“ELEIÇÕES” NO IRAQUE

Uma farsa a serviço da ocupação militar imperialista

As cenas transmitidas pela imprensa burguesa acerca dos “intensos combates” entre as forças de ocupação e a resistência iraquiana, justamente no dia em que foram proclamados, com quase três semanas de atraso, os resultados oficiais da farsa eleitoral levada a cabo no Iraque, demonstram que os estrategistas do Pentágono armaram as “eleições” justamente para manter intocável a intervenção imperialista após o 30 de janeiro. Os tanques, helicópteros e o contingente militar de 150 mil homens dos EUA, auxiliados por soldados da Grã-Bretanha, Itália, Austrália, Coréia do Sul e Japão, além dos “assessores da OTAN”, continuam sua missão de perseguir a resistência popular multiétnica enquanto garantem a receita média de 1,5 bilhões de dólares por mês, a partir da produção diária de 2,1 milhões de barris para as empresas petrolíferas norte-americanas.

Se do ponto de vista estritamente militar nada se modificou na realidade iraquiana, a farsa eleitoral altera o modus operandi político da ocupação imperialista. Foi justamente por isso que ela foi montada, com o Pentágono gastando bilhões de dólares para assegurar sua realização. O objetivo de Bush foi consagrar legitimidade internacional para os atos do governo títere parido das “eleições”, ou seja, dar legalidade à entrega dos recursos petroleiros e o controle das reservas de água (a maior do Oriente Médio) aos monopólios ocupantes e seus sócios. Já sintonizados com a possibilidade de lucrativos negócios futuros, a ONU, acompanhada de países como França, Alemanha e Rússia saudaram em coro “os primeiros passos do retorno à democracia no Iraque”.

IMPERIALISMO COLOCA EM CURSO A BALCANIZAÇÃO DO IRAQUE

Enquanto nas áreas controladas pelos sunitas as seções estavam completamente vazias, um contingente importante da população votou das cidades xiitas do sul do Iraque e quase todos os moradores da zona curda, ao norte, foram às urnas. A imprensa burguesa divulgou que 60% dos iraquianos votaram, 8.5 milhões de um total de 14 milhões de habitantes.

Ainda que esses dados sejam manipulados pelos EUA e a eleição tenha sido uma farsa completa para assegurar legitimidade às forças nativas que apóiam a ocupação, a realização do pleito foi uma vitória da Casa Branca e uma derrota para a resistência porque demonstrou o quanto as forças políticas nacionais estão divididas e um amplo setor sustenta a ocupação com vistas a controlar uma parcela do Estado iraquiano a ser reconstruído na condição de colônia ianque. O melhor exemplo desse processo é Moqtada al Sadr que após dirigir a resistência em Najaf celebrou um cessar-fogo com as forças da ocupação em troca de ser um títere do imperialismo na cidade, hoje modelo de subordinação aos ditames de Washington.

Esse panorama desfavorável para a resistência deveu-se fundamentalmente à cooptação de um vasto setor dos clérigos xiitas dos partidos Dawa e Conselho Supremo da Revolução Islâmica, que concorreram juntos na Aliança Iraque Unido (AIU), conquistando 140 das 275 cadeiras do futuro parlamento. Os curdos controlam 75 cadeiras e Allawy obteve 40 postos, sendo os outros 20 constituintes divididos por forças pulverizadas, inclusive o Partido Comunista montado pela CIA no Iraque. A assembléia terá a tarefa de nomear um presidente e dois vice-presidentes que indicará o primeiro-ministro. Além disso, elaborará um projeto de Constituição a ser plebiscitado em outubro, uma carta escrita segundo os interesses dos EUA que segue controlando a polícia, as FFAA e a própria circulação de dinheiro.

Além de se valerem da maioria numérica, os dirigentes xiitas foram diretamente financiados e organizados pelo governo iraniano, como afirma o jornal The Guardian de 03.02: “A vitória xiita foi quase uma vitória para o Irã. O governo xiita do Irã investiu mais um bilhão de dólares em organizações políticas no Ira-que”. Prova disso foi que o aiatolá Ali Sistani, xiita pró-Irã e o clérigo mais influente do Iraque, apoiou firmemente as eleições a ponto de publicar uma ordem santa obrigando seus fiéis a votar.

Foi a ascensão de uma coligação xiita financiada e simpática a Teerã como força hegemônica do parlamento fantoche iraquiano que levou a Casa Branca a reforçar as ameaças contra o Irã. Apesar da vitória da AIU não ser nenhuma surpresa para os EUA já que meses atrás o próprio aiatolá Ali Sistani tinha sido transportado até Londres para fechar o acordo do calendário eleitoral, a força política da coligação xiita, obtendo grande margem de votos frente a Allawy (a AIU teve 47,6% enquanto as forças que apóiam o atual primeiro-ministro abocanharam apenas 13,6%) colocou Bush em alerta.

Longe de “estabilizar o Ira-que” a farsa montada pelos EUA tende, pela divisão entre as várias frações xiitas, curdas e sunitas, a gerar um cenário de crise no governo títere a partir de um parlamento fracionado. O próprio plano inicial dos EUA, de manter Allawy como primeiro-ministro em uma coalizão de governo entre xiitas parece naufragar com o anúncio da AIU, que indicará o atual vice-presidente interino, Ibrahin al-Jaafari, como seu candidato.

As tensões que se abriram após o 30 de janeiro tendem a dividir ainda mais o país, como atesta o The Economist: “A menos que se façam grandes esforços para que os sunitas sintam que se levam em conta suas opiniões, a Constituição se converteria em outra fagulha que ajudará a iniciar uma guerra civil. Ou várias. Um caos prolongado no resto do país poderia agitar os curdos no Iraque, em suas relativas províncias pacíficas no norte, para exigir sua independência, possivelmente poderia desencadear uma guerra pela amargamente disputada cidade petroleira de Kirkut”.

O novo governo títere a ser montado em uma coalizão entre xiitas pró-Irã, curdos e Allawy, a qual os EUA tentarão agregar algum setor sunita, reforça as fricções entre as diversas etnias e grupos religiosos. A perspectiva de o imperialismo manipular essas divisões para balcanizar o país, jogando uma parte do território na completa barbárie e controlando as zonas petroleiras estratégicas, como o norte do Iraque, fracionando o país, é um horizonte cada vez mais discutido nos gabinetes da Casa Branca.

FORTALECER A RESISTÊNCIA POPULAR MULTIÉTNICA PARA EXPULSAR O IMPERIALISMO!

A própria conjuntura mundial está se polarizando rapidamente a partir da instabilidade capitalista no Oriente Médio. A resistência iraquiana está representando o maior freio à ofensiva imperialista, cujo segundo mandato de Bush vai dar seqüência. Por isso as ameaças contra o “eixo do mal” lançadas pelo discurso de Bush contra as “tiranias antidemocráticas”.

No caso específico do Oriente Médio, a chantagem imperialista contra o programa nuclear iraniano é parte de uma imensa pressão ianque para disciplinar os xiitas que ascenderam ao governo títere no Iraque. Bush e Condoleeza Rice desejam neutralizar ao máximo a influência iraniana no país vizinho ocupado para, no curso dessa chantagem, bombardearem o Irã com o objetivo de controlar toda a região através do suporte militar do enclave nazi-sionista. Como parte dessa estratégia está à própria eleição na Palestina, onde Abbas foi designado pelo imperialismo para combater as organizações políticas palestinas que resistem a selar um “acordo de cessar-fogo” com Sharon para pôr um fim imediato à Intifada e aos ataques da máquina de guerra sionista.

As tendências à facistização do imperialismo ianque são cada vez mais claras e somente o proletariado revolucionário pode deter essa sanha belicista contra os povo através da construção de um partido mundial da revolução. A recente frente única entre a Síria e o Irã é apenas uma medida defensiva das direções nacionalistas burguesas desses países que desejam negociar em melhores condições sua rendição, como provou a conduta de Milosevic na Iugoslávia, do Taleban no Afeganistão e, recentemente, de Saddam Hussein no Iraque.

A questão central para o Ira-que durante os próximos meses continua sendo o desenvolvimento da resistência popular, que precisa estar sob o signo da unidade e de um programa revolucionário, superando as disputas étnicas e religiosas, manipuladas pelas direções nativas e a Casa Branca em favor de interesses burgueses. Mais do que nunca, o objetivo central dos combatentes iraquianos é forjar uma direção revolucionária, que rompa com o programa teocrático-burguês, para avançar na tarefa de derrotar e expulsar o imperialismo do Iraque, edificando um país livre do jugo do capital.


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