Há um
ano do governo da frente popular: Arrocho salarial e repressão política, estas são as duas faces do governo Lula para os trabalhadores O governo da frente popular encabeçado por Lula acaba de completar um ano de mandato. Neste curto período, avançou-se mais do que em 12 anos da chamada era “neoliberal” (iniciada por Collor em 1990) no que concerne ao desmonte do Estado nos setores dos serviços de “proteção social”, uma aparente contradição, originando-se de um governo social-democrata nos moldes “tupiniquins”. O Partido dos Trabalhadores que nasceu sob a influência política de uma imensa base proletária, segue por suas próprias vias “periféricas” o caminho da social-democracia européia, campeã na liquidação do “welfare state” surgido em meados do século passado. A “terceira via” brasileira, assim como seus amos europeus, mostrou-se o gerente mais confiável para assumir os negócios da burguesia em uma etapa de profundas turbulências políticas e crises na economia capitalista. Seria um grosseiro erro político
imputar ao governo do PT representar a mera continuidade do seu antecessor, o
tucano FHC. A frente popular, apesar de alimentar-se da mesma fonte do PSDB em
matéria de programa de governo, o receituário do Consenso de Washington, foi
muito mais além, o que seria muito difícil para um governo comandado por um
partido tradicional da burguesia realizar: o aprofundamento da recolonização
imperialista do Brasil. A integração absoluta das direções sindicais e
políticas do movimento operário ao aparelho do Estado burguês é o elemento que
confere “personalidade própria” ao governo da frente popular em relação aos
governos burgueses antecessores. Utilizando-se deste tremendo
“handicap”, ou seja, a cooptação do movimento de massas e demonstrando um
servilismo sem precedentes ao imperialismo ianque, Lula conquistou um midiático
“consenso” nacional e internacional
sobre seu governo. Elogiado pelo FMI e Banco Mundial como um “exemplo para toda
a América Latina”, o governo do PT renovou o acordo com o FMI em bases ainda
mais draconianas do que em 2002. O chanceler da frente popular, Celso Amorim,
firmou um cronograma para a implantação da chamada “ALCA Light” para 2005,
recebendo aplausos pelo seu “realismo” desde o governo Bush até a esquerda
reformista brasileira. No plano interno, o governo do PT ampliou sua base de
sustentação política a praticamente todos os partidos burgueses do Congresso
Nacional. Além do PL, PTB, PPS, PSB, PCdoB, somaram-se agora o PMDB e o PP,
este último, herdeiro da Arena, partido criado para apoiar o regime militar e
que conta em seus quadros com a presença do ex-governador Paulo Maluf. Para não
deixar dúvidas sobre a hospitalidade fisiológica do governo do PT em relação ao
PP, é o próprio Genoíno Neto, presidente do PT, quem qualifica o novo aliado de
Lula: “Há membros importantes no PP, realizando um bom trabalho e com bom
trânsito em setores que o governo Lula considera importantes” (15/01/2004, PT
Notícias). Só ficaram de fora do generoso guarda-chuva estatal petista partes
do PFL, PSDB e PDT. Quanto à chamada esquerda “radical”, como o PSTU e os
parlamentares recém-expulsos do PT, mesmo sendo atacados pela máquina
“trituradora” da frente popular, negam-se a estabelecer a oposição frontal ao
governo Lula. O REAL SIGNIFICADO DA VITÓRIA DE LULA Tem se tornado comum, entre a esquerda
em geral, caracterizar a vitória eleitoral de Lula como a “conquista do poder
pelo PT”. Nada mais equivocado, do ponto de vista teórico, e desastroso do
ângulo político. A ascensão ao governo central, por parte da frente popular,
não significa que tenha chegado ao poder, que para os marxistas significa o
absoluto controle do conjunto das instituições estatais, tendo as FFAA como seu
eixo fundamental. Um exemplo clássico de uma frente popular que chegou ao poder
estatal, mesmo sem revolucionar o modo de produção capitalista, é o do triunfo
militar da Frente Sandinista (FSLN) na Nicarágua no final da década de 70. A
FSLN demoliu o exército do ex-presidente Somoza, a Justiça, o Parlamento, etc.
e, em seu lugar, reconstruiu instituições sob seu controle direto. Ao deixar o
governo em 1990 pela via de uma derrota eleitoral, manteve por um longo tempo o
comando das FFAA e da Corte Superior de Justiça. Diametralmente oposto é o caso
da vitória eleitoral da frente popular no Chile, em 1970, encabeçada pelo PS de
Salvador Allende. A frente popular chilena nunca deteve o poder estatal,
cabendo à cúpula militar das FFAA a incumbência de apeá-la violentamente do
governo no momento em que percebeu a ameaça política das massas ao establisment
e a impotência do governo Allende em neutraliza-las. O governo Lula nem sequer
controla o próprio Banco Central, formalmente subordinado ao executivo, mas de
fato, “ocupado” pelos banqueiros internacionais. Isto sem falar das FFAA,
Justiça, etc.. Afirmar que a frente popular no Brasil “chegou ao poder”, como
por exemplo faz o PSTU, significa semear ilusões criminosas de uma mudança
inexistente no caráter de classe do Estado sob o governo Lula, além de desarmar
a classe operária de seu objetivo histórico da conquista do poder estatal por
meio da revolução socialista, ou seja, a ruptura cabal do conjunto das
instituições vigentes e sua substituição por organismos de caráter soviético. A eleição de Lula, embora contando com
forte apoio popular, significou apenas que a burguesia nacional e o
imperialismo resolveram trocar temporariamente seu “gerente” à frente do
governo central, em um momento de esgotamento da gestão tucana e na ausência de
uma força política mais confiável que o próprio PT. A “convocação” do PT por
parte da burguesia para ocupar pela primeira vez a Presidência da República,
longe de significar uma “expressiva vitória das massas”, representou a
conveniência de neutralizar o movimento operário em um momento de profundos
“ajustes” (leia-se ataques às conquistas sociais). A QUEM SERVE O GOVERNO DA FRENTE POPULAR Os números do primeiro ano do governo
Lula falam por si só. Afinal, não podemos acusar de mentirosas as promessas da
frente popular de não “quebrar contratos”, pelo menos com os banqueiros... Para
o pagamento de juros e amortizações da dívida pública foram destinados 167
bilhões de reais. Houve um enorme contingenciamento dos gastos sociais
“necessário” para alcançar um superávit primário de 5% do PIB, meta imposta
diretamente pelo FMI. A massa salarial nacional encolheu mais de 13% e o
desemprego chega na casa dos 15% só em São Paulo, pelas estatísticas do próprio
IBGE. Em contrapartida, o chamado “mercado”
comemora com euforia as benesses do governo petista. A Bolsa de Valores superou
seu “pico” histórico no ano de 2003. O capital volátil entra e sai do país e
nem sequer paga a malfadada CPMF, ao contrário dos salários dos trabalhadores,
tributados até à medula. O Risco País recuou de 24% para 5%, os “C-Bonds”
atingiram seu valor de face e a cotação do câmbio mostra-se sob controle. Um
cenário de “calmaria”, comparado ao final de 2002; só um pequeno detalhe ofusca
a “ilha da fantasia” do PT, o remédio ministrado pelo FMI foi tão exemplarmente
ingerido, que o país teve sua economia mergulhada em uma brutal recessão com um
crescimento anual do PIB equivalente a zero! Na arena política, a retomada das
reformas “neoliberais” iniciadas por Collor, seguidas pelo governo FHC e
aprofundadas pela frente popular, adentra agora na etapa da “flexibilização”
das conquistas operárias. Aprovada a reforma da Previdência, que tinha como
alvo a retirada dos direitos históricos do funcionalismo público das três
esferas, a reforma “trabalhista” entra em pauta tendo na mira um objetivo mais
abrangente, o conjunto dos assalariados do país. No campo, os trabalhadores rurais
amargaram na carne a política de “ajuste” do governo do PT. O Incra prometeu
assentar 60 mil famílias, efetivou apenas 10 mil em 2003, a metade do último
ano do governo FHC. Segundo dados do MST, inteiramente integrado aos cargos do
Ministério do Desenvolvimento Agrário, ocupado pela DS, seção do SU no Brasil,
existem mais de 250 mil famílias acampadas em precárias condições de vida.
Segundo um relatório da CPT, ligada à igreja católica, em 2003, foram
assassinados 60 trabalhadores rurais, mais que o dobro dos ocorridos em 2002.
Isto sem falar nas prisões das lideranças do próprio MST, acusadas de
desrespeitarem o “Estado de direito”. A brutal repressão patrocinada pela
polícia Federal aos grevistas da Previdência Social, as prisões e assassinatos
no campo das lideranças rurais não são fatos isolados, significam um fio de
continuidade no caráter de classe do atual governo da frente popular. O governo
Lula já declarou guerra aberta aos trabalhadores em seu primeiro ano de
mandato, declaremos guerra de classe ao novo governo do capital financeiro e da
burguesia industrial! A RESISTÊNCIA DAS MASSAS E AS PERSPECTIVAS PARA 2004 A classe trabalhadora protagonizou
importantes lutas em nível nacional em no ano passado. A greve nacional do
funcionalismo público significou um marco no enfrentamento objetivo com a
política pró-imperialista do governo da frente popular. No entanto, a ausência
de uma direção revolucionária na condução destas lutas permite que correntes
revisionistas acabem por centralizar os movimentos sociais com programas
democratizantes, dando fôlego para o governo petista “manobrar” politicamente
por sobre as ilusões da classe trabalhadora. Foi assim que o governo Lula conseguiu
ultrapassar a “tormenta” ileso, partindo para a ofensiva contra a esquerda,
conseguindo inclusive depurar o PT dos “críticos” de seu governo. A tendência política predominante para
o ano corrente é o da continuidade da “lua-de-mel” entre Lula, a burguesia
nacional e o imperialismo. O cenário internacional econômico aponta para uma
espera na definição das eleições presidenciais norte-americanas, que ocorrerão
em novembro, para só então se retomar um novo ataque especulativo ao Brasil,
nos moldes dos que ocorreram em 1999 e 2002. No decorrer de 2004, a Casa Branca
deverá estimular os fluxos de capital volátil, gerando crédito “abundante” ao
Brasil, recebendo em “troca” a solidificação da ALCA por parte do governo Lula. As eleições municipais de outubro
deverão consumir a atenção das correntes reformistas, imobilizando a ação
independente da vanguarda política mais combativa. Em um quadro de relativa
estabilidade econômica e de ausência de lutas nacionais, a vertente política
hegemônica deverá ser a de uma vitória folgada do PT e seus aliados da base de
sustentação parlamentar do governo Lula. A polarização de “oposição” a Lula
deverá ficar a cargo dos cambaleantes PSDB e PFL, fracionados pelas “ofertas”
amistosas do Palácio do Planalto. O chamado “novo partido de esquerda”, sequer
pretende participar das eleições municipais, devendo indicar o voto nos
candidatos da “esquerda petista”, ou mesmo nas candidaturas majoritárias
oficiais do PT. Os parlamentares “radicais”, tendo à frente a senadora Heloísa
Helena, que continua como membro da DS, pretendem vegetar seu crescimento à
sombra da frondosa árvore da frente popular, aguardando um futuro e possível
desgaste eleitoral do governo Lula somente em 2006. Para o PSTU resta o papel
de amargar seu “isolamento” eleitoral entre os revisionistas em função de sua
pecha de “ortodoxo” ou diluir-se por completo no pântano da “nova esquerda”. Para os trotskistas da LBI, que desde
muito tempo aprenderam a remar contra a corrente, continua a persistente e
paciente tarefa de publicitar o programa marxista revolucionário da denúncia
vigorosa do governo de colaboração de classes da frente popular, combinando a
possibilidade de agitação política mais ampla em cada oportunidade concreta, a
cada passo na ação independente do proletariado. A consígnia da construção de
uma alternativa de poder dos trabalhadores, apesar da relativa sedimentação do
governo Lula, continua vigente em toda a sua atualidade política. A luta por um
autêntico governo operário e camponês é a contrapartida programática que
devemos apontar diante do engodo embusteiro do governo burguês Lula-Alencar.
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