1953-2007: MOVIMENTO 26 DE JULHO

A conversão de uma guerrilha
pequeno-burguesa ao stalinismo
contra-revolucionário

O fracassado ataque ao quartel de Moncada (importante depósito de armas), em 26 de julho de 1953, ação protagonizada por Fidel Castro e outros membros do Partido Ortodoxo, expressou a perda das esperanças da oposição pequeno-burguesa nacionalista em utilizar-se dos meios institucionais para restaurar a democracia burguesa e a adoção da luta armada como método para derrotar a ditadura de Fulgêncio Batista. Apesar da maioria ter sido morta em combate e poucos sobreviventes presos, entre eles Fidel e Raul Castro, esse episódio se tornou uma referência para o movimento guerrilheiro que dirigiu a Revolução Cubana.

Após serem anistiados, em 1955, Fidel Castro e o grupo de exilados cubanos, ao qual se incorporou o argentino Ernesto Che Guevara de la Serna, fundaram no México o Movimento Revolucionário 26 de Julho, que refletia ideologicamente o nacionalismo e o antiimperialismo dos setores pequeno-burgueses dispostos a suprimir o regime ditatorial de Batista através da ação guerrilheira.

As raízes do sentimento antiimperialista do povo cubano, sobre o qual se apoiou o MR 26 de Julho, encontram-se em sua história de exploração e opressão colonialista. Cuba foi a última colônia americana a se libertar do domínio da Espanha, em 1898. Mas, no lugar do antigo colonialismo espanhol se estabeleceu um protetorado do imperialismo norte-americano que fez sua primeira ocupação militar na ilha de 1898 a 1902, obrigando a Assembléia Constituinte reunida em Havana a inserir na Constituição cubana uma lei do Congresso dos Estados Unidos, a Emenda Platt, que permitia ao imperialismo ianque fazer intervenções militares, assegurar concessões para a exploração mineral e construir uma base naval na ilha. Era o “Big Stick” (grande porrete), política de intervenções norte-americanas na América Latina, iniciada no governo de Theodore Roosevelt. Em 1903, o governo fantoche de Tomás Estrada Palma concedeu aos EUA, por 99 anos, a base naval de Guantánamo.

De 1902 a 1959, o imperialismo ianque controlou os principais ramos da economia cubana, dominando os setores dos serviços públicos, de refinamento de petróleo, de mineração, dos bancos e dividindo com a burguesia nacional a produção açucareira, a criação de gado e o turismo. Sob a ditadura de Batista (1952-1959), as concessões ao capital ianque se ampliaram e Havana tornou-se um centro de livre atuação da Máfia norte-americana, que explorava o tráfico de drogas, os jogos e a prostituição. Cuba era então conhecida como o bordel dos Estados Unidos.

Em resposta ao pesado domínio imperialista desenvolveu-se em vários setores sociais um forte sentimento nacionalista dirigido contra o imperialismo ianque e a burguesia nacional a ele aliada. Nos anos 50, o nacionalismo ganhou força como movimento de oposição de característica marcadamente pequeno-burguesa, através do Partido Ortodoxo, que defendia reformas sociais e econômicas. Foi uma ala desse partido, a mais identificada com os anseios da pequena burguesia, que iniciou a guerrilha do MR 26 de julho pela derrubada da ditadura patrocinada pelo imperialismo.

OS ACORDOS DO MR 26 DE JULHO COM A BURGUESIA NACIONAL E O PAPEL DO PROLETARIADO NA VITÓRIA DA REVOLUÇÃO CUBANA

De retorno a Cuba, o grupo guerrilheiro de Fidel quase foi completamente dizimado pelo Exército de Batista durante o desembarque do iate Granma, em Alegria del Pio, nas proximidades de Sierra Maestra, onde os sobreviventes se refugiaram. O desembarque do Granma, que deveria ocorrer em 30 de novembro, coincidindo com uma série de greves e manifestações que desviariam a atenção das forças de repressão do governo, só correu após a data prevista, o que permitiu ao governo concentrar suas tropas para a ofensiva contra os guerrilheiros.

Em Sierra Maestra, ao mesmo tempo em que organizaram na guerrilha os camponeses perseguidos pelos latifundiários, o MR 26 de Julho também buscou o apoio de setores burgueses contrários à ditadura.

Numa conjuntura de crise econômica, marcada pela queda nas exportações do açúcar e restrições à produção impostas pela ditadura para atender às exigências do imperialismo, setores da burguesia açucareira, ansiosos por restabelecer relações comerciais com a URSS e outros Estados operários burocratizados, que haviam sido rompidas em função da Guerra Fria, buscaram uma aproximação com a guerrilha do MR 26 de Julho para negociar a substituição de Fulgêncio Batista por elementos dispostos atender seus interesses e controlar a marcha da revolução.

Em março de 1967, pelo Manifesto de la Sierra, ficou estabelecido um acordo entre o movimento guerrilheiro e a burguesia açucareira, que exigia a demissão do ditador Batista e o estabelecimento de um governo que respeitasse a propriedade privada. Mais tarde, em Julho de 1958, através do Pacto de Caracas, foi constituída a Frente Cívico-Revolucionária Democrática que fixou uma estratégia comum para derrotar a ditadura através da guerrilha, a criação de um governo provisório e a implantação de um regime democrático burguês constitucional.

A vitória do MR 26 de Julho, em 1º de janeiro de 1959, a frente do vigoroso ascenso das massas trabalhadoras em Cuba foi saudada por várias tendências revisionistas da esquerda latino-americana como uma prova da superação da concepção leninista de partido e do papel dirigente da vanguarda do proletariado na revolução socialista. O que é excepcional no processo revolucionário cubano passou a ser visto como regra pela esquerda revisionista que abandonou o leninismo, substituindo-o pela teoria do foquismo. Até correntes que se reivindicavam trots-kistas como PRT de Nahuel Moreno passou o defender o foquismo como uma nova via para a revolução e o castrismo como uma alternativa ao stalinismo.

Porém, a realidade se revelava de forma bem diferente dessas ilusões revisionistas. As classes trabalhadoras, operários e camponeses, cumpriram o papel decisivo para a vitória da revolução, unificando suas lutas com a ofensiva guerrilheira. Mas, só o fizeram sob a influência ideológica do nacionalismo e a direção política da guerrilha devido ao papel contra-revolucionário do stalinismo e sua política de Coexistência Pacífica com o imperialismo, que já havia provocado uma profunda degeneração do Partido Socialista Popular, como era denominado o partido comunista em Cuba.

Apesar da ausência de uma direção genuinamente proletária, foi a pressão exercida pelas massas operárias e camponesas o que definiu a disputa entre as duas vertentes nacionalistas do governo do Presidente Manuel Urrutia e do Primeiro-Ministro Miró Cardona, que se instalou logo após a queda de Batista.

O triunfo da tendência pequeno-burguesa radical sobre a ala liberal burguesa que pretendia apenas reformar o Estado para preservar o sistema capitalista, se deu sob a forte pressão das massas trabalhadoras que emperrou os liberais burgueses para a contra-revolução e obrigou os líderes do MR 26 de Julho, após à ameaça de invasão gusano-ianque na Baia dos Porcos em abril de 1961, a irem além do que pretendiam, passando da nacionalização de alguns setores estratégicos da economia e de incipientes reformas agrária e urbana com indenizações aos proprietários, para a organização de uma estrutura de produção socialista e o estabelecimento de um Estado Operário burocrático.

Esse desfecho da revolução cubana confirmou a justeza das teses da Revolução Permanente de Trotsky, adotada por Lenin a partir de 1917, da impossibilidade de desenvolvimento independente do capitalismo nos países coloniais e semicoloniais na fase imperialista, a incapacidade das burguesias nacionais desses países de liderarem a luta antiimperialista das massas sem ameaçar o seu próprio domínio de classe.

O MOVIMENTO 26 DE JULHO SUBORDINA-SE À POLÍTICA DE CO-EXISTÊNCIA PACÍFICA COM O IMPERIALISMO PATROCINADA PELA URSS

Em oposição à política de isolamento imposta pelos Estados Unidos, que resultou na exclusão de Cuba da Organização dos Estados americanos – OEA a partir da Conferência de Punta del Este (Uruguai), em janeiro de 1962, o governo cubano se manifestou abertamente em defesa do caráter continental da revolução latino-americana e prometeu solidariedade a todo movimento revolucionário antiimperialista. Na assembléia de criação da Organização Latino-Americana de Solidariedade (OLAS), em agosto de 1967, negando a trajetória do MR 26 de Julho, o castrismo denunciou a política do stalinismo de aliança com as burguesias nacionais. Mas apesar da vontade de expandir a revolução, a teoria do fogo guerrilheiro acabou fracassando a partir da própria experiência de Che Guevara na Bolívia, onde ficou isolado, sem apoio dos stalinistas e até mesmo de Fidel Castro.

A atenção da burocracia castrista passou então a se concentrar cada vez mais na gestão do Estado operário cubano de acordo com seus próprios interesses. Na década de 1970, justamente quando o imperialismo ianque sofria uma profunda derrota na guerra do Vietnã, o castrismo sucumbiu à política stalinista da Coexistência Pacífica e o Estado operário cubano passou a estabelecer acordos diplomáticos e uma política de reaproximação com os EUA. A defesa da revolução latino-americana passou a ser substituída por uma política abertamente contra-revolucionária até mesmo em relação aos movimentos guerrilheiros que repetiam a experiência cubana, a exemplo dos sandinistas, a quem Fidel Castro aconselhou não transformarem a Nicarágua numa nova Cuba.

Como resultado dessa política, em julho de 1975, a OEA suspendeu todas as sanções econômicas e políticas contra Cuba. A ruptura com o isolamento imposto pelo imperialismo ianque, entretanto, se fazia não por meio da expansão da revolução socialista na América Latina, mas através do restabelecimento das relações diplomáticas e comerciais com vários governos burgueses latino-americanos e de um acentuado processo de restauração capitalista, que se aprofundou ainda mais a partir da contra-revolução que destruiu a URSS, em 1991. Nessa onda restauracionista, até a reacionária Igreja Católica obteve concessões nas negociações da burocracia castrista com o Vaticano quando da visita do Papa João Paulo II a Cuba, em janeiro de 1998.

Se numa conjuntura histórica de ascenso revolucionário das massas a guerrilha pequeno-burguesa do MR 26 de julho pôde ir além de suas limitações políticas e ideológicas, substituindo o Estado burguês por um Estado operário burocratizado, hoje, numa época de ofensiva contra-revolucionária mundial do imperialismo, a burocracia stalinista em Cuba cumpre o papel de principal instrumento da restauração capitalista.

Frente a essa ameaça de destruição das bases do Estado operário, é necessário construir um autêntico partido revolucionário trotskista em Cuba, capaz de liderar uma revolução política para derrotar a burocracia castrista e regenerar o Estado operário cubano como parte da estratégia da revolução socialista mundial.


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