O POR argentino (Gamboa) fraciona-se mergulhado em seu próprio revisionismo e oportunismo

Estamos reproduzindo, logo depois desta introdução, as principais partes do documento "O POR da Argentina, sua degeneração oportunista e sua atuação frente à crise argentina" do companheiro Daniel Bengoechea (dirigente excluído administrativamente do POR argentino), que busca, a partir de um balanço político da intervenção do POR no último período, demonstrar a degeneração política de uma organização que se vergou às pressões de classes, cujo oportunismo e o centrismo são a bússola para sua orientação política na luta de classes.

LBI considera importante debater alguns aspectos deste documento, tanto do ponto de vista dos acordos como das diferenças com o companheiro Daniel Bengoechea, que participou ativamente do processo de construção, entre 1999 e 2000, das Jornadas de Debates Internacionais pela reconstrução da IV Internacional, impulsionada pela LBI e o POR argentino, dirigido por Gustavo Gamboa.

As Jornadas de Debates, que o POR acabou por auto-excluir-se, foram parte da luta obstinada da LBI em formar um pólo internacional de atração revolucionária a partir do avanço de uma profunda delimitação programática que pontuasse acordos e divergências entre a LBI e o POR. Por força de duras polêmicas, o POR inflexionou à esquerda, aproximando-se das posições da LBI, o que permitiu alicerçar uma base de acordos no campo do defensismo revolucionário, da questão nacional, da concepção leninista de partido e da estratégia da revolução proletária.

O documento caracteriza esse giro à esquerda do POR como simples adaptação e adesão programática à LBI e confere um caráter "menor" à questão que motivou a ruptura das Jornadas de Debates (participação ou não do grupo "Fração Trotskista"/FT - nos debates). Desse modo, o companheiro acaba por minimizar tanto a fortaleza programática da LBI, como ignorar a fragilidade política, programática e mesmo ideológica do POR, ao capitular a um "grupo" oportunista e frente-populista como a FT.

Em todo processo de aproximação entre organizações há um certo grau de tensionamento real, isto é, pressões de classes que expressam tendências contraditórias e revelam limitações programáticas. No caso do POR argentino, o tensionamento da LBI ofuscou formal e temporariamente o peso da herança oportunista do lorismo.

Por trás de uma decisão aparentemente administrativa — defender a participação da "FT" nas Jornadas — o POR revelou sua incapacidade de combater a frente popular, optando pelo federativismo e a surrada diplomacia centrista para garantir boas relações organizativas com este "grupo-indivíduo", como bem caracteriza o documento de Daniel. Com estes métodos, o POR colocou-se na contramão da tarefa de reconstruir a IV Internacional.

Como todo trabalho de reagrupamento político resulta no desenvolvimento de processos de rupturas e fusões no marco de um debate duro e honesto, consideramos que a própria exclusão administrativa do companheiro Daniel é um efeito retardado do tensionamento da LBI frente às contradições e às debilidades programáticas do POR.

Portanto, o que levou a não realização das Jornadas de Debates Internacionais num quadro de unidade entre os dois núcleos partidários, a partir da auto-exclusão do POR, não foram os "despropósitos organizativos", como minimiza Daniel, mas sim a própria concepção programática centrista do POR.

Também há uma enorme incompreensão política quanto à questão da FUA. Daniel critica o POR por aplicá-la não taticamente como supostamente recomenda as Teses do Oriente, mas estrategicamente, ao defender "uma frente que unifique todos que lutam" durante a crise argentina em 2001. Afirma ainda que a diferença entre a FUA das Teses do Oriente (tática) e a Frente Popular (estratégia) se estabelece "sutilmente" no terreno prático. Isto é uma completa estupidez política. É justamente estas "sutilezas" que justificavam as maiores traições e derrotas da classe operária.

É necessário mais uma vez clarificar essa questão da FUA do ponto de vista do marxismo e não da subjetividade militante. As Teses do Oriente, redigidas por Bukarin e aprovadas no IV Congresso da Internacional Comunista em 1922, defendia que nos países coloniais e semicoloniais a revolução teria um caráter democrático-burguês e não proletário. A revolução proletária seria, portanto, produto do desenvolvimento de etapas históricas, cuja primeira fase prevê a constituição de uma "frente antiimperialista comum", encabeçada pela burguesia nacional.

Na verdade, as Teses do Oriente defendem a revolução por etapas, diferenciando as revoluções democrático-burguesas nos países atrasados da revolução socialista nos países imperialistas. São, portanto, o embrião das frentes populares e foram superadas historicamente pelas Teses da Revolução Permanente, organizadas por Trotsky em 1929.

Nesse sentido, a FUA das Teses do Oriente, reivindicada pelos loristas, arrependidos ou não, como um patrimônio programático, não passa de uma reles frente de colaboração de classes, a exemplo de sua aplicação na China para formar uma frente nacional entre o Kuomintang, de Chiang Kai-Cheq, e o PC, durante o processo revolucionário de 1925-27, a qual Trotsky foi um opositor ferrenho. Este precedente histórico da aplicação da FUA sela o veredicto sobre o caráter das Teses do Oriente.

Não há diferença entre a FUA das Teses do Oriente e a frente popular. Nesse sentido, o POR é coerente com sua política contra-revolucionária quando se diluía, em plena situação pré-revolucionária na Argentina, nas assembléias populares, abandonando a classe operária sob a direção do peronismo e da burocracia sindical. Daí, o próprio Daniel constatar que "a atuação que o POR faz dela [FUA] atualmente não o diferencia muito dos reformistas e centristas, sendo sua conseqüência imediata a atadura ideológica e organizativa da classe operária à pequena-burguesia e à burguesia nacional".

Em que pese as corretas críticas à intervenção do POR nos levantes do ano passado, o companheiro Daniel não rompe com a herança lorista e apologiza objetivamente o caráter frente-populista da FUA das Teses do Oriente.

Definitivamente, os revolucionários só podem conceber a existência de uma frente única antiimperialista apenas e somente como uma tática de unidade de ação, com objetivos antiimperialistas bem precisos e pontuais, guardando sempre sua independência política em relação aos aliados, num processo único de revolução permanente.

Apesar de nossas diferenças, convém também ressaltar algumas convergências políticas importantes. A primeira delas é a crítica ao pacifismo pequeno-burguês do POR que condena a violência revolucionária e a autodefesa do proletariado para conquistar o poder operário. Prefere solidarizar-se com o carrasco vitimado pela ofensiva vingadora das massas oprimidas pelo Estado capitalista. A condenação ao ETA na luta pela autodeterminação do povo basco, reivindicando inclusive sua destruição política, corresponde à mesma capitulação criminosa ao imperialismo quando o POR considerou o ataque de 11 de Setembro aos EUA como "barbárie do terrorismo criminoso", solidarizando-se com as "vítimas inocentes" do atentado.

A esquerda pseudotrotskista tem sistematicamente se adaptado às pressões da opinião pública pequeno-burguesa, tratando a questão da violência e da luta armada segundo a moral burguesa e, desse modo, tem atestado sua falência para a revolução socialista.

Outro acordo com o documento diz respeito à concepção leninista de partido e seus fundamentos político-organizativos, como o centralismo democrático, hierarquia e disciplina militante, partido de vanguarda, de quadros verticalizados.

As críticas do companheiro Daniel ao regime interno do POR (aparatismo, frouxidão organizativa, artificialidade do centralismo, burocratismo...) caracterizados simplesmente de "erros organizativos", são o reflexo da concepção lorista de partido menchevique, isto é, partido estruturado horizontalmente para acomodar interesses pessoais de sua militância pequeno-burguesa, sem chefes nem quadros profissionais, enfim, uma estrutura empírica e liberal, regida por acordos de conveniência. Trotsky afirmava que "o regime interno do partido é, para o marxista, um elemento de controle insubstituível da linha política".

Os revolucionários polemizam para clarificar melhor as posições políticas, em busca de um terreno comum para a intervenção política na luta de classes. Mesmo considerando que a base de ruptura do companheiro Daniel seja limitada, mas visivelmente progressista, a LBI reconhece o caráter valioso dessas críticas para a tarefa de formação de um pólo principista que rompa o isolamento dos revolucionários e avance na construção de uma nova tendência quarto-internacionalista, o Partido Mundial da Revolução.


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