Nascido em Santarém no ano de 1360 e tendo sucumbido fisicamente em Lisboa 71 anos mais tarde, Nuno Álvares Pereira, filho ilegítimo de um frade católico, cedo foi integrado na corte, vindo a ser armado cavaleiro com apenas 13 anos. Casou aos 16, quando já se tinha salientado numa acção militar contra os castelhanos que assediavam Lisboa. E nos anos seguintes continuou a evidenciar-se, quer por acções de armas, quer pelas atitudes verticais defendidas com forte personalidade.
Em 1383, o recém-nomeado regedor e defensor do reino, D. João, Mestre da Ordem de Aviz e seu amigo de criança, chamou-o para o Conselho de Governo, com apenas 23 anos. Quando D. João foi aclamado rei, dois anos mais tarde, logo nomeou Nuno para Condestável do Reino. No desempenho destas funções, reconquistou o Minho, venceu as batalhas de Aljubarrota e Valverde e continuou a dar numerosas provas do seu génio guerreiro e de uma intrepidez nunca desmentida.
Aos 33 anos, sendo considerado o homem mais rico do reino, começou a partilhar com os companheiros de armas numerosas terras que lhe haviam sido doadas. Ao longo dos anos que se seguiram evidenciou-se como homem bom, protegendo e acarinhando os humildes e os pobres e distribuindo todos os seus bens materiais por familiares, religiosos, amigos e necessitados, até ficar despojado de tudo.
Apoiou D. João na formação de seus filhos - Duarte, Pedro, Henrique, João e Fernando - que muito o respeitavam e tinham por ele um certo fascínio, especialmente o mais velho que o acompanhava dias inteiros, procurando apreender sofregamente as magníficas lições da sua vida. D. Nuno ainda acompanhou os infantes D. Duarte e D. Henrique na primeira incursão portuguesa por terras de África, na conquista de Ceuta. Estavam criadas as condições básicas para que Portugal saísse da situação de caos em que tinha mergulhado, para assumir ao longo dos dois séculos seguintes uma outra dimensão.
Contudo D. Nuno estava cansado dos campos de batalha, das intrigas políticas, das coisas mundanas e das glórias terrenas. Aos 63 anos ingressou definitivamente na existência conventual, tornando-se frade carmelita. O povo lisboeta, reconhecendo-lhe toda a sua benemerência, tratava-o por Santo Condestável.
Tendo ficado viúvo aos 27 anos, nunca antes nem depois lhe foi conhecida ligação amorosa a outra mulher, apesar das muitas pressões e solicitações de que foi alvo. Conhecido pelas suas raras honestidade e modéstia, era tido como tendo ajudado inumeráveis enfermos a readquirirem a saúde.
Mário Domingues em "A Vida Grandiosa do Condestável" diz que D. Nuno afirmava ter visões, "como em Aljubarrota, ao ver o seu pendão cercado de pombas a esvoaçar", ou ao "passar horas a conversar enternecidamente com Maria, mãe de Jesus". Oliveira Martins, em "A Vida de Nun'álvares", cita do documento da proposta da sua canonização em 1674: "Consta das crónicas antigas e manuscritos autênticos haver ressuscitado 11 mortos". Com o exagero que é vulgar nas apreciações feitas alguns séculos mais tarde, as qualidades de D. Nuno foram muito exaltadas.
De tal maneira foi marcante a sua figura histórica, que ainda hoje, quando se utiliza a palavra condestável, logo se pensa em D. Nuno Álvares Pereira.
Condestável, segundo os dicionários, era o general chefe dos exércitos, o qual nas grandes solenidades acompanhava o rei e se sentava à sua direita. Mas o termo também foi utilizado para designar o governador de cada um dos estados ou regiões que constituíam um reino. O condestável era sobretudo um técnico, que podia não ser de primeira importância social, mas que tinha de ter elevadas competência, capacidade de liderança e honestidade.
Condestável é afinal uma figura necessária ao Portugal dos nossos dias. Gente que saiba assumir as dificuldades de um pequeno país, lutando para vencer as novas batalhas da independência e criar condições ao desenvolvimento de uma nova era.
Condestável ou condestáveis.
Homens bons, competentes e honestos, que se saibam distanciar das intrigas
políticas, dos jogos de bastidores, das paixões mundanas
e das vaidades fáceis, seguindo exemplos nobres como o de D. Nuno
Álvares Pereira, na defesa desinteressada dos superiores interesses
do país e das suas diferentes regiões.