da década do novo milênio, Marxismo Revolucionário abre suas páginas para o debate destes temas, como a crise capitalista mundial, os setenta anos da fundação da IV Internacional e o cinqüentenário da revolução cubana, hoje ameaçada pela pressão democratizante da restauração capitalista, temas aparentemente desconexos, mas visceralmente ligados pelo fio condutor de uma compreensão marxiana dos principais fatos da luta de classes e de sua tradução em um programa revolucionário de ação para a classe operária conquistar o poder. Em uma conjuntura internacional em franca ebulição social, mas pautada pelo retrocesso da consciência das massas, reformistas de todos os matizes, como os que se reúnem no Fórum Social Mundial, não cansam de afirmar a inviabilidade da instauração da ditadura do proletariado e a disseminar ilusões no suposto caráter neutral do Estado das classes dominantes. Na contramão do coro uníssono dos que procuram sempre “atualizar” o marxismo como justificativa para integração ao regime vigente, continuamos a defender que a única saída progressista para a atual crise é a revolução socialista em escada mundial e que esta, para além dos nossos desejos, não se encontra na próxima esquina.

Os Editores
Dezembro 2008.


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