Prof. Anderson Soares André
Preservando a História de Pindotiba
Aqui vamos contar a História de Pindotiba, um Distrito do Município de Orleans, localizado no sul do estado de Santa Catarina.
Depois da desastrosa enchente de 1974, para proteger a cidade de Tubarão, pensou-se em levantar um conjunto de represas no Rio Tubarão e seus afluentes. Pindotiba seria a localidade que deveria desaparecer, inundada pelas águas. Ainda ouve-se falar sobre os projetos, e a nuvem da incerteza ainda paira sobre a mais que centenária povoação, porém as chances disto ocorrer, agora são pequenas. Naquela época, o desestímulo foi grande. Afinal, projetos de Governo, às vezes são realizados!
Diante da possibilidade de sumir dos mapas é que deve ser compromisso de todos dar-lhe um lugar seguro na história. Não deve desaparecer da memória o berço de tanta gente ilustre.
Com este pensamento foi feito um estudo aprofundado sobre este distrito no livro do Padre João Leonir Dall'Alba. Até os anos de 1870, a região era apenas parte do imenso sertão de Laguna, todo em matas, entregue ao povo caçador dos índios botocudos. Por esses anos, abre-se por aqui nova estrada para tropas, alternativa para a estrada dos Conventos. Laguna não se conformara em ver-se fora da rota desta importante e primeira via terrestre de comunicação com o centro do país. Às custas da Câmara, mandou, então, abrir, pelos morros que margeiam o Rio Tubarão, estradas de tropas que escalava a alcandorada Serra Geral nas cabeceiras do Rio Oratório.
Pela margem direita do rio corria a sesmaria dos Pacheco dos Reis, desde 1808. A margem esquerda, onde está situada Pindotiba, só foi ocupada por volta de 1840 pelas sesmarias dos Rabelo e dos Miranda, esta na Barra do Norte.
Pela estrada da Serra do Oratório passavam os tropeiros que abasteciam a cidade de Lages e todo o movimento comercial com os Campos de Cima da Serra, até Curitibanos.
Talvez ainda na primeira metade do século XIX abriu-se nova Serra e nova estrada, esta pela Serra do Imaruí, nome que foi atribuído quase na certeza por tratar-se de estrada de tropas que contornava a lagoa e passava em Imaruí.
A estrada do Oratório conservou sua importância por ser a mais curta e porque, às margens foram localizadas as primeiras minas de carvão do Brasil. Muitos exploradores a palmilharam, especialmente o Dr. Parigot com sua equipe de soldados mineiros. Este passou por ali em 1840, levando, na volta, os cargueiros abarrotados de amostras do minério escavado, e a decisão de logo abrir as minas.
Em 1854 passa por ali o viajante francês Avé Lallemand, deixando-nos preciosa descrição, publicada no livro "Laguna antes de 1880". Por ele sabemos que o último morador, antes de se entrar nos domínios dos bugres, estava estabelecido na imediações da atual Pindotiba, região conhecida na época com o nome de Raposa. A velha estrada de tropas nunca chegava muito perto do rio, preferindo às planuras, as rampas dos morros.
Como em toda estrada percorrida por tropeiros, falava-se de muito dinheiro enterrado por ali. O serrano vendia a tropa em Laguna, enchia a guaiaca ou mesmo os peçuelos. Sem bancos para guardar em segurança as patacas de prata, escondia esses cobres suados nas margens da estrada. Mais tarde, quando viesse sem peões, recolheria o guardado. Depois acontecia o assalto de índios, a traição dos companheiros, e o serrano rico era morto. O dinherio ficava por aí.
Através dos dados que se dispõe, acredita-se que os primeiros moradores teriam se estabelecido na Raposa (Pindotiba) em 1870: André Paguin, Manuel Bernardo, Pedro Bernardo, Paulino Barbosa, Clemente Pereira da Silva, Delfino Adrino de Freitas, Octacílio Costa, André Barbosa e outros.
Conta-se que os filhos do sesmeiro Miranda foram dilapidando seu imenso patrimônio de terras que era limitado pelo Tubarão e o Rio Belo, na periferia de Orleans, cortando pela linha que passa na estrada do Museu ao Ar Livre, até a serraria, onde tomava a direção Norte-Sul, até o rio novamente. Apreciadores da carne e da cachaça, os Miranda foram dando terrenos, em troca de bois ou para pagar despesas nas bodegas. Um dos últimos desta geração viveu pobre até por volta de 1930, à beira da estrada de ferro, no lugar que tomou seu nome, Paredão do Miranda.
Muitos dados foram fornecidos por Valentim Pereira da Silva, de 1921, casado com Maria Dalponte. Os antepassados dele eram da Bahia e vieram estabelecer-se na praia de Encantado, perto de Garopaba. Tinham escravos. O avô era Clemente Pereira da Silva. Com os irmãos Albino e Francisco, o pai comprou, por sei contos de réis, um terreno de 200 braças de frente por 3.000 de fundo, na linha Torrens.
Logo chegaram os imigrantes que tinham seu armazém na Linha Pacheco. Aqui chegaram por primeiro os Freitas, Delfino Adriano de Freitas. Otacílio Costa veio da Estiva. Bernardo Peron, os Tomé, Mafra Barbosa, compraram terras na sesmaria dos Miranda. O velho Miranda era caçador de índios e andava sempre trabucudo, porque, dizia, precisava se cuidar dos bugres. Delfino Adriano de Freitas construiu uma casa ainda existente, datada de 1897. Alvim Nunes era político, getulista, chefe dos revolucionários locais de 1930. Até 1927 não havia negros.
Depois chegou a família de Zacarias Rosa, com 12 filhos, a família de Pedro Flor com 15 filhos, a família de Manuel Flor, também numerosa. Rio abaixo, no Canudo, outrora havia muitos valentões: Manuel Tomaz da Penha, Manuel Thomaz Canudo, Manuel Tomaz Garancho, Manuel Tomaz Testudo...
Diversos foram os nomes com que se conheceu a região que fazia parte do "Sertão dos Bugres Brabos": Raposa, Canudo, Pinguirito, Palmeiras e finalmente Pindotiba, lugar de muitas palmeiras, na língua dos primitivos.
Outras localidades próximas: Taperinha, Repuxo, Paredão do Miranda, Rio Coral, Morro do Gato, Taipa, São Defende e Linha Pacheco.
Pindotiba está localizada ao pé do Morro do Gato, á margem esquerda do Rio Tubarão, entre as cidades de Pedras Grandes e Orleans.
A primeira igreja de Pindotiba era de palha, construída por Adriano de Freitas. Néco André doou a palha para a segunda capela. A terceira foi construída pela comunidade, já de alvenaria. Era pequena e mais tarde precisou ser emendada. Finalmente, uma ampla igreja foi construída, também pela comunidade. Quero lembrar aqui que muitos dos moradores ainda hoje discordam deste ato, julgando a antiga igreja suficientemente grande e muito mais bonita que a atual.
Festa tradicional da igreja é a de Nossa Senhora Aparecida, a padroeira. Antigamente, nestas festas, enfeitava-se as proximidades da igreja com arcos de bambú, flores, etc.
Depois das celebrações religiosas havia baile, animado antigamente pelo gaiteiro Salvato. Nesses bailes cada par só podia dançar duas marcas. Depois trocavam-se os parceiros. Hoje em dia (2007) a festa não costuma contar com um público apreciável.
Os bailes muitas vezes são evitados porque muitas vezes acabam em confusão. A festa que vinha se destacando nos últimos anos era a festa junina promovida pela Escola Básica José Antunes Mattos, enquanto Antonio Dias André era diretor da mesma. Ainda com relação à escola, dentre outras pessoas importantes que também deixaram para sempre suas marcas pelo trabalho desenvolvido, podemos citar Maria Soares André, professora e diretora por muitos anos, Maria Salete Pignatel, Maria de Lourdes Dalsasso, Maria Leny Soares que trabalharam como professoras e secretárias durante muito tempo.
O sr. Jaime Dalsasso, hoje já falecido, foi por muito tempo professor de educação física da escola. Por fim, porém não menos importante, Antonio Dias André, que também foi professor de educação física e diretor, que deixou um importante legado. Também foi vereador por dois mandatos.
Dizem que a vida dos jovens era muito divertida. Realizavam-se piquenique, sempre por volta de 1925. Era a turma da Diba Costa, Laura Soares, Lucilia Soares, Peron, Francioni, Santino Soares, Pedro Soares, Batista e Heitor Nunes entre outro, como Diomício Freitas, que se tornou muito importante, sendo um dos homens mais ricos de Criciúma.
Os moradores baseavam sua economia no plantio de mandioca, algodão, anil, milho, feijão batata doce e cana-de-açúcar. Existiam engenhos de farinha e de açúcar. Havia também serraria, onde inicialmente, a madeira era serrada a mão. Hoje em dia, infelizmente, quase todos estes antigos produtos desapareceram ou mal sobrevivem, tendo sido substituídos pelo fumo.
Com relação as casas de comércio do passado, podemos citar: Sapataria de Jacó Mendes (1925); Sapataria de Bernardo Peron (1927), que também tinha curtume e loja. Depois, a casa Arcângelo Campos; loja de Otacílio Costa (1922 a 197). Por volta de 1915 Rômulo Sandrini mantinha um grande moinho de farinha e administrava a Cooperativa Agrícola. Houve também a torrefação de café de Pedro Furlan, marcenaria e loja de Rodolfo Westpal; armazém de Salvato Bitencourt, onde já funcionou a escola; padaria de Lourenço Cadorin; padaria de Liberato Martins, o qual também era fotógrafo; o hotel de Rodolfo Zapellini e o hotel de Antônio Mendes.
Otávio Dalsasso trabalho aqui nos anos de 1919 a 1921 na Cooperativa do Armazém, que era composta por 140 agricultores e comerciava banha, carne suína, arroz, feijão, farinha, produtos que vinham de Criciúma, Treviso, Belluno, Meleiro, Nova Veneza, Urussanga, afinal de toda a extensa colônia italiana.
As estações ferroviárias estavam situadas na margem oposta do rio, precisando de balsa para atravessar as longas filas de carros de bois que vinham chiando até os armazéns. Todos sábado e domingo eram carregados de dez a doze vagões de mercadorias variadas.
A produção era grande. Um dos primeiros proprietários de balsa foi o Sr. Secondo Catâneo. Cada colônia tinha seus próprios carreteiros que traziam os produtos agrícolas e levavam os manufaturados. O ramal da estrada de ferro para Criciúma, Urussanga e Belluno de Pindotiba o burburinho imenso de entreposto comercial das colônias italianas. Passou a viver da agricultura, plantando milho, feijão e mandioca em grande escala e outros produtos mais para consumo caseiro.
Por volta de 1920 havia muitos engenhos de farinha, duas ferrarias, uma fábrica de gasosa, uma fábrica de móveis de Satiro Victorino Soares, olaria, artefatos de barro e artesanato. Em 1938 a companhia Itajaiense de Fósforo implantou uma fábrica de goma. A torrefação e moagem de café de Pedro Furlan, passou a Tomé Silveira e depois a Francisco Costa. Os engenhos que restavam, na sua maioria, foram destruídos na enchente de 1974.
A invasão do fumo, arrasando as culturas agrícolas tradicionais, sufocou também um imenso patrimônio da cultura popular. Não, ninguém ficara rico com a agricultura, devido a falta de grandes centros consumidores. Por volta de 1925 havia o cartório de Marcolin Dalêncio. Nos últimos anos o cartório da cidade passou para as mãos da família Campos. Os armazéns eram intermediários de todos os produtos transportados pela ferrovia.
Dentista aqui, por muitos anos, foi Quintino Fernandes. Depois dele alguns passaram, mas todos por pouco tempo. Atualmente este tipo de recurso é encontrado no pequeno posto de saúde instalado na cidade.
Aparício Freitas, aqui nasceu em 1902 e prestou muitos dos depoimentos que ajudaram na confecção deste documento, mas agora, em 1999, já é falecido. Aparício herdou muitas terras dos pais, adquiriu outras e construiu seu casarão em 1943.
Diomício Freitas, filho de Delfino Adriano de Freitas, que teve importante carreira política e se distinguiu por um verdadeiro império econômico, que incluía a fábrica de azulejos CECRISA, fazendas, minas de carvão, rádio e rede de TV. Nasceu e viveu sua juventude em Pindotiba. Foi funcionário da estrada de ferro, vendedor de passagens e despachante. Quando foi demitido da estrada de ferro, começou a negociar caminhões. Ganhou muito dinheiro durante a guerra. Comprou a mineração Esplanada de Içara, onde começou a grande expansão.
Outro grande filho da terra é o escritor Mário Linário Leal, que nasceu em 5 de dezembro de 1924. Formou-se advogado, professor, escritor e poeta.
João Vitorino Soares doou os fundamentos do Grupo Escolar, que levou seu nome até a fundação da Escola Básica. João Vitorino era mestre de linha de estrada de ferro, entre Tubarão e Lauro Müller. Seu cargo era dos mais altos na Rede Ferroviária Federal. Muita gente trabalhou na Estrada de Ferro: João Vitorino Soares, Gustavo Jorge, João Firmino André, Sebastião André Barbosa, José Abel Rodrigues Madalena, José Pedro Freitas, Acácio João Inácio, Santos Fernandes, Valentim Pereira, Pedro Acácio e Odílio Soares, dentre muitos outros, cujos nomes não disponho no momento.
Na conservação da Estrada de Ferro, além do mestre de linha havia um feitor com oito homens para cada oito quilômetros. Seu Valentim Pereira era maquinista de trole a motor. Havia vários tipos: trole a vara, trole zigue-zague, trole de três roda. O ramal da Estrada de Ferro para o Sul, de início fora planejado para continuar por Lauro Müller, Treviso, Nova Veneza,... A importância de Pindotiba teria crescido se os planos para a Estrada de Ferro fossem concretizados. A estrada de ferro, com a parada da Caixa D'água, com a parada local, trem cargueiro, trem de passageiro, trem misto, viagens baratas, demoradas....
Provavelmente o trem apitou pela última vez antes de 24 de março de 1974. Mas quem ouviu? A enchente arrancou pontes, destruiu trilhos... Depois disto, a decisão foi não mais retomar os serviços da Estrada de Ferro na região. Muitas das pessoas que viram o trem passando por Pindotiba, dizem que sentem-se tristes quando lembram do trem:
"O Trem era uma coisa da gente, do povo, do povo pobre. Era bonito ver aquela poderosa nuvem branca de vapor que logo se diluía. E como era solene aquela buzina forte ecoando pelo vale todo. Não mais!! Nunca mais!!
"Pindotiba, a vila pacata, com as tropas, com o carro de boi, com o trem, com os engenhos, com a cultura, com o passado... Até os nome passando! Passará também Pindotiba? Passaremos de barco por sobre a praça , o cemitério, a igreja e as casas de muitos de nós? Brincadeira? Não. O ícubo da povoação. Pindotiba Passará? Que não Passe nunca!"
Superstições e Fatos Estranhos Contam os mais velhos, que em Pindotiba aconteceram fatos estranhos. Houve um bicho que atormentou o distrito, era um guará. Aparecia no Canudo. Quanto mais homens o enfrentassem, mais embrabava. Quanto mais atiravam, mais o fogo se voltava contra eles. Um outro bicho, homem peludo, aparecia assustando todo mundo. Lobisomem e Caipora também diziam haver...
Seu Pedro Acácio, hoje já falecido, contava que em certa época via uma luz sair de um engenho. A luz saia e descia para a baixadinha. Quando desmancharam o engenho encontraram lá um pote com moedas.
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e-mail: pindotiba@hotmail.com
Atualizado em 10/02/2007
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