VITÓRIA DO “NÃO” NA VENEZUELA

‘Este governo garante a estabilidade e o cumprimento de seus compromissos com a dívida externa’(Hugo Chávez, 16/08/04)

 

Artigo extraído do jornal Luta Operária n.º 98, 1ª Quinz. de Set./2004


 

Como já havíamos prognosticado (ler o JLO nº 97), o “Não” obteve um significativo triunfo no referendo revogatório, com cerca de 5 milhões de votos (59%), contra três milhões e seiscentos mil votos (41%) dados ao “Sim”. Esta é a oitava vitória eleitoral consecutiva de Chávez, passando por dois mandatos presidenciais e seis consultas populares.

A chamada “comunidade internacional” foi unânime em legitimar o resultado do referendo, inclusive a própria Casa Branca, através do porta-voz do Departamento de Estado, Adam Ereli, afirmou que os resultados do referendo “mostram que o presidente Chávez recebeu apoio da maioria dos votantes”. Só mesmo a desbaratada oposição, através da “Coordenadora Democrática”, não reconheceu os resultados, alegando uma suposta fraude eleitoral. Mas foi mesmo o mercado financeiro que deu a palavra final. A agência internacional de classificação de risco Standard & Poor elevou a classificação da dívida da Venezuela, citando um panorama de maior estabilidade política, com um amplo superávit em conta corrente e redução do spread da dívida externa. Até mesmo a “Fedecamaras”, entidade empresarial patrocinadora da tentativa de golpe de Estado em 2002, aceita o diálogo com Chávez, Albis Muñoz, seu presidente, acenou com um encontro no Palácio de Miraflores. Chávez, por sua vez, inaugura uma nova fase de seu governo, aprofundando a inflexão à direita feita em meados de 2002, garantindo a confiança da burguesia nacional e do imperialismo. Suas primeiras palavras após o triunfo do “Não” foram no sentido de selar um “pacto nacional” e assegurar salvaguardas aos interesses imperialistas no país: “Este governo garante a estabilidade e o cumprimento de seus compromissos com a dívida externa e com o fornecimento de petróleo” (coletiva à imprensa no Palácio Presidencial, 16/08/04).

VENCEU O SENTIMENTO ANTIIMPERIALISTA DAS MASSAS

Sem sombra de dúvidas, a vitória do “Não” é o produto direto do sentimento antiimperialista das massas venezuelanas, que, desde o “Caracazo” de 1989, são protagonistas de importantes combates políticos, dos quais, a permanência de Chávez no governo é uma conseqüência deformada, mas não uma vitória dos trabalhadores. Não se pode amalgamar este processo de lutas como sendo a expressão da “revolução socialista em curso na Venezuela”. O governo “nacionalista burguês” de Chávez nada tem de revolucionário, pelo contrário, é a representação de uma força política esgotada historicamente, uma caricatura grosseira das correntes nacionalistas latino-americanas que nacionalizavam e estatizavam trustes imperialistas, sob pressão das massas. Chávez corre no sentido inverso, não se enfrenta com o imperialismo e abre o país para as multinacionais, com acordos bilionários com a Microsoft e a Chevron Texaco, por exemplo.

Às correntes revisionistas, que dizem ocorrer uma “revolução” na Venezuela, devemos perguntar: onde está o armamento do proletariado? Existem organismos de poder proletários do tipo soviéticos? O governo burguês de turno não se apóia no alto comando das instituições militares? É evidente, para os marxistas-leninistas, que a Venezuela de hoje não passa por uma situação revolucionária e a ausência de um partido operário revolucionário com influência de massas é a maior prova disto! A ofensiva das massas ainda carece de um escopo programático, e isto permite à burguesia manobrar a conjuntura a seu favor, utilizando o prestígio de Chávez para traficar a ilusão de um “governo revolucionário”.

A superação das ilusões políticas das massas latino-americanas no cordão “democrático popular” estabelecido desde Kirchner, Lagos, Chávez e Lula, passando também pelas “oposições” do PRD mexicano, do MAS boliviano, da Frente Ampla uruguaia, é condição sine qua non para transformar a ebulição das massas em nosso continente contra os planos de ajuste e rapina do imperialismo, numa verdadeira revolução socialista, que ponha a nu a fraude e o estelionato da chamada “revolução bolivariana”. Mais do que nunca é preciso colocar de pé a tarefa da reconstrução da Quarta Internacional.


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