"Trabalho é o que fazem aqueles que não têm mais nada para fazer", dizia-me um homem já de provecta idade, em meados da década de 70.
As revoluções políticas sempre trarão consigo coisas positivas e coisas negativas. Com o "25 de Abril" assim também sucedeu. De entre tudo o que o novo regime nos proporcionou, a liberdade de expressão terá sido o que mais favoravelmente me impressionou. De entre as coisas más que então surgiram, a que mais prejudicial me pareceu foi a alteração do conceito de trabalho.
Grande parte dos portugueses passaram a ter a ideia de que deveriam trabalhar o menos possível, quer ao serviço de terceiros, quer até para si próprios. O tempo passou a ser muito mais ocupado com o lazer e com o associativismo (sobretudo político e sindical). Em paralelo, todos queriam usufruir de mais benefícios (melhor ordenado, mais regalias sociais, etc.), repartindo melhor a riqueza criada.
Claro que é simpática esta ideia de melhor repartição da riqueza. Porém, se se trabalha menos produz-se menos e, então, poder-se-á repartir a pobreza de meios e não a riqueza.
Era óbvio que os portugueses, desde os governantes até ao comum homem da rua, teriam de admitir isso e alterar o rumo das ideias relativamente ao trabalho, o que veio a acontecer de uma forma progressiva.
Trabalhar é viver, na justa medida em que sem trabalho não há vida. O trabalho é uma necessidade para a nossa higiene mental. Habilita o ser a praticar o bem, a beneficiar o próximo, a concorrer para o progresso geral, fazendo com que o próprio se fortaleça com a consciência do dever cumprido.
Pelo trabalho adquire-se experiência, disciplina, paciência, tolerância, senso de responsabilidade. Dá-se exemplos, ensinando e preparando novos trabalhadores.
O trabalho, praticado com honestidade e de forma construtiva, lapida o carácter, enobrece as atitudes, desenvolve a autoconfiança, revigora a força moral e torna o indivíduo respeitado no meio em que vive.
Quando um povo é mentalizado no sentido de fazer do trabalho uma arma ao serviço dos interesses colectivos, são criadas condições apropriadas ao desenvolvimento material e espiritual. Se, simultaneamente à criação de riqueza, são mantidos os ideais de democracia, procurando-se a justa distribuição, de acordo com o esforço de cada um, está encontrado o caminho do bem-estar colectivo.
No Portugal de hoje, por demais atento ao superior nível de vida dos diferentes países da União Europeia, talvez ainda não haja uma forte consciencialização de que, para conseguirmos melhores condições de vida, teremos de trabalhar mais.
Todos. Os cientistas investigando e descobrindo de facto soluções novas. Os empresários incrementando a criatividade dos técnicos e competindo com mais agressividade. Os técnicos racionalizando os circuitos e procurando sempre cumprir objectivos mais ambiciosos. Os escriturários, os operários e os agricultores procurando cumprir com rigor as suas tarefas, cientes de que o absentismo e a menor dedicação ao trabalho são prejudiciais para si, para a organização em que estão integrados e para o país.
E, sobretudo, os governantes, esclarecendo,
consciencializando, exemplificando e motivando toda a população
para a ideia de que os chamados "milagres" económicos só
podem acontecer com muito trabalho, o qual pode e deve ser desenvolvido
com alegria, satisfação e bem-estar.