O artigo abaixo foi elaborado quando o Taleban ainda não havia sido totalmente derrotado militarmente e o imperialismo não controlava Kandahar, cidade que até então era o núcleo central de resistência da milícia islâmica. Hoje, quando as tropas ianques já ocupam as principais cidades do território afegão e contingentes militares de outros países imperialistas desembarcam no Afeganistão, os prognósticos lançados naquele momento se confirmaram integralmente: a orientação nacionalista burguesa do Taleban foi responsável pelo seu absoluto colapso militar e político, na medida em que foi incapaz de galvanizar o sentimento antiimperialista das massas afegãs, árabes e muçulmanas em um amplo movimento de massas contra a investida assassina anglo-ianque. Ao contrário, a milícia taleban desintegrou-se em diversos bandos armados, que aos poucos foram se rendendo, ou mesmo aliando-se às tropas imperialistas, tendo como objetivo deter alguma fatia de poder no atual governo imposto pela ONU.

A milícia taleban trilha o mesmo caminho histórico de Galtieri na Argentina, Saddam Hussein no Iraque e Milosevic na Iugoslávia, que capitularam vergonhosamente e não desencadearam uma luta conseqüente pela derrota do imperialismo, acabando por perder a guerra praticamente sem luta. Essa conduta é produto direto do programa nacionalista burguês do Taleban e reafirma a completa impotência das burguesias nacionais e suas organizações políticas de enfrentarem a ofensiva imperialista sobre as semicolônias e os povos oprimidos. Como conseqüência da desgraçada ilusão contra-revolucionária de que os setores "nacionalistas" da burguesia árabe poderiam encabeçar a luta pela expulsão do imperialismo da região, o Taleban foi derrotado de forma humilhante, sendo seus combatentes completamente desmoralizados, já que o conjunto da burguesia árabe, de um lado, subordinou-se ao imperialismo em troca de alguma migalha econômica que contemplasse seus interesses de classe, temendo, por outro lado, enfrentar a fúria militar ianque caso esboçasse resistência a seguir suas ordens.

A guerra de rapina do imperialismo ianque no Afeganistão adentra neste momento em uma nova fase. Como já delineava o artigo, começa a imposição dos interesses econômicos e políticos do imperialismo ianque e europeu por meio de um governo central de composição ditado pela ONU, ao mesmo tempo que o imperialismo ameaça estender sua investida militar contra outras semicolônias, como o Iraque, Iêmen e Somália.

Com a derrota da nação oprimida, o imperialismo ianque chega ao ápice da ofensiva política e militar contra os povos e as nações oprimidas desencadeada desde a queda da URSS e do Leste europeu, o que reafirma a imperiosa necessidade da construção do partido mundial da revolução como única via de dirigir o proletariado e os povos oprimidos do planeta para a liquidação do monstro imperialista.


DERROTA VERGONHOSA NA GUERRA IMPERIALISTA

Falência política do Taleban aponta mais uma vez a necessidade da construção do Partido da Revolução mundial para derrotar o imperialismo!

• Artigo extraído do jornal Luta Operária n.º 54, Novembro-Dezembro/2001

A mídia capitalista mundial festejou freneticamente a "tomada" de Cabul em 12 de novembro pelas forças da Aliança do Norte (AN), como o início do fim do regime Taleban no Afeganistão. Imediatamente após a entrada dos mercenários assassinos agrupados sob a bandeira da AN na capital afegã, encerrou-se as veiculações em nível mundial da TV Al Jazeera (seu escritório foi destruído em Cabul), apesar desta continuar sua cobertura da guerra, agora, restrita a alguns países muçulmanos. A rede ianque CNN passou a ter exclusividade das transmissões desde o Afeganistão, supostamente mostrando a "grande festa" da população, que, segundo a CNN, "alegrou-se" com a presença de seus antigos carniceiros e bandidos da AN que quase dizimaram a população civil de Cabul há seis anos atrás. Tudo parecia um filme de Hollywood com o novo "Rambo" da AN como protagonista central.

Na realidade, nunca aconteceu uma "queda" ou "tomada" de Cabul, no estrito sentido militar do termo. O que se passou foi a retirada organizada dos talebans das principais cidades afegãs (Cabul, Mazar-e-Sharif etc.) como parte de uma tática militar e política, que acabou por fracassar no próprio curso das operações militares de retirada das tropas talebans. Mazar-e-Sharif foi ocupada quase sem resistência, Cabul foi desocupada sem a troca de um único tiro e Kandahar, cidade que é o núcleo central do Taleban também deveria ser desocupada sem luta, segundo a tática inicial do Taleban, que naufragou no meio do caminho. O plano militar do Taleban e do grupo de Bin Laden, Al Qaeda, era bem simples, seguindo toda a tradição de ocupações estrangeiras no Afeganistão. Não deveria ser processados enfrentamentos militares regulares com as tropas da AN, por uma razão óbvia. Estariam se debilitando militarmente no combate com a escória (AN), armada pela Rússia, Irã e os EUA, além de sofrerem pesado bombardeio aéreo pelo ianques. Isto poderia levar o Taleban, a um desgaste militar desnecessário, já que seu objetivo era forçar o exército norte-americano a desembarcar em solo afegão, em grande quantidade de tropas, para travar um enfrentamento através da tática de guerra de guerrilhas, fincando baixas consideráveis às forças ianques, completamente despreparadas para o combate em um território desconhecido e totalmente hostil. Outro elemento determinante na tática inicial dos talebans era que as cidades ocupadas pela AN (conformada por etnias adversárias à etnia pashtun) e odiada pela população pelo seu passado de crimes, logo se sublevariam, obrigando o recuo da AN à sua restrita zona de influência, ou seja, a fronteira com o Uzbequistão e o Tadjiquistão.

A RAZÃO DO COLAPSO DA ESTRATÉGIA MILITAR E POLÍTICA DO TALEBAN

A tática militar que o Taleban pretendia adotar baseava-se em todas as experiências históricas de ocupações estrangeiras no Afeganistão. Entrar com seus exércitos e ocupar as cidades sempre se revelou bastante fácil (assim foi com a Inglaterra e depois com a URSS), dominar e controlar o país sempre se mostrava posteriormente o inferno aos invasores.

A rápida retirada do norte do país pelo Taleban, e a sua surpreendente saída de Cabul, deixou o imperialismo absolutamente confuso. Enquanto no norte do país, as facções da AN que ocuparam Mazar-e-Sharif, principalmente o comandante Rashid Dostun, da minoria usbeque, declaravam guerra entre si pelo controle do norte do país, o imperialismo esforçava-se para que Cabul não fosse ocupada, temendo um confronto morticida entre as facções intestinas da AN do ex-presidente Burhanuddin Rab-bani, o açogueiro de Cabul, Gulbudin Hekmatiar e o comandante Mohamed Fahim, o que de fato se delineia neste momento, mesmo após os acordos firmados em Bonn, na Alemanha.

O grande "furo" na estratégia taleban foi que a burguesia paquistanesa, que influencia politicamente de forma hegemônica a milícia taleban não aprovou a estratégia traçada pelos dirigentes do Al Qaeda e do núcleo duro do Taleban. O exército paquistanês ordenou que o Taleban não desocupasse Kandahar, utilizando sua permanência na cidade como fonte de barganha ao imperialismo ianque, ao mesmo tempo em que o governo do general Pervez Mu-sharraf negocia uma anistia para o mulá Omar, líder supremo do Taleban, que lhe garanta algum espaço em um futuro governo. O conflito entre as "duas orientações" vindas do mesmo Taleban, ou seja, iniciar a guerra de guerrilhas contra os ianques, ou tentar negociar uma porção do território afegão para permanecer sob o controle do Taleban, depurado da Al Qaeda, levou à confusão política e desmoralização de suas tropas que acabaram por entregar suas armas em Herat e serem dizimadas nas prisões de Mazar-e-Sharif pelos genocidas ianques.

A ausência de uma homogeneidade política e programática no interior do Taleban está levando-o a uma derrota humilhante, sem luta e resistência, capitulando sistematicamente às pressões da burguesia paquistanesa, títere do imperialismo ianque e europeu. A tendência majoritária que vem se impondo nesta guerra é a balcanização do Afeganistão, que poderá ser repartido em função dos interesses imperialistas multinacionais. Sob a fachada da luta sanguinária entre as etnias pashtun, usbeque, tagique e hazara, esconde-se os interesses das diversas burguesias que pretendem espoliar os recursos do Afeganistão. A máfia russa tem interesse no comércio do ópio, a burguesia iraniana e turca representam os interesses do imperialismo europeu nas reservas de gás e petróleo, o setor majoritário dos próprios talebans é ligado à burguesia paquistanesa que objetiva transformar o Afeganistão em seu próprio quintal, e por fim a burguesia indiana pretende desestabilizar seu vizinho rival, apostando em sua influência militar na AN.

O imperialismo ianque, que tem como objetivo abocanhar o botim por inteiro sem dividi-lo com nenhuma outra burguesia, não se sente representado plenamente por nenhuma fração militar da AN, procura criar sua própria representação política através da formação de um governo liderado por setores ligados ao antigo rei Zaher Shah. Neste impasse geral, o Taleban, pelo menos seu núcleo duro, vai sucumbindo à sua própria inércia política e militar, enquanto os abutres imperialistas não terminam de montar seu complexo quebra-cabeças para subjugar o Afeganistão.

SOMENTE A ESTRATÉGIA DA REVOLUÇÃO PROLETÁRIA PODE DERROTAR O IMPERIALISMO

Há quem possa objetar que o colapso político e militar do Taleban deve-se fundamentalmente aos covardes e massivos bombardeios ianques sobre suas posições militares e a população civil em geral. É um elemento que não pode ser desconsiderado em um cenário de guerra. A superioridade norte-americana é brutal, aniquilar um país que sequer possui defesa anti-aérea moderna, é sem dúvida, uma tarefa bem mais "fácil" do que se enfrentar com países que detêm uma força aérea bem equipada, como foi o caso da Iugoslávia e do próprio Iraque (ambos países possuem MIG´s - 25 e mísseis soviéticos anticaças).

Mas a substantiva e precisa razão do prematuro colapso do Taleban não reside na superioridade aérea americana. Os bombardeios massivos em países de pouca densidade urbana, e com tropas militares não regulares, a exemplo do Vietnã, por si só não são capazes de aniquilar e derrotar o "inimigo" sem o desembarque de tropas no solo. No Afeganistão, o Taleban vinha conseguindo "driblar" os bombardeios, ancorando suas tropas e armamentos em cavernas nas regiões montanhosas que permeiam o país de ponta a ponta.

O colapso do Taleban, ainda que devemos considerar que o confronto militar está longe de chegar ao seu final, deve-se ao seu próprio impasse político. Não podemos determinar se a linha elaborada inicialmente de preparar a guerra de guerrilhas, na medida do desembarque das tropas ianques foi totalmente abandonada e derrotada politicamente pelo setor Taleban que pretende manter-se usufruindo dos privilégios do poder estatal em pelo menos em parte do território afegão e possivelmente em um futuro governo central de composição entre todos os bandos armados. Neste caso, seria quase impossível manter a resistência militar com possibilidade de vitória exclusivamente nas mãos do Al Qaeda, que sucumbiria em pouco tempo.

O atual impasse que vive o Taleban é produto de sua orientação programática nacionalista burguesa, incapaz de galvanizar as massas afegãs, árabes e muçulmanas, na perspectiva socialista. Mantém-se preso ao fundamentalismo religioso, uma expressão dos próprios regimes de dominação burguesa nos países islâmicos. Longe de organizar um amplo movimento antiimperialista de caráter proletário em todo o mundo, e em particular nos países muçulmanos, além de ser impotente de impulsionar a ação revolucionária das massas em seu proprio país, o Taleban e o Al Qaeda confiam que setores "nacionalistas" das burguesias árabes podem encabeçar uma luta para expulsar o imperialismo desta região. Nesta perspectiva de submissão, acabam por serem traídos por seus próprios "padrinhos" que quase sempre acabam por negociar com o imperialismo alguma vantagem econômica para seus próprios interesses de classe dominante nativa. Assim como Galtieri, Saddam Hussein, Milosevic capitularam vergonhosamente ao imperialismo e acabaram por cair sem luta (a exceção de Saddam Hussein, que deve ser o próximo alvo dos ianques), tudo indica que o Taleban segue na mesmo direção. Apesar do impasse político e provável colapso militar absoluto do Taleban, os revolucionários marxistas devem seguir com sua defesa incondicional militar da milícia taleban, frente aos ataques do imperialismo, levantando a consígnia de sua vitória na guerra, sem nenhum apoio político à sua estratégia de colaboração de classes com as burguesias nacionais e o imperialismo.

Mais uma vez, coloca-se com a clareza da história a necessidade da construção do partido da revolução proletária mundial, único instrumento capaz de dotar o proletariado de um programa radical antiimperialista e socialista, convocando a formação de conselhos operários e camponeses, organismos de poder político e militar das massas, única força política capaz de derrotar o imperialismo em sua sanha assassina contra os povos.


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