11º Encontro Nacional do Partido dos Trabalhadores Vítima de sua própria política: Artigo extraído do JLO nº 22 (setembro/97) O 11º Encontro Nacional do Partido dos Trabalhadores (PT), realizado de 29 a 31 de agosto, ocorreu em meio à crise no interior do partido, envolvendo a saída do governador Vítor Buaiz (ES) e da ex-prefeita Luiza Erundina (SP), tendo como motivação central a formação da Frente de Centro-esquerda para disputar as próximas eleições presidenciais. Inicialmente, o Encontro petista tinha dois pontos aparentemente polêmicos a serem discutidos. O principal era a política de alianças do partido para as eleições do próximo ano; o outro tratava da reformulação do estatuto, visando a extinção das tendências internas. Logo no início do Encontro foi realizado um acordo, por unanimidade, tirando uma comissão para formular a proposta de estatuto a ser apresentada no próximo Congresso, eliminando qualquer discussão sobre as tendências. No ponto sobre as alianças para as eleições de 98, foi aprovada, por 277 contra 242 votos, a política proposta pelo bloco formado pela Articulação, corrente de Lula e José Dirceu, e as correntes da chamada direita petista (Nova Democracia, do deputado Rui Falcão e Democracia Radical, do deputado José Genoíno Neto), de formar "amplas alianças" com os ditos setores "anti-neoliberais" da burguesia, envolvendo o PDT, setores do PMDB e PSDB, além de figuras reconhecidamente inimigas dos trabalhadores, como Itamar Franco, Sepúlveda Pertence, Sarney e Ciro Gomes. Demonstrando sua disposição de levar adiante o Real, os planos de ajuste do imperialismo, a reforma do Estado e a recolonização nacional, o PT aprova, em nível nacional, o alargamento ao máximo da frente popular, incluindo até setores do PSDB, principal artífice do imperialismo no governo. Vale ressaltar que esta política de amplas alianças com a burguesia foi aprovada com o aval da chamada esquerda do PT (O Trabalho, Democracia Socialista, Tendência Marxista, Força Socialista e Articulação de Esquerda) que, embora não tenha votado na mesma proposta da direita petista, defendeu a manutenção da carcomida política de alianças da própria Articulação, que significava a formação da tradicional Frente Popular com o PCdoB, PV, PPS e PSB, não oferecendo, inclusive, resistência ao ingresso do PDT nesta frente. Nenhuma das correntes chamadas "radicais" foi capaz de pronunciar uma palavra sequer contra a presença no Encontro, ou na frente praticamente estabelecida, a partir de então, do velho caudilho do nacionalismo burguês, Leonel Brizola, apoiador do governo Collor. "Amplas Alianças" com a Burguesia De fato, não existem diferenças fundamentais entre o que defendeu a Articulação e a "esquerda" petista. "Amplas alianças" com a burguesia, ou a frente popular tradicional ambas refletem apenas os diferentes ritmos de integração das tendências do partido ao regime. As duas propostas possuem o mesmo conteúdo: unidade com a burguesia. Como prova da ausência de qualquer polarização política no Encontro, a candidatura a presidente do partido, apresentada por unanimidade pela "esquerda", foi recrutada da direita da frente popular; ex-membro do PSB, e da própria Articulação, Milton Temer se autodefine como um "reformista revolucionário" (OESP, 29/09). Temer concorreu contra José Dirceu, da Articulação, reeleito presidente do partido com uma vantagem de apenas 17 votos. Até mesmo a proposta da Articulação de extinção das tendências, que era, antes de tudo, um instrumento de pressão sobre setores da "esquerda", não foi necessário ser utilizada graças à completa capitulação destas correntes que, em nome da unidade do partido, acataram servilmente as posições de "amplas alianças" com os grandes partidos burgueses, demonstrando claramente que, de fato, não passam de sustentáculos da política da "direita" petista. Durante todo o Encontro, esta "esquerda" clamava pelo lançamento da candidatura Lula. Resolução esta que seria postergada, temendo-se que o lançamento antecipado da candidatura petista pudesse comprometer a formação da frente de centro-esquerda, inviabilizando a política de alianças ora aprovada. No entanto, as articulações antecipadas de outras candidaturas obrigou o Diretório Nacional, em sua primeira reunião posterior ao Encontro, a apresentar o nome de Lula para encabeçar uma frente ampla de centro-esquerda. A posição da ‘esquerda’ do PT, avalizando a política de "amplas alianças" aprovada no Encontro, sob a alegativa da unidade em torno da candidatura Lula reflete, na verdade, sua total capitulação diante do setor majoritário, precisamente porque compartilha da mesma política de reforma do Estado burguês a partir de um governo com um programa democrático e popular, vendendo ilusões de que é possível conciliar os interesses de classe dos trabalhadores com os da burguesia. A candidatura Lula, apoiada entusiasticamente pela "esquerda" petista, seja por uma frente ampla de centro-esquerda ou não, representa a continuidade da colaboração de classes do PT. Afinal, o próprio Lula, incansavelmente, tenta aproximar em torno de seu nome para as eleições presidenciais, não apenas partidos do regime, mas figuras da burguesia nacional, como Antônio Ermírio de Morais, um dos maiores empresários do país, dono do grupo Votorantin, a quem já ofereceu um lugar em seu palanque durante a campanha presidencial. A Frente de Centro-Esquerda que o PT Pretende Construir As alianças do PT com partidos burgueses não são nenhuma novidade. No entanto, até as eleições de 92 a maioria de suas coligações foram com partidos secundários e marginais da burguesia (PDT, PSB, PPS, PV etc.). Em 1994, apesar da candidatura presidencial limitar-se à Frente Brasil Popular, o PT coligou-se com o PSDB na Bahia e chegou a ingressar em vários governos estaduais dirigidos por grandes partidos burgueses (AP, MT, inclusive no governo assassino de Valdir Raupp em RO). O que era exceção até 94, passou a ser regra a partir das eleições de 96, quando o partido ampliou suas coligações nas cidades do interior do país com os principais partidos burgueses (PMDB, PFL, PPB e PSDB). Essas alianças eram definidas em nível dos diretórios regionais e municipais, onde era mais fácil disfarçar a corrupção política. A política de alianças aprovada no seu 11º Encontro é um marco da completa integração do PT ao regime, consolidando sua posição de defensor da ordem burguesa. A frente de centro-esquerda que pretende encabeçar não passa de mais uma tentativa de credenciar-se junto ao imperialismo e à burguesia nacional como uma alternativa viável de gerenciamento dos interesses do grande capital. Não por acaso, as figuras políticas que hoje o PT reivindica como seus aliados, já estiveram à frente da gestão dos planos do imperialismo no país. Sarney, que chefiou o governo de transição da ditadura militar, durante o qual ordenou, entre outros crimes, a intervenção da CSN (RJ) pelo Exército, assassinando três operários para sufocar a greve dos metalúrgicos em 88 e também a chacina de Serra Pelada (PA), em 87, onde foram mortos mais de 100 pessoas, além de ser um dos principais representantes da oligarquia nordestina. Já Itamar Franco privatizou a CSN, a USIMINAS e implantou o Plano Real, criando as condições para acelerar o processo de recolonização do país, dentre os quais se inclui a própria eleição de FHC em 1994. Ou mesmo Ciro Gomes, que por duas vezes assumiu cargos de alta relevância dentro do Estado burguês onde aplicou na íntegra os planos de recolonização imperialistas, como governador do Ceará e Ministro da Fazenda. Apesar disso, estes senhores são considerados pelo PT como "expressões nacionalistas antineoliberais"! Se já era uma traição formar frentes com os setores marginais da burguesia, desarmando os trabalhadores, minando seu espírito combativo, boicotando suas lutas e expondo-lhes aos ataques dos patrões, é uma traição ainda maior aliar-se aos setores com ampla folha de serviços prestados ao imperialismo. PT, Vítima de sua Própria Política O PT iniciou seu Encontro já com dificuldades de compor um campo de alianças de centro-esquerda, não por divergências internas, mas pelo recuo de seus possíveis aliados após a vitória governista, com a aprovação do projeto de reeleição, e diante do consenso formado entre os setores da burguesia mais diretamente vinculados ao imperialismo em torno da continuidade do governo FHC. Por outro lado, existe o fato de que o Plano Real não se encontrará completamente esgotado até as eleições de 98, tendo em vista que ainda existem reservas cambiais suficientes para manter artificialmente a paridade dólar-real. Além disso, o governo dispõe de um considerável potencial de privatizações que pretende realizar até meados de 98, como forma de não comprometer as reservas cambiais, utilizando essas privatizações para abater parte da dívida pública, como é o filão das telecomunicações. Mas o fator que, combinado aos demais, melhor favorece à reeleição de FHC é a completa ausência do movimento operário do cenário nacional devido à política criminosa de suas atuais direções que têm deliberadamente se negado a mobilizar os trabalhadores para combater os ataques do governo. Desde as greves dos petroleiros e servidores públicos, passando pelo acordo da Previdência, privatização da Vale do Rio Doce, até a quebra da estabilidade, os trabalhadores sofreram sucessivas punhaladas da burocracia cutista dirigida pelo PT. Enquanto isso, os governos petistas de Vítor Buaiz e Cristóvam Buarque se apresentam como modelos de privatizações e de repressão às greves dos servidores e ocupações de terrenos pelos sem-tetos (Favela Estrutural). Até mesmo nos momentos de maior crise do governo, como no caso do escândalo da compra de votos para a reeleição de FHC, o Partido dos Trabalhadores colocou-se na defensiva, sendo chantageado pela própria política de defesa da ética burguesa com as denúncias do caso CPEM. Não só os servidores públicos que estão há mais de três anos sem receber um aumento e sob intenso arrocho salarial, foram vítimas de traições. Devido a esta mesma paralisia das direções, os trabalhadores do setor privado estão passando por uma das maiores ondas de demissões e ataques às suas conquistas. Contando com a conivência de seus aliados da Frente Popular, os governos capitalistas avançam sobre as condições de vida das massas, chegando ao genocídio de dezenas de camponeses pobres. Em Corumbira, com sete secretários petistas no governo Valdir Raupp (PMDB), ou em Eldorado dos Carajás, onde Almir Gabriel (PSDB) é assessorado pelo PCdoB e PPS, a cumplicidade da esquerda nos massacres foi a mesma. Como subproduto de sua integração ao regime, o 11º Encontro do PT foi marcado por um período em que o partido atravessava a maior sangria desatada de suas figuras públicas para a direita, migrando do PT em direção a setores da frente popular, aos partidos patronais e ao próprio governo FHC. Por sinal, como marco inaugural do comprometimento do PT com a estabiliade do futuro governo tucano e do plano Real, a primeira notável migração foi de um dos principais coordenadores da campanha de Lula em 94, direto para o Ministério da Cultura de FHC. Depois de Weffort, foi uma revoada de petistas ‘engajados’ em administrações de partidos patronais, arrastando consigo seus gabinetes e aparatos inteiros, como o vice-governador do Amapá, os grupos de petistas no governo Dante (MT), o ex-prefeito Darci Accorsi em Goiânia, os secretários petistas do governo Valdir Raupp (RO). Mas não parou por aí, a debandada mais recente incluiu Vítor Buaiz e seu grupo (ES), o ex-prefeito de Diadema, José Augusto com mais de 200 sindicalistas ligados ao partido no ABC, e a ex-prefeita de São Paulo, Luiza Erundina. A burguesia, que se utiliza da frente popular como último recurso diante do ascenso do movimento operário, costuma desprezar estes fiéis escudeiros em tempos de calmaria. O PT tudo faz para mostrar-se confiável aos olhos do imperialismo e da burguesia nacional. Mas, como sua serventia está vinculada ao controle que exerce sobre as organizações de massas do movimento operário, uma vez que ele consegue (por meio da burocratização, dos acordos patronais, do aborto das greves, etc) o refluxo do movimento, já se faz novamente desnecessário. Pior ainda é quando este partido não esboça qualquer iniciativa política diante do governo FHC, contribuindo para a sua estabilidade, e se desprestigia ao ponto do próprio PT ser uma força centrífuga de seus quadros, que demonstram "não ter medo de ser feliz", logo num partido genuinamente patronal. Este tem sido um dos principais frutos podres que o partido tem colhido como resultado de sua aproximação com o Estado. Numa perspectiva de relativa estabilidade do governo, figuras proeminentes da burguesia, como Sarney, Ciro Gomes e Itamar não se dispõem a apostar as suas fichas na formação de uma frente de centro-esquerda encabeçada por Lula, porque não valeria a pena arriscar-se numa aliança, sem chances de vitória, onde estariam simplesmente fortalecendo o PT para as eleições de 2002. A imensa capitulação do PT à burguesia volta-se contra os seus próprios planos eleitorais, deixando-o cada vez mais distante de chegar ao Planalto. Candidatura Ciro: os Tucanos se apropriam da Idéia de Frente de Centro-esquerda do PT Logo após o Encontro petista, foi Ciro Gomes quem ressurgiu com toda a força da mídia, propondo sua candidatura, como instrumento de aglutinação de uma frente de centro-esquerda. Inicialmente, Ciro acenou para o PSB, condicionando seu ingresso no partido de Miguel Arraes à garantia de que seria o candidato de uma frente de centro-esquerda da qual só não participariam o PT e o PDT. Na verdade, embora queira parecer um candidato de oposição, Ciro vem agindo como escudeiro da política de FHC. Seu objetivo é quebrar a unidade da própria frente popular, não apenas para facilitar a reeleição de FHC em 98, mas inclusive, para surgir no cenário nacional como opção para as eleições de 2002, quando, diante do esgotamento do Plano Real, o país se encontrará mergulhado em uma crise semelhante a que assolou o México e os países asiáticos. Por este motivo, é que, mesmo estando às vésperas de sua saída do PSDB, Ciro continuava discutindo o seu futuro no partido com os principais líderes tucanos. Tasso Jereissati assegurou que "ele pode perfeitamente ser o candidato em 2002" (FSP, 17/9). A candidatura laranja de Ciro é uma criação do próprio PSDB, que visa tirar votos de Lula. Não é por acaso que toda a imprensa burguesa comprometida com o governo FHC tratou logo de dar bastante destaque, inflando esta candidatura que se hospeda em um partido governista de aluguel, o PPS, defende o Plano Real sem FHC e, aparentemente, não possui nenhum bloco de sustentação. Na atual conjuntura, apenas um mês após a realização de seu Encontro, do qual se dizia ter saído fortalecido para impulsionar uma frente de centro-esquerda em torno da candidatura Lula, o PT amarga profundas derrotas em conseqüência da aplicação de sua própria política. Além de não conseguir capitalizar o apoio de amplos setores burgueses descontentes com o governo, o PT ainda perde a influência sobre alguns partidos da frente popular — PSB, PCdoB — que discutem com várias alternativas de candidaturas, e o próprio PPS, que abraçou a candidatura de Ciro Gomes, que não passa de uma jogada do próprio Planalto para enfraquecer a oposição a FHC. O PSB, por exemplo, saindo fortalecido nas eleições de 96, tentou, através de Ciro, alçar-se à condição de centro de força da frente popular. No balanço da LBI sobre as últimas eleições municipais de 96, já havíamos ressaltado essa tendência : "a trilha cada vez mais à direita do PT fez com que, nestas eleições, dentro da própria frente popular, partidos até então insignificantes e verdadeiras sombras do petismo ganhem força. O PSB foi efetivamente quem mais cresceu na chamada esquerda, apesar do péssimo desempenho de Roberto Freire (PPS) em Recife, apoiado pelo governador ‘socialista’ Miguel Arraes. O PSB, com a vitória quase certa em Belo Horizonte, assumindo o controle de Diadema e ganhando novamente em Volta Redonda, além de ir para o segundo turno em Manaus e disputar com o próprio PT em capitais como Natal e Maceió, passa de sua condição anterior de um enfeite de bolo frente-populista, a ter um papel de peso na dinâmica da próxima candidatura presidencial da Frente Popular em 98, inclusive influenciando diretamente quem será a cabeça da chamada aliança de centro-esquerda que está sendo costurada por Dirceu, Tarso Genro, Arraes, Itamar e Ciro Gomes" (JLO nº14, Outubro/96). Portanto, é importante destacar que esse partido secundário da burguesia não ganhou força com seus próprios méritos. O cadáver ambulante do partido de Miguel Arraes vem ganhando impulso graças ao crescimento à direita da frente popular impulsionada pelo PT. Todo este curso irreversível do PT rumo à sua integração ao Estado burguês conta com a cumplicidade plena da chamada ala "radical" petista, que possui na essência a mesma política dos setores majoritários do partido: aliança com a burguesia, governo democrático e popular, programa pró-imperialista, etc. Um bom exemplo é a prefeitura de Porto Alegre, administrada por Raul Pont, ligado à tendência de "esquerda" Democracia Socialista, que leva adiante em seu governo a mesma política de arrocho, ataque aos trabalhadores, sucateamento dos serviços públicos (transportes) em benefício das empresas privadas, e todo o restante da cartilha patronal levada adiante pelas demais administrações petistas. A vanguarda combativa dos trabalhadores deve romper com a política de traição do PT e construir um partido revolucionário, que tenha como princípio a independência política dos trabalhadores e aposte na mobilizações de todos os explorados como única forma de garantir suas reivindicações. Esta é a maneira conseqüente de combater a integração cada vez maior do PT ao Estado burguês. |
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