A História que se aprendia há alguns anos no ensino primário e secundário era, sobretudo, um repositório de nomes e datas. Decoravam-se os nomes dos reis, das batalhas, dos tratados e de algumas outras coisas, bem como as datas em que tinham acontecido. Com o passar do tempo fomos verificando alguma inutilidade no esforço de memória que fizemos, pois, não renovando a informação, ela foi-se perdendo. E, mais do que isso, fomo-nos apercebendo de que esse repositório de nomes e datas terá, de alguma forma, distorcido a imagem que construímos da realidade histórica.
Virá a propósito referir D. Afonso Henriques e a imagem que dele formámos: homem valente, destemido, guerreiro excepcional, que ganhou imensas batalhas aos mouros (uma espécie de Eusébio daqueles tempos), com uma força extraordinária - utilizava uma enorme espada que pesava vários quilos.
Os anos passaram e fomos ponderando os feitos notáveis deste homem. Ainda muito jovem (17 anos) demonstrou uma forte personalidade ao rebelar-se contra a sua própria mãe e o companheiro desta, por achar incorrectas as posições por eles assumidas.
Se é verdade que tinha muita força física, parece que a notoriedade atingida como guerreiro se deveu mais ao treino intensíssimo a que desde menino se submeteu (ou foi submetido), quando, sem desfalecimento, mostrando qualidades de trabalho invulgares, passava dias e dias a treinar com os fidalgos da época.
Para as suas vitórias nos campos de batalha terão sido muito importantes as suas qualidades como condutor de homens. D. Afonso era conhecido por se colocar na primeira linha das suas hostes, nunca virando a cara à luta; mas, até aí, muito tinha que ser feito. Ocorre-me o difícil trabalho de conquista dos fidalgos para a sua causa e a motivação necessária para conseguir levar o povo consigo, mantendo em todos o ânimo da vitória (note-se que os "peões" não só combatiam a pé, como percorriam o que veio a ser Portugal no mesmo meio de transporte).
Por outro lado, Afonso Henriques terá sido um autêntico diplomata, ao conseguir negociar com Afonso VII de Castela a aceitação da independência dos territórios conquistados aos mouros pelos seus homens. E, além disso, não se considerando católico, conseguiu obter a bênção papal para essa independência, o que naquela época não deveria ser coisa fácil.
Assim, fomos idealizando que a verdadeira força deste grande homem grande seria a força anímica que o levou à realização de todos esses actos estóicos, que culminaram com a fundação deste país.
E ao longo da História, como ainda hoje, parece que, de facto, o que distingue o homem de valor não é a sua força física, nem a sua força económica ou política (como hoje tantas vezes nos tentam confundir).
A diferença estará na força espiritual que anima cada um de nós. Porque dificuldades todos os dias surgem a todos. Porém, uns acreditam que são capazes de as vencer, meditam nos meios a utilizar, traçam os seus planos de acção e executam-nos com vigor. Outros ficam à espera de melhores dias ou que alguém os ajude.
Mas aí estão os exemplos dos
homens que nunca ficaram à espera. Obrigado D. Afonso Henriques.