1-Zeus

É o rei dos deuses e dos homens; seu reino é o Olimpo e com um simples movimento de cabeça agita o Universo. Sua arma é o raio. Foi casado sete vezes, sendo sua primeira mulher Métis (a reflexão ou a prudência), que engole logo após de casarem, conformando-se aos hábitos da família, e dá à luz uma filha que lhe sai do cérebro, Atena (a sabedoria divina). Por mais brutal que pareça, é fácil de compreender: o deus nutre-se da Reflexão para gerar a Sabedoria. Mnemósina (a memória) é outra esposa de Zeus: da união da memória com o sopro divino, nascem as Musas. Com Têmis (a justiça), Zeus torna-se pai das Parcas inexoráveis e das Horas, cuja marcha ninguém pode deter, porque uma nunca se arroga ao direito da outra. Deméter, a personificação da Terra, fecunda a mãe de Perséfone, que é o grão de trigo; Latona, mãe de Apolo e de Ártemis, ou do Sol e da Lua; Eurínome, mãe dos Benefícios ou das Graças. E finalmente Hera, sua irmã, que foi a última esposa. Zeus amou também numerosas mortais, tendo delas filhos colocados entre os deuses e semideuses. Para escapar dos ciúmes de Hera, chegava a usar seus extraordinários poderes, transformando-se em animais ou objetos, a fim de visitar impunemente suas bem-amadas. Assim é que virou um touro manso, de pele branca e aveludada, para raptar a pastora Europa filha do Rei da Fenícia, virou cisne para encontrar-se incógnito com Leda, e chegou até a virar garoa para penetrar, através das frestas da janela, no quarto em que estava encerrada a bela Dânae. Esses artifícios, porém, não conseguiam burlar a vigilância de uma espécie de detetive olímpico, chamado Argos, a cuja vista penetrante e cujos dotes de dedução e adivinhação dificilmente poderia escapar qualquer ardil. Aqueles que Zeus punha em prática, para fins de infidelidade conjugal, eram freqüentemente desmascarados, e disso ocorriam, nas alturas do Olimpo, altercações domésticas por vezes entremeadas de pancadaria, semelhantes às que, com lamentável freqüência, se verificam em lares de todas as épocas e classes. Certa vez, a desavença se teria deteriorado ao ponto de Zeus perder a linha e espancar com bastante decisão a sua divina e real consorte. Um filho do casal, Hefesto, deus do fogo e das indústrias, acorreu em defesa da mãe. Na confusão que se seguiu, Zeus levou a melhor e, com um golpe semelhante aos que hoje cuidadosamente arquitetam os profissionais de luta livre, atirou o corajoso e infeliz rebento para fora do Olimpo, fazendo-o cair perto do mar, mais de três mil metros abaixo. Os deuses eram imortais, mas não invulneráveis. Hefesto sobreviveu, portanto, ao incrível impacto, tendo ficado, todavia, com as duas pernas quebradas. Em conseqüência, andava coxeando de ambos os membros inferiores e, como acontecia dele ser um dos poucos deuses feios, tal circunstância não concorria, obviamente, para lhe dar melhor aparência. Os filhos deuses de Zeus eram suas qualidades personificadas. Os irmãos de Zeus, Hades e Posseidon, são simples desdobramentos da sua personalidade. Proclo fala de uma tríade demiúrgica cujos três membros, Zeus, Posseidon e Hades, constituem um deus único e triplo simultaneamente. A época em que Proclo viveu poderia tornar suspeita a sua opinião, mas anteriormente ao cristianismo, já exprimira a arte a mesma idéia. A arte da grande época não podia aceitar o deus triforme, cuja estranha concepção mais se aproxima do temperamento da Índia do que da Grécia. Assim, repeliu qualquer idéia de um deus triplo, mas afirmou, de outra maneira, a identidade dos três personagens. Assim, enquanto Apolo, Hermes ou Dioniso (todos os três filhos de Zeus) possuem na forma uma caráter inteiramente determinado e perfeitamente reconhecível, os irmãos do rei dos deuses se assemelham em todos os pontos, e só se distinguem um do outro pelo atributo que carregam. Quando vemos na testa do deus o misterioso módio, ou ao seu lado o cão de três cabeças (Cérbero), trata-se do Zeus infernal, chamado também de Hades ou Serápis. Quando segura o tridente em lugar do raio, reconhecemos Posseidon, o deus dos mares. Mas a idade do personagem, as feições, a sua fisionomia, numa palavra o seu tipo em nada difere do Rei do Olimpo. Assim, os irmãos de Zeus representam na mitologia apenas uma das faces do deus supremo. Como é a abóbada celeste, seus templos eram sempre descobertos no alto. Somente os templos de deuses da terra é que têm tetos fechados. Era difícil à arte representar sob forma humana o caráter de abóbada celeste de que se reveste Zeus. Entretanto, uma antiga pedra gravada nos mostra o rei dos deuses sentado num trono que descansa sobre uma véu inflado pelo vento e seguro por Posseidon, posto embaixo. Ou seja: o espírito de Zeus paira sobre as águas. O céu que Zeus representa está lá caracterizado pelos doze signos do Zodíaco e colocados em torno da composição, e Zeus, ademais, vê-se escoltado por seus filhos Ares e Hermes. Deu a arte a Zeus a forma de homem barbudo, na força da idade; seus atributos comuns são o raio, a águia e o cetro. Considerado como deus ativo, Zeus está sempre de pé, mas os escultores o têm mais freqüentemente representado repousando, sentado, na calma e na vitória. Está geralmente nu da cabeça até a cintura; os cabelos caem-lhe como crina, nos lados da testa, que é clara e radiosa na parte superior, mas convexa na parte inferior. Tem olhos fundos, apesar de bem apertos, uma barba espessa, peito amplo, mas não as proporções de um atleta. A atitude é sempre majestosa e a arte jamais o representou em movimento violento. Não compreendiam os antigos que pudesse haver força comparada à do raio. O raio que Zeus impunha é, pois, a imagem da força repentina e irresistível. Todos os que tentaram lutar contra ele, homens ou deuses, foram fulminados.

Zeus Nicéforo

Nice aparece uma vez ou outra na mão de Ares ou de Atena, mas quase sempre na de Zeus. É um atributo que não pode estar melhor colocado do que na companhia do rei dos deuses. A águia, segundo os gregos, é a ave que voa mais alto e, por conseguinte, a que melhor corresponde à majestade divina. É por isso que representa-se umas vezes aos pés de Zeus, outras sobre seu cetro. Às vezes, segura com as poderosas garras o raio do deus.

Zeus Aetóforo

A águia de Zeus, aliás, desempenhou um papel importante na mitologia. É ela que leva a Zeus criança o néctar de que as ninfas a embebem na Ilha de Creta. Mas é sobretudo ela que arrebata o jovem pastor Ganímedes para dele fazer escanação do rei dos deuses. O belo adolescente era filho de Tros, Rei de Tróada; Zeus ordenou que o raptasse para dar aos céu um ornamento de que a Terra não era digna. Ganímedes guiava seus rebanhos no promontório dardânico, quando se verificou o rapto. O Rei de Tróada ficou inconsolável com a perda do filho; Zeus aliviou-lhe a dor mostrando-lhe que endeusara Ganímedes e o colocara no céu, onde se tornou efetivamente o signo do Zodíaco a que chamamos de Aquário. Ademais, o rei dos deuses doou a Tros um magnífico cepo de ouro e uma parelha de cavalos que corriam mais depressa que o vento.

Zeus Anfitrião

Zeus é o protetor dos anfitriões, e percorre incessantemente a Terra para ver como praticam os homens a hospitalidade. Achava-se um dia na Frígia, acompanhado do fiel Hermes, que tivera o cuidado de se desfazer das asas para não ser reconhecido. Após visitar grande número de casas em busca de hospitalidade, o que sempre lhe foi negado, chegou a uma cabana coberta de palha e caniços; ali foram ambos acolhidos com cordialidade por Filemo e Báucis. os dois esposos tinham a mesma idade, haviam contraído núpcias muito moços e haviam envelhecido naquela cabana. Pobres, tinham sabido mediante a virtude diminuir os rigores da indigência. Sozinhos, eram eles mesmos seus criados e compunham toda a família. Quando Zeus e Hermes entraram, abaixando-se, por ser a porta baixíssima, Filemo apresentou-lhes cadeiras para que descansassem, e Báucis nelas acomodou um pouco de palha para que os estranhos se sentissem um pouco mais à vontade. Em seguida, pôs-se a fazer fogo reavivando algumas fagulhas que brilhavam sob as cinzas; para aumentá-lo e fazer ferver a marmita, reuniu alguns gravetos e arrancou ramos que serviam de apoio à cabana. Enquanto limpava as verduras que o marido fora colher na horta, Filemo pegou toucinho velho pendente do forro e, cortando um pedaço, o colocou na marmita. Depois, à espera que o almoço ficasse pronto, começou a conversar com os hóspedes para que estes não se entediassem. Num canto do quarto pendia um caso de faia que Filemo encheu de água quente, para lavar-lhes os pés. No meio, via-se uma mesa de madeira cujo único enfeite eram algumas folhas de árvores; para decorá-la, estendiam sobre ela um tapete o qual somente se serviam nas grandes festas, e o tapete, digno ornamento de tal mesa, era um velho hábito muito comum: foi ali que arrumaram o lugar para que Zeus e Hermes pudessem comer. Entretanto, Báucis preparava a mesa; como essa tivesse um dos pés mais curtos que os outros, remediou a situação colocando sob ele um tijolo. Após enxugá-la bem, colocou sobre elas azeitonas, chicória, rabanetes e queijo branco. Formava o prato do meio um bolo de mel. A refeição era frugal, mas tinha bom aspecto e era dada de todo coração. No entanto, o bom casal desconfiou que não era bastante; a sua única riqueza era um ganso que guardava a cabana. Quiseram pegá-lo para matar, e puseram-se ambos a correr atrás do pobre animal que, desejoso de lhes escapar, os fez perder a respiração e terminou por se refugiar entre as pernas de Zeus, o qual os rogou o não matassem. O ganso passara a ser seu protegido. Os dois esposos notaram que as taças se enchiam por si próprias à medida que se esvaziavam e que o vinho aumentava em vez de diminuir. Assombrados por tal prodígio, ergueram as mãos trêmulas ao céu, pedindo perdão aos hóspedes por lhes ter oferecido tão pobre refeição. Zeus deu-se, então, a conhecer, e ordenou-lhes que o seguissem à montanha vizinha, o que mal conseguiam fazer, valendo-se dos seus cajados. O rei dos deuses perguntou-lhes, depois, o que almejavam, e prometeu que os satisfaria. Após se consultarem, os dois esposos suplicaram-lhe a graça de não sobreviver um ao outro. Chegados à montanha, Filemo e Báucis voltaram-se e viram que toda a região estava coberta de água, com exceção da cabana. E, como se admirassem de, no meio de tão grande calamidade, lhes ter sido poupada a habitação, notaram que se revestia de aspecto diverso. Magníficas colunas se erguiam no lugar das forquilhas de madeira que antes a sustentavam; a palha que a cobria convertera-se em ouro; a terra que lhes servia de soalho estava pavimentada de mármore, a porta ornada de esculturas e baixos-relevos; a humilde cabana transformara-se num resplandecente templo. Zeus fez dos dois esposos sacerdotes do novo templo, e eles viveram unidos na prosperidade, como haviam vivido na indigência, e chegaram isentos de enfermidades à mais extrema velhice. Quando soou a hora marcada pelo destino, Filemo e Báucis achavam-se sentados diante dos degraus do templo. Báucis percebeu de repente que o corpo de Filemo ia se cobrindo de folhas e este, por sua vez, observou o mesmo fenômeno em sua mulher. Vendo ambos em seguida que a casca começava a atingir-lhes a cabeça, disse Filemo: “Adeus, minha querida esposa.”, e ela: “Adeus, meu querido esposo.” Mal haviam proferido tais palavras, fechou-se-lhes para sempre a boca. As duas árvores colocadas lado a lado sombrearam a entrada do templo, e a piedade dos povos lhes cobriu os ramos de ramalhetes e grinaldas. Em Roma, Zeus era conhecido como Júpiter e a ele era consagrada a quinta-feira (jeudi, em francês, Jovis dies).
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