Engenharia Polar --- O Lugar escolhido para as filmagens foi um "cemitério de icebergs", próximo à Ilha Pleneau, na saída do Canal de Lemaire, um fiorde estreito com paredes de até 1.200 metros. Todo o planejamento das escaladas ficava para os riggers, engenheiros que engendravam incríveis esquemas para subir câmeras e equipamentos. Eles eram acompanhados por oito alpinistas, operadores de câmera e diretor. "Difícil mesmo era convencer o diretor dos perigos da operação. É arriscado ficar até 14 horas filmando, sendo que a temperatura pode baixar de repente", explica Amyr.
Mesmo quem era experiente passou por apuros, como o mergulhador argentino Herman Arbizu, convocado para ficar de plantão nos botes. Caso algum alpinista caísse, ele seria a única salvação. Mas Herman contava apenas com uma roupa de neoprene de 10 mm insuficiente para conter o frio antártico. Resultado: hipotermia. Quando ainda se recuperava, teve seu dia de herói. Um dos câmeras deixou cair uma bateria, que Amyr insistiu em buscar: "A regra na Antártida é não deixar nada para trás, nem mesmo uma bituca de cigarro", justifica. Arbizu se prontificou a reaver a bateria, mas ela estava em um lago formado dentro de um iceberg, onde flutuavam outros pequenos icebergs. Até Amyr já estava deixando de lado a retidão ecológica. Mas o mergulhador caiu na água assim mesmo. "Ele não conseguia achar e nem subir à tona, por causa dos pedaços de gelo. Foi um alívio quando o vi subir depois de alguns minutos. E com a bateria !", conta Amyr.
Também sobrava um tempinho para o lazer. Os técnicos até jogaram futebol em cima de um iceberg --- um deles queria plantar a bandeira do Corinthians no gelo, como os grandes conquistadores, mas para sorte da Antártida, a consciência ecológica barrou a tentativa. E à noite, os brasileiros promoviam um happy-hour, regado a uísque.
Filmagem Perigosa --- Nos últimos dias da viagem, foi encontrado o iceberg ideal para a filmagem final. "Tinha o topo chato, onde seriam feitas algumas tomadas aéreas", lembra Amyr. Mas estava distante. Os navios teriam que navegar até lá contornando o "cemitério de icebergs". Sem planejamento nem consentimento de Amyr, o diretor enviou os alpinistas de helicóptero que foram deixados sem comunicação. Um bote também seguiu para lá, levando técnicos, Fábio e o fotógrafo Pedro Martinelli. Foi quando o vento pulou de 25 para 50 nós. Com o tempo ruim, o helicóptero ficou preso no navio. À mercê da tempestade, os rapazes ficaram deitados no topo para se proteger. E o pessoal do bote passou a enfrentar ondas de 2,5 metros.
O Laurel foi enviado para o resgate. Mas enquanto isso, o pessoal no bote enfrentava a "surra" do mar. Fábio tentou repetidamente, sem sucesso, prender o bote em um iceberg. "Foi o Pedrão quem conseguiu fixar o parafuso. E eu tinha ensinado a ele como manejar o equipamento um dia antes", lembra Amyr. Por sorte, a tempestade passou. Assim os alpinistas pegaram carona no bote do doutor Tozzi para voltar ao navio.
Após um mês, o grupo tomou o caminho de volta, com uma escala na Ilha Deception --- uma cratera vulcânica alagada pelo mar. Na entrada da cratera, o Laurel bateu em uma pedra, avariou o casco e teve que ficar para sofrer reparos. Comandante triste e tripulação sem teto. Quem estava no rebocador foi transferido para o navio russo. Apesar dos contratempos, as gravações foram "um sucesso", como os telespectadores poderão conferir. Até quem não fuma, como o próprio Amyr, deverá gostar das imagens da Antártida e seus icebergs cinematográficos.
Matéria retirada da revista Náutica Nº 105
Por Flávia Pegorin e Pedro Kutney
Fotos Fábio Tozzi
Este Texto foi digitado por Maicon F. Santos em 26 de Maio de 1997 - "A única alteração que fiz foi acrescentar o ano na data de partida da cidade de Ushuaia na Argentina".