C R Í T I C A S


Não sou um crítico. Mas às vezes fica difícil manter-me

indiferente à assuntos que estão na minha cara.

Então eu resolvo escrever alguma coisa.

O rumo que as tão idolatradas faculdades e universidades

dão aos seus alunos não anda me parecendo là muito ideal.

A verdade é que acredito que enquanto estamos lá, estamos na

realidade, emburrecendo, na ignóbil crença de que estamos nos

tornando seres humanos exemplares. "Emburrecendo" pode não ser a

palavra exata para se definir a verdadeira situação. Mas não

se pode discutir contra fatos. É no mínimo, muito cômodo.

Por essa e mais outras, me pergunto:

 

QUO VADIS HOMO SAPIENS?

ou

E ASSIM CAMINHA A HUMANIDADE...


.....Os grandes criadores, os verdadeiros guerreiros revolucionários da arte, estão se tornando soldados cada vez mais desconhecidos na acirrada guerra da comunicação e da cultura. A sombra do esquecimento e a pesada marreta da indiferença parecem ter colocado todas as contribuições de vultos como Mozart, Shakespeare, Freidrich Murnau, Paul Cèzanne, James Joyce, Dostoiévski, Tomas S. Eliot e tantos outros gênios da sensibilidade, mais longe do que um braço pode alcançar.

......Se muitos já ouviram falar em Wolfgang Amadeus Mozart, poucos são capazes de reconhecer as características de suas obras. Se muitos sabem que ele foi um grande compositor clássico, poucos têm a ciência de que ele fora o maior de todos os tempos. O gigante Beethoven não tinha lá muita familiaridade com as vozes de canto, o genial Schubert, autor da "Ave Maria" passou maus momentos compondo óperas e o polêmico Wagner voltou seu trabalho apenas ao teatro. Nenhum outro compositor foi tão versátil quanto o injustiçado Mozart, que contribuiu enriquecendo a humanidade com mais de 800 obras da mais pura beleza e perfeição.


......Apesar disso, o jovem que impressionou Haydn e Goethe foi enterrado tendo um cachorro como o único enlutado. Por seu corpo haver sido depositado em vala comum, nunca mais se conheceu o paradeiro de seus restos. Hoje, mais de duzentos anos depois, conheço muitos estudantes capazes de reconhecê-lo pelo nome e poucos capazes de citar pelo menos duas de suas obras mais conhecidas. Menor ainda é o número daqueles que já ouviram falar da importância de Schönberg, o maior revolucionário da música contemporânea, cujos trabalhos iluminaram artistas como Wellesz e von Webern.

......É muito fácil alguém que assistiu ao "Drácula de Bram Stoker", de Francis Ford Coppola, mas difícil encontrar um que tenha assistido integralmente ao mudo "Nosferatu, uma sinfonia de horror" (Nosferatu, eine Symphonie des Graunens), de Murnau, filmado em 1922. Este filme foi a primeira versão do Drácula de Bram Stocker. Em matéria de reconhecimento, Nosferatu consta na lista dos maiores filmes de horror de todos os tempos e é considerado uma obra-prima, um marco do cinema expressionista alemão. Já em se falando de conhecimento, é mais um ilustre desconhecido.


......No campo das artes, toda a pessoa que tenha um mínimo de informação já ouviu falar em Picasso e van Gogh e embora não saiba há que movimento artístico pertenceram, sabem que foram grandes expoentes da pintura. Mas quantos já ouviram falar em Paul Cèzanne, um dos maiores influenciadores da pintura moderna? Quantos sabem que Cèzanne prenunciou o cubismo e o expressionismo, os movimentos a que pertenceram Picasso e van Gogh, respectivamente? O estranho provinciano, gênio profético da arte, ainda não é compreendido como deveria.

......Procurar por quem já tenha lido pelo menos uma peça de teatro de Shakespeare, Racine, Molière ou Bertold Brecht então, é como procurar por uma agulha num palheiro. Portanto vamos pular esta parte.

......Se o nome Fiódor Mikailovicht Dostoiévski provoca arrepios em qualquer estudante, suas obras apresentam o que há de mais brilhante na literatura mundial. Seu conto "Uma história lamentável", possui a espirituosidade encontrada em qualquer conto de "Comédias da vida privada" de Veríssimo, com uma diferença: Foi escrito no século passado, 110 anos antes de qualquer conto de Luís Fernando Veríssimo. Da mesma forma, o grande escritor irlandês James Joyce revolucionou a literatura, influenciando toda a geração romancista que o sucedeu, mas quase ninguém que eu conheço se arriscou a sequer começar a ler, pelo menos que eu saiba, seu volumoso "Ulisses". O genial mestre do etéreo morreu pobre, quase cego e incompreendido. Sua última frase foi: "Eles não entendem".


......Realmente. A atual geração Coca-Cola ainda não entendeu. A cultura erudita parece ser menos importante que os "estudos" em qualquer faculdadezinha. Que isso irá influenciar diretamente na qualidade dos profissionais que são anualmente despejados no concorrido mercado da comunicação, é público e notório. Que nossa juventude caminha lentamente para o fundo do poço da ignorância, também não é novidade. Só nos resta então, torcermos para que a ficha caia logo, pois o dia seguinte já chegou, soprando fogo pelas ventas e trazendo consigo um mundo novo e instável. A tão falada globalização já montou acampamento em nossos terrenos e a maioria não sabe sequer do que se trata. Mas ainda há tempo, embora pouco, para tentarmos cortar o pavio que nos leva até a bomba. O poeta e nobel Eliot, brilhantemente escreveu em "Os homens ocos":

......"O tempo passado e o tempo presente estão talvez contidos no tempo futuro. E o tempo futuro está no tempo passado."

......Lembro-me de ter lido poucas coisas tão certas. E quem entender o que ele quis dizer há de concordar. Quem viver, verá.


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