Prometeu não se
conformava. Ainda tinha na mente a vontade de criar um ser
humano, não para servir de morada a algum deus, mas que tivesse
vida própria, que recebesse de alguma forma um espírito
imortal, que haveria de crescer e evoluir, de aprender por si os
mistérios da vida até poder igualar-se aos deuses.
-Vou fazê-lo à imagem dos deuses - pensou.
Modelou um boneco de
argila e trabalhou nele com afinco.
-Rainha das
Alseides, guie meus gestos... Insulfle-me sua sabedoria e sua
magia. Que meus movimentos sejam inspirados em seu eterno
conhecimento da vida... em pouco tempo seu rosto foi acariciado
por uma brisa suave e perfumada. De repente, um arrepio forte
subiu por sua coluna e sacudiu seu corpo violentamente.
Ele aspergiu sobre
a figura de argila o sangue do touro sacrificado... Pouco a pouco
a argila ia se modificando, sua textura ficava mais macia, suas
cores rosadas. Até que se tranformou em um ser humano. Num
movimento suave deixou verter sobre a criatura o fogo (de Hélio)
que brilhava na concavidade da pedra. Viu que ele escorreu pelo
corpo inerte, percorrendo canais sutis em sua estrutura. Por fim,
dividiu-se em duas partes. Uma delas colocou-se na base da coluna
e a outra no coração. Uma força impulsiva fez com que Prometeu
chegasse eu rosto ao rosto daquele ser que criara. Sua boca parou
muito perto dos lábios adormecidos e ele falou num sussurro:
- Eu lhe insuflo o
sopro divino.
Viu que o ser,
agora vivo, estendia-lhe uma das mãos, como que pedindo
auxílio. Segurou aqueles dedos quentes e macios e ajudou-o a
erguer-se. E ali estava à sua frente, sua própria criação!
Com a mão direita, tocou-lhe o centro da fronte.
- Você agora faz parte do mundo criado, você existe e, como ser vivente, será responsável pela manutenção do mundo de Géia.
Você é divino e
humano. Você é o homem.
O homem sorriu e
olhou em volta, surpreso com tudo que o rodeava. Depois deu um
passo, e mais outro. Lentamente, aproximou-se da entrada da
gruta. Parou e olhou o céu estrelado. Deixou que seus olhos se
perdessem na imensidão. E, pela primeira vez, o homem teve
saudade. Saudade da origem, saudade de algum lugar que não sabia
onde ficava, talvez saudade do calor do fogo, cuja parcela
ínfima trazia em seu corpo, ou talvez saudade da inconsciência
que deixara e que o aproximava tanto do Todo.
E, pela primeira
vez, o homem chorou...