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Breve Visão da Homeopatia por um Químico 

Joe Schwarcz, Ph.D.

Tenho um problema com a homeopatia. Para aceitar seus princípios, devo deixar de lado a compreensão de química que desenvolvi por mais de 30 anos. A terapia baseada em moléculas inexistentes simplesmente não se encaixa no modelo. Mas evidentemente não posso concluir que a homeopatia não funciona apenas porque seu mecanismo de ação proposto é inaceitável a visão científica atual. Afinal, uma vez foi amplamente acreditado que devido à curvatura da Terra, transmissão de rádio ao redor do Atlântico nunca seria possível porque as ondas de rádio viajam em linhas retas. Então foi acidentalmente descoberto que estas ondas saltam para fora da atmosfera. Entretanto, antes de reconsiderar nossas teorias sobre moléculas, temos de investigar se a homeopatia realmente funciona. 

O pai da homeopatia, Samuel Hahnemann, foi treinado na medicina padrão de seus dias e começou a praticar na Alemanha no final do século dezoito. Ele rapidamente se decepcionou com os tratamentos que tinha aprendido. Sangrias, sanguessugas, taças de sucção, purgantes e pós arsênicos pareciam trazer mais danos do que benefícios. Hahnemann passou a ignorar seu treinamento e a prescrever um regime que na época foi bastante revolucionário: ar fresco, higiene pessoal, exercícios, e uma dieta nutritiva. Uma vez que havia pouca chance de ganhar a vida simplesmente recomendando este regime, ele suplementou sua renda usando sua fluência em oito idiomas: ele passou a traduzir textos médicos. Enquanto trabalhava em uma dessas traduções, ele encontrou uma explicação do porquê a quinina supostamente curava a malária -- a substância fortificava o estômago. 

Intrigado, Hahnemann tomou ele mesmo quinina para ver se ela realmente tinha esse efeito. Não tinha, mas logo ele sentiu-se febril: seu pulso disparou, suas extremidades se tornaram frias, sua cabeça pulsava. Como esses sintomas eram exatamente iguais aos da malária, ele pensou que a quinina curava a malária porque febre cura febre. Em outras palavras, "igual cura igual". A homeopatia, que vem do grego 'homoios' (igual) e 'pathos' (sofrimento), nasceu. 

Hahnemann prosseguiu, e começou a testar sistematicamente os efeitos de uma grande variedade de substâncias naturais em pessoas saudáveis. Tais "provas" o levou a concluir que a beladona, por exemplo, podia ser usada para tratar inflamação de garganta porque ela causava constrição da garganta em pessoas saudáveis. Porém a beladona é um veneno clássico. Dessa forma a homeopatia seria perigosa? De jeito nenhum. Hahnemann teve outra idéia. Ele especulou que quanto menor a dose de uma dada substância, mais eficaz ela seria em estimular a "força vital" do organismo para repelir a doença. Então reduziu as doses prescritas através de diluições repetidas dos extratos originais. 

As diluições foram extremas. Hahnemann não se incomodou com o fato de que em altas diluições, nada da substância original permaneceria. Ele alegou que o poder da solução curativa não vinha da presença de um ingrediente ativo mas do fato de que a substância original tinha, de algum modo, impressa a si mesma na solução. Em outras palavras, a água na solução diluída de algum modo "lembra-se" do material que tinha sido dissolvido nela várias diluições atrás. Esse processo de impressão tinha que ser conduzido com muito cuidado, uma simples diluição da solução não era suficiente. O frasco tinha que ser batido contra um travesseiro especial de couro um número fixo de vezes de modo a ser "dinamizado". 

Os médicos da corrente principal não aceitaram prontamente esses ritos peculiares. De fato, a Associação Médica Americana foi formada em 1846 em grande parte como uma reação à homeopatia, um dos objetivos de sua fundação era livrar a profissão dos homeopatas. Às vezes, as críticas severas da associação se tornaram absurdas. Um médico de Connecticut perdeu sua licença de médico por consultar um homeopata -- que na verdade era sua esposa. 

Todavia, a homeopatia não desapareceu e seus defensores alegremente apontam para estudos em periódicos científicos peer-reviewed que parecem mostrar benefício. Mas espere um minuto. Uma revisão cuidadosa desses estudos produz resultados inexpressivos. No tratamento de alguns distúrbios menores, a homeopatia tem sido relatada como ligeiramente mais eficaz que um placebo, mas isso não tem nenhuma implicação prática; simplesmente atrai interesse acadêmico. Como pode haver algum resultado positivo no todo quando não há nenhum ingrediente ativo? Viés de publicação é uma explicação. É mais provável que "estudos positivos" sejam publicados do que estudos negativos. Se um número suficiente de estudos é conduzido, cedo ou tarde algum terá que mostrar resultados positivos baseado na lei das médias. Publicar estes enquanto se mantêm em silêncio sobre achados negativos pode criar a ilusão de eficácia. 

Diversas revisões extensas da pesquisa homeopática foram publicadas, algumas feitas por proponentes e algumas por críticos. Todos concordam que não se provou claramente eficácia da homeopatia para qualquer condição clínica. Uma análise detalhada da pesquisa homeopática será publicada no HomeoWatch dentro dos próximos meses. 

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Dr. Schwarcz é diretor do McGill University's Office for Chemistry and Society. Além de lecionar química na McGill, ele comanda um programa semanal com ligações telefônicas sobre química na estação de rádio CJAD de Montreal (Canadá), escreve uma coluna semanal chamada "The Right Chemistry" na Montreal Gazette, e tem um programa regular de TV chamado "Joe's Chemistry Set" na Discovery Channel canadense. Seus livros Radar, Hula Hoops and Playful Pigs e The Genie in the Bottle destacam comentários sobre a fascinante química da vida diária. 

 

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Artigo publicado em 24 de fevereiro de 2002.

Tradução: Gilson C. Santos
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