Crise INTERNACIONAL Crash capitalista mundial revela insolvência do Brasil Artigo extraído do JLO nº 30 (setembro/98)
Os primeiros sinais da mais profunda crise da economia capitalista mundial, desde a grande depressão de 29, ocorreram no México há 4 anos atrás, destruindo cerca de 80% das reservas cambiais daquele país, além de aumentar o déficit em transações correntes de sua economia em cerca de 10% do Produto Interno Bruto (PIB). Naquela ocasião, os apologistas do "mercado mundial" afirmaram que a crise era circunscrita à economia mexicana, fortemente influenciada por um gerenciamento estatal corrompido, e que as lutas fratricidas no interior do PRI teriam detonado o estopim da quebra do modelo adotado pela oligarquia mexicana, e que, portanto, o boom da economia americana continuaria a puxar o carrossel do capitalismo internacional sem maiores problemas. Passados três anos do "baque" mexicano, estouraram as economias dos chamados "tigres" asiáticos, antes, o modelo de ouro dos chamados países "emergentes". A explicação dos senhores do "mercado" do tipo do megainvestidor norte-americano, George Soros, foi a mesma dada na ocasião da crise mexicana, com alguns retoques de sofisticação geo-política, tratava-se de peculiaridades asiáticas, como a promiscuidade na relação entre contas públicas e privadas no caso da Malásia e Indonésia, ou mesmo da concentração oligopolística que ocorre na Coréia do Sul, com os chamados "chaebols". Poucos meses depois, é a vez da maior recessão da economia japonesa no período do pós-guerra. Novamente, os apologistas do capitalismo elaboram uma justificativa: foram os bancos japoneses que não tiveram cuidado ao emprestar dinheiro para empresas de saúde financeira duvidosa e, por isso, acumularam uma vultosa quantia irresgatável em créditos podres... Uma desculpa pouco convincente para avaliar a quebra da segunda economia mundial. Mas quando o crash capitalista mundial assola a incipiente economia recém restaurada do capitalismo da Rússia, provocando em uma única semana a perda de 20 bilhões de dólares, resgatados junto ao FMI, como última e desesperada medida para evitar o caos absoluto, os senhores do "mercado" passam quase de apologistas do vigor capitalista à condição de profetas do apocalipse mundial. É o próprio Milton Friedman, representante máximo dos "Chicago’s Boys", que define esta situação: "Existem várias semelhanças entre o mercado de 29 e o de hoje. Os dois são bolhas. Não tenho idéia das magnitudes de cada um, mas suspeito que a de hoje é maior" (Folha de São Paulo, 06/09/98). Também o grande ideólogo do triunfo final do capitalismo, Francis Fukuyama, em entrevista ao jornal The New York Times, admite que pode ter se "enganado" em sua tese, em função de que "a crise asiática poderá ampliar-se para uma depressão global". Fica evidente que o colapso do conjunto das economias nacionais, que neste momento começa a penetrar na América do Sul e nos EUA, é produto direto do esgotamento da pequena "onda larga" de crescimento capitalista que provocou alívio na economia norte-americana, entre 92 e 97, no sentido de recompor sua extraordinária dívida pública, que lastreia a esmagadora maioria dos títulos financeiros internacionais. O caráter do atual crash capitalista mundial, independente de cada peculiaridade regional, pode ser definido pela teoria marxista como uma crise internacional de super produção de bens e serviços, seguida de uma recessão generalizada em todos os mercados nacionais, agravada pela dependência dos países ao fluxo especulativo de ativos "virtuais" que tem a capacidade de hipervalorizar-se, ou desvalorizar-se, sem nenhuma contrapartida no sistema produtivo industrial. É a hegemonia do capital financeiro, em sua fase mais parasitária, que caracteriza a atual etapa da economia mundial. Os países capitalistas periféricos, que foram obrigados a financiar seu crescimento industrial, através da contração de créditos em títulos internacionais, acabaram por "criar" uma "bola de neve" especulativa mundial, contaminando hoje também os países capitalistas mais desenvolvidos, como o Japão e o bloco europeu. Hoje, a soma destes "ativos virtuais" não corresponde nem de longe ao conjunto das riquezas produzidas pela humanidade, gerando um efeito de bolha superinflada, que pode estourar a qualquer momento, devastando, em poucas operações de resgate destes "créditos", a mais sólida das economias nacionais, isto sem falar dos efeitos provocados nas economias dependentes, como a dos "tigres", da Rússia e da América do Sul. O FMI, criado logo após a II Guerra Mundial pelos países imperialistas, para normatizar o fluxo do capital financeiro em suas aplicações nos países dependentes, não consegue estabelecer nenhum controle institucional nesta "ponta" do negócio, restando-lhe a fiscalização das políticas monetárias aplicadas pelos governos nacionais, títeres do imperialismo ianque. A receita do FMI para estes países é sempre no sentido de resguardar a maior rentabilidade dos títulos financeiros internacionais, ou seja, aumento das taxas de juros pagas a estes e redução drástica do orçamento estatal, para não colocar em risco a capacidade pagadora dos tesouros nacionais. Quando um país se declara insolvente, o FMI simplesmente renegocia o prazo dos vencimentos dos resgates destes títulos, alongando-os até que haja capacidade financeira em honrá-los, evitando assim que sejam queimados sem nenhum valor de face, como "papel de lixo". A esta operação, o FMI qualifica como concessão de novos "empréstimos", aumentando ainda mais a dívida externa dos países atrasados. É como dar mais corda ao enforcado. Quanto ao controle da intensidade do fluxo migratório de capital especulativo, e sua respectiva contração pelos países atrasados, seja através das Bolsas de Valores, ou da compra de títulos públicos, este fica a cargo das próprias "forças naturais do mercado". O Congresso norte-americano recentemente vetou a injeção de 18 bilhões de dólares de cota ao FMI, exatamente porque sabe que esta "bolha" de títulos podres pode acabar estourando em seu próprio país. Plano Real: um paraíso para o capital financeiro O Brasil está em meio ao que se convencionou chamar de "ataque especulativo" internacional. A Bolsa de Valores de São Paulo acumula perda de 50% só neste ano. Suas reservas cambiais que estavam na marca de 70 bilhões de dólares não alcançam hoje a marca dos US$ 48 bilhões, uma perda de mais de US$ 20 bilhões em quinze dias. O fluxo de saídas diárias "estabilizou-se" em cerca de 1 bilhão de dólares por dia, após o anúncio de que o FMI e o governo norte-americano poderiam socorrer o Brasil em caso de uma "emergência". O rombo só não foi maior em função da elevação das taxas de juros a um patamar de 50% ao ano, pagos aos agiotas nacionais e internacionais, e 120% cobrados aos consumidores de empréstimos bancários e crediários comerciais. O capital financeiro está esperando a recondução de FHC a presidência para desfechar a maior rapinagem da história recente do país, onde provavelmente "zerará" o que ainda resta de reservas cambiais junto ao Banco Central. As conseqüências desta "operação financeira" para a economia nacional e para os trabalhadores serão desastrosas. O nível de desemprego poderá dobrar, com o aumento de falências e concordatas, em função da elevação brutal dos impostos e da taxa de juros. Por outro lado, os R$ 4 bilhões de cortes no orçamento, anunciados pelo governo são apenas a ponta do iceberg de uma completa deterioração nos serviços de educação, saúde, habitação... que virá na tentativa de redução do deficit público. A colocação do Brasil como a "bola da vez" de um ataque especulativo deve-se à imponência de sua economia nacional, atualmente em torno do 10º mercado mundial, e fundamentalmente ao "modelo" elaborado a partir da implantação do Plano Real. A tão alardeada defesa intransigente do Real e da estabilidade monetária por parte do governo, não está exclusivamente determinada pelo medo de perder votos na eleição, como muitos economistas de ‘esquerda" afirmam. A defesa da paridade cambial dólar/real e a conseqüente resistência em não desvalorizar nossa moeda parte, em primeiro lugar, dos interesses dos grandes capitalistas e especuladores imperialistas em conservar seus lucros no atual regime cambial. A passagem do Brasil de país historicamente superavitário em sua balança comercial a hiperdeficitário atualmente, corresponde a uma estratégia de inviabilizar as exportações nacionais em dois aspectos chaves: o primeiro, desregulamentando as importações, com isenção tarifária, quebrando quase completamente a indústria nacional, e o segundo e mais importante, a adoção da sobrevalorização cambial, sabotando os produtos nacionais no mercado mundial, em função do seu alto preço, atrelado ao Real. Só para se ter uma idéia da necessidade dos países exportadores de terem moedas competitivas, um dólar americano corresponde a 135 ienes japoneses. Caso o Japão sobrevalorizasse seu câmbio, sua economia simplesmente seria reduzida a pó. A falência das exportações brasileiras obrigam o país a depender exclusivamente de créditos financeiros internacionais para financiar seu gigantesco deficit público que, por sua vez, foi quadruplicado, no momento, em torno de R$ 360 bilhões, pela necessidade de queimar reservas nacionais para lastrear a paridade totalmente artificial. Os megainvestidores nacionais e internacionais, por sua vez, exigem a manutenção desta paridade, pois caso ocorra uma desvalorização, seus títulos aplicados na moeda Real, sob a guarda do Banco Central, sofreriam uma enorme perda. Portanto, a defesa do Real, tão anunciada como ato de patriotismo, não passa da defesa desavergonhada dos gigantescos lucros dos especuladores nacionais e internacionais, que trafegam seu "dinheiro virtual" pelo mundo, chantageando os governos lacaios como FHC para obterem rendimentos ainda maiores. Com um deficit recorrente em torno de 7% em sua conta de transações correntes (soma do resultado das balanças comerciais, dívida pública e pagamento dos juros), o Brasil é o centro das atenções do mercado mundial. Segundo os analistas financeiros, quando um país chega à marca dos 10% de deficit em transações correntes, caso do México em 94, entra em estado de insolvência, tendo a possibilidade de recorrer a uma moratória temporária de sua dívida externa e interna. A situação ainda é mais delicada pelo fato da economia brasileira ser o carro chefe do Mercosul e seus aliados, Chile e Bolívia. Um desastre brasileiro provocaria um efeito "caipirinha", derrubando a frágil economia de seus parceiros vizinhos. Saída para a crise não passa por criar um regime nacionalista burguês A esquerda frentepopulista, passando pelo PSTU e até grupos mais "radicais" têm apontado que a solução para a crise passa pela mudança do atual modelo econômico (voltado para as importações), com a adoção de um regime protecionista baseado na produção industrial nacional e uma agricultura direcionada às exportações. O candidato da frente popular, Lula, radicalizando seu discurso em função da crise, vem afirmando que, em caso de sua eleição, tomaria estas medidas, gerando a diminuição do desemprego e empurrando a burguesia nacional a retomar sua faixa do mercado perdida para o imperialismo. Acontece que já há muito tempo a burguesia nacional mostrou-se completamente impotente para erigir seu próprio modelo de desenvolvimento, independente do capital internacional. Por acaso já esqueceram que o Perón de hoje é o arqui-pró-imperialista Carlos Menem, ou que o MNR boliviano foi quem recentemente entregou todas as empresas do país ao capital norte-americano? Reviver o sonho do nacionalismo burguês é uma utopia reacionária que já custou muito sangue do proletariado mundial. As medidas que Lula propõe, longe de romperem a cadeia da especulação capitalista internacional, sequer defendendo o confisco e anulação de todos os títulos emitidos pelo tesouro nacional, hoje em mãos dos megaparasitas internacionais que os utilizam para obterem generosos rendimentos, representam a inútil tentativa de pressionar o imperialismo a regulamentar melhor o trânsito de capitais pelo mundo, uma espécie de novo Bretton Woods, deixando deste modo mais espaço para os mercados dos países "emergentes". Promessas desta natureza deram lugar à eleição dos sociais-democratas, Prodi, Blair e Jospin, que depois de eleitos seguem à risca a cartilha do imperialismo ianque. O PSTU insiste em estabelecer um chamado a Lula para que defendam conjuntamente o não pagamento das dívidas externa e interna, como fosse esta a pedra de toque do rompimento com o imperialismo. O PSTU só esquece de dizer que Yeltsin, seu antigo aliado político na destruição do Estado soviético, também deixou de pagar as dívidas, sem que isso trouxesse um mínimo de alívio ao famélico povo russo. Outros grupos, como a TPOR, insistem freneticamente na construção de uma "Frente Única Antiimperialista", procurando com a "lanterna de Diógenes" um setor da burguesia nacional disposta a aceitar esta aliança. O único rompimento possível com a ordem imperialista mundial (camuflada com o pseudônimo de "globalização") é a ruptura com o próprio modo de produção capitalista, através da revolução proletária, dirigida por um partido revolucionário. Só a reorganização socialista da economia mundial poderá livrar os países semicoloniais da barbárie absoluta. Nenhum governo burguês, social-democrata ou nacionalista, poderá conduzir seu país a um modelo econômico "alternativo", pelo simples fato deste "modelo" só existir nos sonhos reacionários dos reformistas. Cabe ao proletariado e seus aliados sociais, o campesinato e a população pobre oprimida, lutar sem tréguas contra o conjunto da burguesia nacional e o imperialismo, rumo a um governo operário e camponês em escala nacional e internacional. |
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