O Realismo e o Naturalismo foram as duas escolas literárias de domínio no fim do século XIX e início do século XX. Sua contra-parte na poesia é chamada de Parnasianismo. Apesar de se parecerem, o Realismo e o Naturalismo tem diferenças -- o Naturalismo é marcado principalmente pelo determinismo, a idéai de que a natureza define o destino dos personagens. O mais importante autor realista e maior escritor do Brasil foi Machado de Assis, que possui página em separado.
"Vais encontrar o mundo, disse-me meu pai, à porta do Ateneu. Coragem para a luta." O Ateneu
"Falavam do incendiário. Imóvel! Contavam que não se achava a senhora. Imóvel! A própria senhora com quem ele contava para o jardim de crianças! Dor veneranda! Indiferença suprema dos sofrimentos excepcionais! Majestade inerte do cedro fulminado! Ele pertencia ao monopólio da mágoa. O Ateneu devastado! O seu trabalho perdido, a conquista inapreciável de seus esforços!... Em paz!... Não era um homem aquilo; era um de profundis." O Ateneu "Raimundo tinha vinte e seis anos e seria um tipo acabado de brasileiro, se não foram os grandes olhos azuis, que puxara do pai. Cabelos muito pretos, lustrosos e crespos; tez morena e amulatada, mas fina; dentes claros que reluziam sob a negrura do bigode; estatura alta e elegante; pescoço largo, nariz direito e fronte espaçosa. A parte mais característica de sua fisionomia eram os olhos - grandes ramalhudos, cheios de sombras azuis; pestanas eriçadas e negras, pálpebras de um roxo vaporoso e úmido; as sobrancelhas, muito desenhadas no rosto, como a nanquim, faziam sobressair a frescura da epiderme, que, no lugar da barba raspada, lembrava os tons suaves e transparentes de uma aquarela sobre papel de arroz." O Mulato
"Ana Rosa estremeceu toda, deu um grito, ficou lívida, levou as mãos aos olhos. Parecia-lhe ter reconhecido Raimundo naquele corpo ensangüentado. Duvidou e, sem ânimo de formular um pensamento, abriu de súbito as vidraças.
Era, com efeito, ele. "Naquela mulata estava o grande mistério e a síntese das impressões que ele recebera chegando aqui: ela era a luz ardente do meio-dia; ela era o calor vermelho das sestas da fazenda; era o aroma quente dos trevos e das baunilhas, que o atordoara nas matas brasileiras; era a palmeira virginal e esquiva que não se torce a nenhuma outra planta; era o veneno e era açúcar gostoso; era o sapoti mais doce que o mel e era a castanha do caju, que abre feridas com seu azeite de fogo; ela era a cobra verde e traiçoeira, a lagarta viscosa, a muriçoca doida, que esvoaçava havia muito tempo em trono do idade da terra, piscando-lhe as artérias, para lhe cuspir dentro do sangue uma centelha daquele amor setentrional, uma nota daquela música feita de gemidos de prazer, uma larva daquela nuvem de cantáridas que zumbiam em torno da Rita Baiana e espalhavam-se pelo ar numa fosforescência afrodisíaca." O Cortiço
"Bertoleza então, erguendo-se com ímpeto de anta bravia, recuou de um salto e, antes que alguém conseguisse alcançá-la, já de um só golpe certeiro e fundo rasgara o ventre de lado a lado." O Cortiço
"Sua pequena testa, curta e sem espinhas, margeada de cabelos crescendo, não denunciava o que naquela cabeça havia de voluptuoso e ruim. Seu todo acanhado, fraco e modesto, não deixava transparecer a brutalidade daquele temperamento cálido e desensofrido." Casa de Pensão
"Então, fechou novamente os olhos estremecendo, esticou o corpo - e uma palavra doce esvoaçou-lhe nos lábios entreabertos, como um fraco e lamentoso apelo de criança: - Mamãe!... Nascido em Fortaleza, Ceará, Manoel de Oliveira Paiva (1861-1892) teve estudos irregulares: estudou no Seminário do Crato em 1875, mas o deixou no ano seguinte após desentendimentos com o Padre Reitor. No outro ano vai para o Rio de Janeiro estudar na Escola Militar, mas só consegue fazer os exames para entrada em 1881. Em 1883 tem que interromper os estudos definitivamente por causa da tuberculose que lhe vitimaria assim como tantos outros. Volta ao Ceará onde leva vida agitada, lutando pelo abolicionismo como jornalista e redator. Nesta época intensifica sua produção literária, que começara na Escola Militar, escrevendo contos, crônicas e sonetos. Em 1889 sai em folhetins o romance A Afilhada e em 1892, poucos meses antes de morrer, faz a revisão de Dona Guidinha do Poço. Oliveira Paiva tornou-se um ilustre desconhecido e seus dois romances foram publicados em livro na segunda metade do século XX. Adolfo Caminha (1867-1897) foi um dos poucos escritores naturalistas brasileiros. Órfão de mãe aos 10 anos, muda-se para o RJ onde passa a residir com um tio materno. Aos 13 matricula-se na escola naval, de onde sai guarda-marinha em 1885. Passa a viajar na Marinha e em 1888 serve no Ceará, onde ajuda a fundar o Centro Republicano e participa da vida intelectual da cidade. Nesse ano e no seguinte é envolvido num escândalo de adultério e é expulso da Armada. Retira-se da vida social, mas continua a participar da vida literária. Em 1891 muda-se para o RJ, onde se dedica ao jornalismo e literatura, escrevendo algumas das obras-primas do Naturalismo como A Normalista e Bom-Crioulo.
"Seguia-se o terceiro preso, um latagão de negro, muito alto e corpulento, figura colossal de cafre, desafiando, com um formidável sistema de músculos , a morbidez patológica de toda uma geração decadente e enervada, e cuja presença ali, naquela ocasião, despertava grande interesse e viva curiosidade: era o Amaro, gajeiro da proa, - o Bom-Crioulo na gíria de bordo." Bom-Crioulo
"Aleixo passava nos braços de dois marinheiros, levado como um fardo, o corpo mole, a cabeça pendida para trás, roxo, os olhos imóveis, a boca entreaberta. O azul-escuro da camisa e a calça branca tinham grandes nódoas vermelhas. O pescoço estava envolvido num chumaço de panos. Os braços caíam-lhe, sem vida, inertes, bambos, numa frouxidão de membros mutilados." Bom-Crioulo Artur Nabantino Gonçalves de Azevedo (1855-1908), irmão mais velho de Aluísio de Azevedo, foi contista, jornalista, tradutor, crítico e, principalmente, teatrólogo. Autor de mais de 70 peças de teatro, pode junto com Martins Pena ser considerado um dos criadores da dramaturgia nacional. Sua obra era afinada com o gosto popular, e continham, assim como sua poesia e seus contos, elementos cômicos. Artur Azevedo teve vários empregos burocráticos (como muitos escritores do século XIX) enquanto escrevia. Azevedo também é o provável autor da primeira crítica de cinema nacional. Henrique Maximiliano Coelho Neto (1864-1934) foi em sua época o que hoje é Paulo Coelho em termos de Literatura Brasileira: um escritor de grande apelo popular, prolífico e de baixa qualidade. Deputado, o "príncipe dos prosadores brasileiros" (como foi eleito em 1928) escrevia freneticamente não apenas romances e contos, mas também artigos para jornais brasileiros e estrangeiros. João Paulo Emílio Cristóvão dos Santos Coelho Barreto (1881-1921) foi o jornalista, cronista, contista e teatrólogo conhecido como João do Rio, o pseudônimo com o qual assinava seus artigos. No seu tempo, João do Rio era um dos mais importantes jornalistas e escritores do Rio de Janeiro, sendo até mesmo aceito na ABL. E isso era muito estranho para sua época, já que João do Rio era mulato, homossexual e cocainômano numa sociedade que desprezaria qualquer uma das três qualidades. Mas João do Rio escrevia artigos que eram muito apreciados pela sociedade da época e se enquadram na mesma categoria de Coelho Neto: "sorriso da sociedade". José Dias de Matos Veríssimo (1857-1916) foi um dos iniciadores do Realismo brasileiro. Contista, ensaísta e novelista, destaca-se como crítico literário. Opondo-se ao determinismo dos naturalistas, foi um dos maiores críticos literários a história brasileiro e um dos poucos a reconhecer em vida a qualidade de Lima Barreto. Herculano Marcos Inglês de Sousa (1853-1918), romancista e contista paraense, foi uma das principais figuras do Naturalismo no Brasil. Influenciado pelo francês Émile Zola e pelo português Eça de Queirós, a obra de Inglês de Sousa tem grandes qualidades estilísticas, descritivas e narrativas, sendo um dos regionalistas de mais destaque do século XIX, descrevendo com romances como O Missionário os costumes da região amazônica. Pertencente à ABL, redigiu seus estatutos internos. Ingl6es de Sousa é vítima de um mal que afeta muitos naturalistas: sua técnica um tanto pomposa e artificial é de certa monotonia. Nascido em Sobral, Ceará, a 18 de setembro de 1850, o escritor naturalista Domingos Olímpio Braga Cavalcanti foi um dos poucos e um dos últimos de sua escola. Em 1873 tornou-se bacharel em Direito em Recife voltou ao Ceará para exercer o jornalismo como abolicionista e republicano; casou-se dois anos depois, quando também foi escolhido promotor público. Quatro anos depois, forçado pela situação política (era político de oposição) mudou-se para o Pará. Em 1891 muda-se para o RJ, onde exerce o jornalismo e a advocacia. Viúvo, casa-se novamente no ano seguinte. Em 1903 publica sua principal obra, Luzia-Homem, e passa a escrever sob o pseudônimo de "Pojucan" na recém-fundada Os Anais. Em 6 de outubro de 1906, falece.
"Sob os músculos poderosos de Luzia-Homem estava a mulher tímida e frágil, afogada no sofrimento que não transbordava em pranto, e só irradiava , em chispas fulvas, nos grandes olhos de luminosa treva." Luzia-Homem
"Raulino recuou, cortado de terror, ante o cadáver; e, num turbilhão de cólera, rugiu arrepiado, apertando os dentes, e, com uns gestos, que eram crispações medonhas de fera, esquadrinhou o terreno, buscando e rebuscando o criminoso." Luzia-HomemRaul D'Ávila Pompéia teve uma infância rica e reclusa. Seus pais eram donos de uma fazenda de cana-de-açúcar e o mandaram para um internato com 10 anos, em 1863. Lá recebeu influências para escrever O Ateneu e escreveu seu primeiro livro, antes dos 15 anos, muito aclamado pela crítica da época, especialmente por ser o autor tão jovem. Mais tarde estudou num Externato e foi estudar Direito, colaborando também com jornais e revistas. Era abolicionista e republicano. Muito sensível, este professor, político, jornalista, escritor e polemista se suicidou no Natal de 1895, abandonado pelos amigos, caluniado e humilhado na imprensa. Foi um escritor que não se pode enquadrar em único estilo, tendo influências naturalistas, realistas, expressionistas e impressionistas. Sua obra de maior importância é O Ateneu, que tem algum caráter autobiográfico. Nas passagens a seguir, note a linguagem rebuscada que o autor usa.
Aluísio Tancredo Gonçalves de Azevedo foi desenhista e mais tarde escritor profissional, se envolveu na política maranhense, fundou jornais e publicou o primeiro livro naturalista brasileiro, O Mulato, que foi muito mal recebido em sua província natal. Foi o primeiro escritor brasileiro a ter a literatura exclusivamente como profissão. Sua obra variou em qualidade, tendo feito alguns dramalhões românticos que considerava de má qualidade - e eram - e obras naturalistas de relevância - junto com outras de nem tanta relevância ou qualidade. Mais tarde se desgostou da literatura e ingressou no serviço público. Foi membro da ABL, assim como seu irmão, o teatrólogo realista Artur Azevedo. O que se segue são passagens de suas obras mais famosas e importantes, as naturalistas O Mulato, O Cortiço e Casa de Pensão.
(...) A moça deixou atrás de si, pelo chão, um grosso rastro de sangue, que lhe escorria debaixo das saias, tingindo-lhe os pés. E, no lugar da queda, ficou no assoalho uma enorme poça vermelha." O Mulato
E morreu." Casa de Pensão