ELEIÇÃO DO CORONEL LUCIO GUTIÉRREZ NO EQUADOR

A centro-esquerda burguesa assume mais um governo para tentar estancar a crise capitalista latino-americana

Marcado por um período de forte crise econômica, ocorreu no Equador, em novembro, o segundo turno da eleição presidencial. Foi vitorioso o coronel Lucio Gutiérrez do Partido Sociedade Patriótica 21 de Janeiro, derrotando o megaempresário Álvaro Noboa do Partido Renovador Institucional Ação Nacional, proprietário das Bananas Fruit, considerado o homem mais rico do Equador. Gutierrez esteve vinculado ao levante indígena-camponês que depôs o governo pró-imperialista de Jamil Mahuad em 2000, onde aliado com a direção da Conaie (Confederação das Nacionalidades Indígenas) e a políticos burgueses da oposição, conformou a Junta de Salvação Nacional que covardemente impôs uma derrota ao movimento através de uma manobra burguesa "constitucional" que permitiu o vice-presidente Gustavo Noboa assumir o governo. Compactuando com o regime, a Conaie desmobilizou milhares de indígenas que ocupavam a capital Quito e prometeu uma trégua de seis meses ao "novo" governo e que se manteve por todo o seu mandato.

Após a desmobilização iniciou-se o período de perseguição onde o próprio Lucio Gutierrez juntamente com mais de 50 oficiais que se somaram as manifestações foram presos, além das ameaças que sofreram várias outras lideranças.

Com um governo frágil e exclusivamente dependente das forças armadas, Gustavo Noboa continuou a impor ainda mais ferrenhamente os ditames do imperialismo. Com a complacência das direções que lhe deram trégua, Noboa implementou no Equador a primeira dolarização da América do Sul, seguindo fielmente aos pacotes de ajuste econômico ditados pelo FMI. A dolarização causou uma crise ainda maior, já que atingiu diretamente os dois principais produtos da economia: o petróleo e a banana. Para continuar pagando os juros da dívida externa, Noboa aumentou os preços dos gêneros de primeira necessidade e das tarifas públicas, promovendo cortes nos gastos sociais, gerando ainda mais desemprego e miséria.

Apesar do levante de 2000 não representar uma insurreição popular do ponto de vista marxista, pela completa ausência da intervenção política da classe operária organizada, devido a inexistência de organismos de duplo poder e do armamento popular, como várias organizações de esquerda afirmavam a época, ele colocou um futuro panorama de fortes enfrentamentos populares contra o regime. Diante da situação catastrófica em que vive a maioria dos mais de 12 milhões de equatorianos, dos quais 80% são indígenas, as direções da Conaie e das centrais sindicais, estas controladas pelo PC, PCMLE (maoísta) e a social-democracia, frearam qualquer mobilização de indígenas e operários que pudesse deflagrar um levante que fugisse do controle e das pretensões reformistas das direções, colocando em xeque o regime.

Estabelecido um verdadeiro pacto de governabilidade entre as direções e o governo, este teve toda a oportunidade para jogar sobre os ombros das massas todo o ônus da crise econômica. Apesar das esparsas lutas e confrontos que houveram no governo de Noboa estes foram insuficientes para garantir qualquer derrota aos pacotes de ajuste econômico do FMI. Apostando na perspectiva eleitoral, as direções da Conaie e dos PCs, fizeram todo possível para canalizar a insatisfação das massas para uma saída institucional através das eleições.

GUTIERREZ VENCE AS ELEIÇÕES SOB O SIGNO DA COLABORAÇÃO DE CLASSES E DA SUBORDINAÇÃO DAS MASSAS ÀS DIREÇÕES REFORMISTAS

A burguesia assim como na época do levante de 2000, contando com a colaboração das direções, conseguiu novamente impor uma saída "constitucional" nos marcos do regime capitalista para impedir o avanço das massas descontentes com a atual situação.

O perigo de um novo levante que fugisse ao controle das direções reformistas da Conaie levou a burguesia a apresentar como saída o coronel Lucio Gutiérrez, que havia participado da Junta de Salvação Nacional que depôs Mahuad em 2000.

Apesar de ter feito campanha como um novo governo a transformar o país e prometer tirar da pobreza milhões de equa-torianos, Gutiérrez se demonstra como mais um capacho do imperialismo ianque disposto a cumprir seus interesses.

Assim como na plataforma da Junta de Salvação Nacional, o programa de Gutierrez se restringe a moralizar o Estado burguês: "O principal é a luta contra a corrupção para o qual propomos a despolitização, a despartidizacão e o fortalecimento das instituições democráticas equatorianas..."(entrevista concedida ao Comitê Internacionalista Arco Íris, 24/11/02). Sem apresentar qualquer resquício de ruptura com a burguesia nacional e o imperialismo, Gutiérrez se propõe a conformar " um governo de convergência nacional, onde estejam os empresários honestos, também os banqueiros honestos e onde estejam também os movimentos sociais progressistas" (idem).

O programa de Gutiérrez se encaixa como uma luva aos projetos do imperialismo, promovendo os acordos que interessa ao FMI, e mantendo as massas sob sua tutela, através das direções da Conaie e dos estalinistas que dirigem as principais centrais sindicais e que diante de qualquer levante expontâneo não vacilarão em reprimir os descontentes.

Assim como a Frente Popular no Brasil, o novo governo da centro-esquerda burguesa do Equador já anuncia sua condição de serviçal do imperialismo mantendo a dolarização, cortes de salários e redução de gastos sociais com o objetivo de reduzir o déficit fiscal e pagar os juros da dívida externa. Ao mesmo estilo de Lula, já se reuniu com banqueiros, empresários, funcionários do FMI e assessores do governo Bush para garantir o pagamento da dívida externa e a espoliação do país.

Seguindo fielmente o estilo dos novos presidentes "centro-esquerdistas", Gutiérrez propõe a integração do Equador à Alca, reivindicando seu "espaço" nas negociações. No plano militar concorda plenamente com a manutenção da base militar americana instalada no Equador com o pressuposto de "combater o narcotráfico", recebendo suas vantajosas quantias em dólares, além de apoiar a vigência do famigerado Plano Colômbia que prevê a ocupação militar da Amazônia.

Mesmo aqueles que esperavam um novo Chávez no Equador, Gutiérrez trata logo de negar a sua comparação com o governo venezuelano, apesar de lhe ter feito elogios durante a campanha eleitoral. Pressionado pelo imperialismo passou a condenar suas atitudes e desaprovando seu governo por ser um governo que não mantém a "unidade nacional", se propondo a constituir no Equador um governo de "reconstrução nacional" que congregue tanto a esquerda como a direita. Com essas posições passou a ser preferido pelas classes dominantes, mais do que o próprio Álvaro Noboa: "Mas observadores políticos daqui também vêem Gutiérrez como um político mais moderado do que Noboa com sua imagem radical" (O Estado de São Paulo, 24/11/02).

Diante da insatisfação das massas na América Latina, a burguesia tem forjado em determinados países, governos de centro-esquerda que foram eleitos com a ilusão de atender ao clamor dos trabalhadores por mudanças mas que atendem plenamente aos interesses do capital ianque. Assim como Lula no Brasil e Chávez na Venezuela, Gutiérrez não foi uma exceção ou particularidade do Equador, perante a situação de crise mundial que passa o capitalismo. Como definiu Trotsky no Programa de Transição, o imperialismo tem usado governos de colaboração de classes como forma de deter o avanço dos trabalhadores rumo a revolução proletária. Porém estas são apenas "tapa-buracos" e logo tenderão a cair ou sob o levante revolucionário das massas ou sob o ascenso do fascismo.

DIREÇÃO TRAIDORA DA CONAIE, DO PC E O PCMLE SÃO RESPONSÁVEIS PELA COLABORAÇÃO DE CLASSES E DERROTA DO MOVIMENTO INDÍGENA-CAMPONÊS

Sendo apoiado pelo Pachakutic, o braço político da CONAIE, pelo PC maoísta e setores sociais-democratas, o governo de Lucio Gutiérrez nasce como fruto da canalização da insatisfação das massas para o meio institucional. A covardia e a traição das direções reformistas têm levado inúmeros levantes a uma fragorosa derrota tanto no Equador como na América Latina.

A Conaie já divulgou sua posição de simples conselheira do governo, onde já se prontificou a manter a estabilidade do regime e a governabilidade do país, assim como fez com Gustavo Noboa após este ter sido indicado pelo imperialismo para substituir o odiado governo Mahuad em 2000.

Toda esta política de traição de classe se baseia no velho programa estalinista de se aliar com a decadente burguesia "progressista" e com militares "nacionalistas", jogando o movimento de massas a sua derrota certa. A História está repleta destes exemplos, e até pseudo-trotskistas como o morenismo e o POR boliviano defendem a aliança com setores "nacionalistas" e "patriotas" das FFAA, que se utilizam dos explorados como apêndice para ganhar espaço na divisão do aparato do Estado burguês, depois golpeando repressivamente o movimento de massas.

A burguesia nacional como sócia menor do imperialismo é incapaz de realizar qualquer mínimo enfrentamento com o grande capital. Na atual fase imperialista as mais simples reivindicações democráticas se tornam impossíveis de serem atendidas por um governo burguês, como a reforma agrária e as melhorias das mínimas condições de vida para os trabalhadores, saúde, educação, emprego, etc.

A população equatoriana, formada basicamente por indígenas que historicamente cumprem o papel de camponeses, resiste heroicamente com levantes em defesa de suas terras e contra a carestia e a miséria, mas apesar dessas lutas, estes não possuem uma perspectiva revolucionária de destruição do Estado Burguês, facilitando que na ausência de uma direção revolucionária, direções conciliadoras tomem à frente dos levantes.

CONSTRUIR A DIREÇÃO REVOLUCIONÁRIA PARA UNIFICAR OPERÁRIOS E CAMPONESES NA TOMADA DO PODER ATRAVÉS DA REVOLUÇÃO SOCIALISTA

A classe operária esteve dispersa nos levantes, não forjou sua vanguarda revolucionária e não atuou de forma decisiva no cenário político latino-americano.

Com a imposição das medidas econômicas do FMI, as ilusões das massas no governo Gutiérrez não tardarão a serem desfeitas. Mas, por mais heróicos e combativos que possam ser os levantes camponeses, estes serão incapazes de adquirir um caráter revolucionário se não estiverem aliados aos operários. Se valer da enorme combatividade dos trabalhadores equatorianos e forjar a vanguarda revolucionária é a primordial tarefa a ser cumprida neste momento. Somente sob a direção da classe operária, os milhões de camponeses encontrarão o caminho correto a ser trilhado para acabar com a secular exploração e morticínio a que estiveram sujeitos. Os trabalhadores deverão construir seus organismos próprios de poder, expropriando os latifúndios e as grandes empresas, garantindo suas conquistas através das milícias armadas. Porém para forjar a direção revolucionária, é necessário denunciar, combater e superar as direções reformistas e traidoras que jogam os trabalhadores sob o comando da burguesia e de militares "nacionalistas", utilizando de suas organizações políticas para barganhar seu espaço no Estado burguês lançando a ilusão de que é possível no sistema capitalista acabar com as mazelas sociais.

Somente a construção de um autêntico partido operário revolucionário internacionalista e trotskista que se delimite com as direções traidoras, poderá atender as necessidades imperiosas das massas através da Revolução Socialista, construindo o Governo Operário e Camponês. Superar a política da política de colaborações de classes e dos próprios governos de "centro-esquerda" que ascendem no continente latino-americano é a chave para liquidar com a opressão continental que existe sobre os povos latino-americanos por parte do imperialismo, construindo a Federação Socialista das Repúblicas Soviéticas da América Latina.


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