terça-feira — 15.8.2000

22:02 16-08-2000

Partir do Brasil não foi assim tão ruim. All in all, o coração já não batia tão forte, era mais uma viagem. Mais uma (eu continuava a querer me enganar), só mais uma.

Pula-se a parte do vôo. Quem, em sã consciência quer saber o que eu comi ou se dormi bem? Só os portugueses, por educação, perguntaram, mas não havia intenção outra que não a simpatia. Talvez um detalhe que adicionasse emoção ao relato como uma turbulência, ou uma ocorrência mais picaresca como alguém vomitando fosse interessante mas, serei honesto, parafraseando Edu K: It´s fucking boring to death!

Chavões têm força, não há como negar, e um sólido «Terra à vista!» atinge-me em cheio quando avisto, após as nove horas e tantos minutos, algo que acho ser o Palácio Fronteira. «Não sinhoire — corrige-me o português que se mantivera calado a viagem toda —, ali fica Sintra, Lisboa é mais à direita.» Pois sim, meu caro, logo em seguida aparece a Torre de Belém (confirmada pelo já então loquaz lusitano) e eu tenho certeza: estou.

«Estou», inclusive, que é como se atende ao telefone por aqui. Nada do «está lá?» Quem atende diz «estou». Quem liga, quando não entende, ou quando um brasileiro desavisado atende falando «alô?», diz «está?»

Quase não me deixam entrar. Acho que estava com cara de pirralho, ou com cara de safado — difícil dizer. O que é fato é a bateria de perguntas e a exigência que mostrasse meus cartões internacionais. Quando fui a New York não fui interrogado assim. Ao apresentar o cartão do Terra, como prova de que eu tenho emprego no Brasil (e que «trabalho lá há quatro anos, vejam, sou até Gerente!»), o oficial me pergunta se eu trabalho para as Nações Unidas. Precisei de esforço para não rir ao explicar que era apenas o nome do prédio. Talvez devesse ter entrado na brincadeira. Quem sabe não partia com batedores à frente do carro.

Fico por enquanto (um enquanto que pode equivaler a seis meses) num flat à rua Rodrigo da Fonsecaveja foto. Acalmem-se pois este não é um endereço definitivo, não adianta querer vir amanhã. Brincadeira. O pior que pode acontecer é não estar mais eu lá. A Rodrigo da Fonseca tem um MacDonald'sveja foto quase na esquina. Vamos ver quanto tempo eu fico sem comer no maledeto.

E come-se, como se come! Come-se bem. Deixo a mala no hotel e levam-me a um Shopping — será que eu tenho cara de paulista, meu? —, o Vasco da Gama, incrustado no pavilhão da Expo 98. Reparo nos preços: equivalem aos do Brasil, em conta rápida, o Escudo vale um centavo. A conversão, após cinco minutos, passa a ser automática: bate-se o olho e sabe-se que o CD novo do Morcheeba (para quem não conhece Morcheeba, fica a dica) custa R$34,00. É, mes amis, CDs aqui são caros. Em compensação, a Sony Mavica custa um terço do que eu pagaria no Brasil. Advinhem...

Ainda não. Até receber o primeiro salário, vivo espartanamente. Menos para comer, assunto que deixei para mais tarde.



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