Quando os bolcheviques tornaram-se maioria nos sovietes, Lenin declarou Nosso momento chegou!. Neste espírito foi escrita a carta que reproduzimos abaixo. Datada de em 21 (8) de outubro e endereçada ao CC Bolchevique, tratava-se de uma enérgica convocatória de Lenin a que a direção do partido rompesse com suas vacilações e organizasse imediatamente a insurreição armada quatro dias depois. Lenin recorda os ensinamentos de Marx (de Revolução e Contra-revolução na Alemanha) que aborda a insurreição como arte, que como a arte da guerra, está sujeita a leis que negligenciadas abortam a situação revolucionária e levam a liquidação do partido responsável como instrumento de emancipação do proletariado. Apesar do título, ela foi escrita quando Lenin já se encontrava em Petrogado e reflete a clandestinidade que precisou manter o dirigente da revolução, acusado de agente de um Estado inimigo, a poucas horas da tomada do poder. Foi um documento preparatório para a famosa reunião do CC do dia 23 (10) onde se decidiria o destino da insurreição e quando os vacilantes (Zinoviev e Kamenev) foram derrotados pela proposta de Lenin em favor da organização do levante armado por um Comitê Militar Revolucionário dirigido pelo partido. Em seu livro sobre a História da Revolução Russa, Trotsky refere-se assim à reunião: Durante as três semanas transcorridas, o CC havia evoluído consideravelmente à esquerda. Dez votos contra dois se pronunciaram pela insurreição. Era uma grande vitória!
Conselhos de um ausente Escrevo estas linhas a 8 de outubro e tenho poucas esperanças de que elas estejam já no dia 9 nas mãos dos camaradas de Petrogrado. É possível que cheguem tarde, pois o Congresso dos Sovietes do Norte está marcado para 10 de outubro. Tentarei, no entanto, dar meus Conselhos de um ausente, para o caso de que a intervenção provável dos operários e soldados de Petrogrado e de todos os arredores ocorra em breve, e que ainda não tenha ocorrido. Que todo o poder deve passar para os sovietes é evidente. Igualmente deve ser indiscutível para todo bolchevique que um poder proletário-revolucionário (ou bolchevique - isto agora é a mesma coisa) tem assegurados a maior simpatia e o apoio sem reservas de todos os trabalhadores e explorados do mundo inteiro em geral, nos países beligerantes em particular, entre os camponeses russos em especial. Não vale a pena nos determos nestas verdades, por demais conhecidas e há muito tempo demonstradas. É preciso determo-nos em algo que provavelmente não esteja inteiramente claro para todos os camaradas, a saber: que a passagem do poder para os sovietes significa agora, na prática, a insurreição armada. Poderia parecer que isto é evidente, mas nem todos refletiram nem refletem nisto. Renunciar agora à insurreição armada significaria renunciar à principal palavra de ordem do bolchevismo (todo o poder aos sovietes) e a todo o internacionalismo proletário-revolucionário em geral. Mas a insurreição armada é uma forma especial de luta política, submetida a leis especiais, nas quais é preciso refletir atentamente. Karl Marx exprimiu esta verdade com notável relevo ao escrever que a insurreição armada é, como a guerra, uma arte. Marx destacou entre as regras mais importantes dessa arte:
1) nunca jogar com a insurreição e, uma vez começada, saber
firmemente que é preciso ir até o fim; Marx resumiu as lições de todas as revoluções no que se refere à insurreição armada com as palavras de Danton, até hoje o maior mestre conhecido da tática revolucionária: audácia, audácia e mais uma vez audácia!. Aplicado à Rússia e a outubro de 1917, isto significa: ofensiva, simultânea e a mais súbita e rápida possível, sobre Petrogrado, e obrigatoriamente de fora, de dentro, dos bairros operários, da Finlândia, de Reval, de Kronstadt, ofensiva de toda a esquadra, acumulação de uma superioridade gigantesca de forças sobre os 15 ou 20 mil (e talvez mais) da nossa guarda burguesa (os cadetes) das nossas tropas da Vendéia (uma parte dos cossacos), etc. Combinar nossas três forças principais: a esquadra, os operários e as unidades militares, de modo a que sejam obrigatoriamente ocupados e mantidos seja com que perdas for: a) os telefones; b) os telégrafos; c) as estações ferroviárias; e d) antes de tudo, as pontes. Constituir os elementos mais decididos (nossas tropas de choque e a juventude operária, bem como os melhores marinheiros) em pequenos destacamentos para ocupação por eles de todos os pontos mais importantes e para sua participação em toda parte em todas as operações importantes, por exemplo: cercar e isolar Petrogrado; tomá-la com um ataque combinado da esquadra, dos operários e das tropas esta é uma tarefa que exige arte e tripla audácia; formar destacamentos dos melhores operários com espingardas e granadas de mão para atacar e cercar os centros do inimigo (escolas militares, telégrafos e telefones, etc.) com a palavra de ordem: antes morrermos todos que deixar o inimigo passar! Esperemos que, no caso de se decidir a intervenção, os dirigentes apliquem com êxito os grandes preceitos de Danton e Marx. O êxito tanto da revolução russa como da mundial depende de dois ou três dias de luta.
Assinado: Um Ausente
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